Santa Mônica, mãe de Santo Agostinho, testemunha de esperança

Uma mulher de fé inabalável, de lágrimas fecundas, atendida por Deus após dezessete longos anos. Um modelo de cristã, esposa e mãe para toda a Igreja. Uma testemunha de esperança que se transformou em poderosa intercessora no Céu. O próprio Dom Bosco recomendava às mães, aflitas pela vida pouco cristã de seus filhos, que se encomendassem a ela nas orações.

Na grande galeria dos santos e santas que marcaram a história da Igreja, Santa Mônica (331-387) ocupa um lugar singular. Não por milagres espetaculares, não pela fundação de comunidades religiosas, nem por feitos sociais ou políticos de destaque. Mônica é lembrada e venerada sobretudo como mãe, a mãe de Agostinho, o jovem inquieto que, graças às suas orações, às suas lágrimas e ao seu testemunho de fé, tornou-se um dos maiores Padres da Igreja e Doutores da fé católica.
Mas limitar sua figura ao papel materno seria injusto e redutor. Mônica foi uma mulher que soube viver sua vida ordinária – esposa, mãe, crente – de forma extraordinária, transfigurando o cotidiano pela força da fé. É um exemplo de perseverança na oração, de paciência no casamento, de esperança inabalável diante dos desvios do filho.
As informações sobre sua vida chegam até nós quase exclusivamente pelas Confissões de Agostinho, um texto que não é uma crônica, mas uma leitura teológica e espiritual da existência. Ainda assim, nessas páginas Agostinho traça um retrato inesquecível da mãe: não apenas uma mulher boa e piedosa, mas um autêntico modelo de fé cristã, uma “mãe das lágrimas” que se tornam fonte de graça.

As origens em Tagaste
Mônica nasceu em 331 em Tagaste, cidade da Numídia, Souk Ahras na atual Argélia. Era um centro vibrante, marcado pela presença romana e por uma comunidade cristã já enraizada. Proveniente de uma família cristã abastada: a fé já fazia parte de seu horizonte cultural e espiritual.
Sua formação foi marcada pela influência de uma ama austera, que a educou na sobriedade e na temperança. Santo Agostinho escreverá sobre ela: “Não falarei, portanto, de seus dons, mas dos teus dons a ela, que não se fez sozinha, nem foi educada sozinha. Tu a criaste sem que nem o pai nem a mãe soubessem que filha teriam; e a ensinaste no teu temor com a vara do teu Cristo, ou seja, a disciplina do teu Unigênito, numa casa de crentes, membro saudável da tua Igreja.” (Confissões IX, 8, 17).

Nas mesmas Confissões, Agostinho também relata um episódio significativo: a jovem Mônica havia adquirido o hábito de beber pequenos goles de vinho da adega, até que uma serva a repreendeu chamando-a de “bêbada”. Essa repreensão foi suficiente para que ela se corrigisse definitivamente. Essa historieta, aparentemente sem importância, mostra sua honestidade em reconhecer seus pecados, em deixar-se corrigir e em crescer em virtude.

Aos 23 anos, Mônica foi dada em casamento a Patrício, um funcionário municipal pagão, conhecido por seu temperamento colérico e sua infidelidade conjugal. A vida matrimonial não foi fácil: a convivência com um homem impulsivo e distante da fé cristã colocou à prova sua paciência.
No entanto, Mônica nunca caiu em desânimo. Com uma atitude de mansidão e respeito, soube conquistar progressivamente o coração do marido. Não respondia com dureza às explosões de raiva, não alimentava conflitos inúteis. Com o tempo, sua constância deu frutos: Patrício se converteu e recebeu o batismo pouco antes de morrer.
O testemunho de Mônica mostra como a santidade não se expressa necessariamente em gestos grandiosos, mas na fidelidade cotidiana, no amor que sabe transformar lentamente as situações difíceis. Nesse sentido, é um modelo para muitas esposas e mães que vivem casamentos marcados por tensões ou diferenças de fé.

Mônica mãe
Do casamento nasceram três filhos: Agostinho, Navígio e uma filha cujo nome desconhecemos. Mônica derramou sobre eles todo seu amor, mas sobretudo sua fé. Navígio e a filha seguiram um caminho cristão linear: Navígio tornou-se sacerdote; a filha seguiu o caminho da virgindade consagrada. Agostinho, por sua vez, tornou-se logo o centro de suas preocupações e lágrimas.
Desde garoto, Agostinho mostrava uma inteligência extraordinária. Mônica o enviou para estudar retórica em Cartago, desejosa de garantir-lhe um futuro brilhante. Mas junto com os progressos intelectuais vieram também as tentações: sensualidade, mundanismo, más companhias. Agostinho abraçou a doutrina maniqueísta, convencido de encontrar nela respostas racionais para o problema do mal. Além disso, começou a conviver sem casar com uma mulher, da qual teve um filho, Adeodato. Os desvios do filho levaram Mônica a negar-lhe acolhida em sua casa. Mas não por isso deixou de orar por ele e de oferecer sacrifícios: “do coração sangrante de minha mãe te era oferecido por mim noite e dia o sacrifício de suas lágrimas”. (Confissões V, 7,13) e “derramava mais lágrimas do que jamais derramam as mães pela morte física dos filhos” (Confissões III, 11,19).

Para Mônica foi uma ferida profunda: o filho, que ela havia consagrado a Cristo no ventre, estava se perdendo. A dor era indescritível, mas ela nunca deixou de esperar. O próprio Agostinho escreverá: “O coração de minha mãe, atingido por tal ferida, nunca mais sararia: porque não sei expressar adequadamente seus sentimentos por mim e quão maior foi seu trabalho ao me dar à luz em espírito do que aquele com que me deu à luz na carne.” (Confissões V, 9,16).

Surge espontânea a pergunta: por que Mônica não batizou Agostinho logo após o nascimento?
Na verdade, embora o batismo infantil já fosse conhecido e praticado, ainda não era uma prática universal. Muitos pais preferiam adiá-lo para a idade adulta, considerando-o um “banho definitivo”: temiam que, se o batizado pecasse gravemente, a salvação estaria comprometida. Além disso, Patrício, ainda pagão, não tinha interesse em educar o filho na fé cristã.
Hoje vemos claramente que foi uma escolha infeliz, pois o batismo não só nos torna filhos de Deus, mas nos dá a graça de vencer as tentações e o pecado.
Uma coisa, porém, é certa: se ele tivesse sido batizado quando criança, Mônica teria poupado a si mesma e ao filho muitos sofrimentos.

A imagem mais forte de Mônica é a de uma mãe que ora e chora. As Confissões a descrevem como uma mulher incansável em interceder junto a Deus pelo filho.
Um dia, um bispo de Tagaste – segundo alguns, o próprio Ambrósio – a tranquilizou com palavras que ficaram célebres: “Vai, não pode se perder o filho de tantas lágrimas”. Essa frase tornou-se a estrela guia de Mônica, a confirmação de que sua dor materna não era em vão, mas parte de um misterioso desígnio de graça.

Tenacidade de uma mãe
A vida de Mônica foi também uma peregrinação nos passos de Agostinho. Quando o filho decidiu partir às escondidas para Roma, Mônica não poupou esforços; não deu a causa como perdida, mas o seguiu e o procurou até encontrá-lo. Ela o alcançou em Milão, onde Agostinho havia conseguido uma cátedra de retórica. Ali encontrou um guia espiritual em Santo Ambrósio, bispo da cidade. Entre Mônica e Ambrósio nasceu uma profunda sintonia: ela reconhecia nele o pastor capaz de guiar o filho, enquanto Ambrósio admirava sua fé inabalável.
Em Milão, a pregação de Ambrósio abriu novas perspectivas para Agostinho. Ele abandonou progressivamente o maniqueísmo e começou a olhar para o cristianismo com novos olhos. Mônica acompanhava silenciosamente esse processo: não forçava os tempos, não exigia conversões imediatas, mas orava, apoiava e permanecia ao lado dele até sua conversão.

A conversão de Agostinho
Parecia que Deus não a ouvia, mas Mônica nunca deixou de orar e oferecer sacrifícios pelo filho. Após dezessete anos, finalmente suas súplicas foram atendidas – e como! Agostinho não só se tornou cristão, mas também sacerdote, bispo, doutor e padre da Igreja.
Ele mesmo reconhece: “Tu, porém, na profundidade dos teus desígnios, atendeste ao ponto vital do seu desejo, sem te importares com o objeto momentâneo de seu pedido, mas cuidando de fazer de mim aquilo que sempre te pedia que fizesse.” (Confissões V, 8,15).

O momento decisivo chegou em 386. Agostinho, atormentado interiormente, lutava contra as paixões e resistências de sua vontade. No célebre episódio do jardim de Milão, ao ouvir a voz de uma criança dizendo “Tolle, lege” (“Toma, lê”), abriu a Carta aos Romanos e leu as palavras que mudaram sua vida: “Revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não atendais aos desejos e paixões da vida carnal” (Rm 13,14).
Foi o início de sua conversão. Junto com o filho Adeodato e alguns amigos, retirou-se para Cassicíaco para se preparar para o batismo. Mônica estava com eles, participando da alegria de ver finalmente atendidas as orações de tantos anos.
Na noite de Páscoa de 387, na catedral de Milão, Ambrósio batizou Agostinho, Adeodato e os outros catecúmenos. As lágrimas de dor de Mônica se transformaram em lágrimas de alegria. Continuou a servi-los, tanto que em Cassicíaco Agostinho dirá: “Cuidou como se fosse mãe de todos e nos serviu como se fosse filha de todos.”.

Óstia: o êxtase e a morte
Após o batismo, Mônica e Agostinho se prepararam para voltar à África. Parando em Óstia, aguardando o navio, viveram um momento de intensa espiritualidade. As Confissões narram o êxtase de Óstia: mãe e filho, à janela, contemplaram juntos a beleza da criação e se elevaram a Deus, antecipando a bem-aventurança do céu.
Mônica dirá: “Filho, quanto a mim não encontro mais nenhum atrativo nesta vida. Não sei por que ainda estou aqui e o que faço aqui. Este mundo não é mais objeto de desejos para mim. Havia apenas um motivo para querer ficar um pouco mais nesta vida: ver-te cristão católico antes de morrer. Deus me atendeu além de toda minha expectativa, concedeu-me ver-te a seu serviço e liberto das aspirações de felicidade terrena. Para que estou aqui?” (Confissões IX, 10,11). Ela havia alcançado seu objetivo terreno.
Alguns dias depois, Mônica adoeceu gravemente. Sentindo a proximidade da morte, disse aos filhos: “Meus filhos, sepultem aqui sua mãe: não se preocupem com o lugar. Só lhes peço uma coisa: lembrem-se de mim no altar do Senhor, onde quer que estejam”. Essa foi a síntese de sua vida: não importava o local do sepultamento, mas o vínculo na oração e na Eucaristia.
Morreu aos 56 anos, em 12 de novembro de 387, e foi sepultada em Óstia. No século VI, suas relíquias foram transferidas para uma cripta escondida na mesma igreja de Santa Áurea. Em 1425, as relíquias foram transladas para Roma, na basílica de Santo Agostinho no Campo de Márcio, onde ainda hoje são veneradas.

O perfil espiritual de Mônica
Agostinho descreve sua mãe com palavras bem medidas:
“[…] feminina na aparência, viril na fé, vigilante na serenidade, maternal no amor, cristã na piedade […]”. (Confissões IX, 4,8).
E ainda:
“[…] viúva casta e sóbria, assídua na esmola, devota e submissa aos teus santos; que não deixava passar um dia sem levar a oferta ao teu altar, que duas vezes ao dia, de manhã e à noite, sem falta visitava tua igreja, e não para conversar inutilmente e tagarelar como as outras velhas, mas para ouvir tuas palavras e fazer ouvir suas orações. As lágrimas de tal mulher, que com elas te pedia não ouro nem prata, nem bens volúveis ou instáveis, mas a salvação da alma de seu filho, tu poderias desprezá-las, tu que assim a fizeste com tua graça, recusando-lhe teu socorro? Certamente não, Senhor. Tu, ao contrário, estavas ao lado dela e a atendias, operando segundo a ordem com que predestinaste que devesse operar.” (Confissões V, 9,17).

Desse testemunho agostiniano, emerge uma figura de surpreendente atualidade.
Foi uma mulher de oração: nunca deixou de invocar a Deus pela salvação de seus entes queridos. Suas lágrimas tornam-se modelo de intercessão perseverante.
Foi uma esposa fiel: em um casamento difícil, nunca respondeu com ressentimento à dureza do marido. Sua paciência e mansidão foram instrumentos de evangelização.
Foi uma mãe corajosa: não abandonou o filho em seus desvios, mas o acompanhou com amor tenaz, capaz de confiar nos tempos de Deus.
Foi uma testemunha de esperança: sua vida mostra que nenhuma situação é desesperadora, se vivida na fé.
A mensagem de Mônica não pertence apenas ao século IV. Fala ainda hoje, em um contexto em que muitas famílias vivem tensões: filhos se afastam da fé, pais experimentam a dificuldade da espera.
Ensina aos pais a não desistir, a crer que a graça opera de maneiras misteriosas.
Mostra às mulheres cristãs como a mansidão e a fidelidade podem transformar relações difíceis.
A quem se sinta desanimado na oração, testemunha que Deus escuta, mesmo que os tempos não coincidam com os nossos.
Não é por acaso que muitas associações e movimentos escolheram Mônica como padroeira das mães cristãs e das mulheres que rezam pelos filhos afastados da fé.

Uma mulher simples e extraordinária
A vida de Santa Mônica é a história de uma mulher simples e extraordinária ao mesmo tempo. Simples porque vivida no cotidiano de uma família; extraordinária porque transfigurada pela fé. Suas lágrimas e suas orações moldaram um santo e, através dele, marcaram profundamente a história da Igreja.
Sua memória, celebrada em 27 de agosto, na véspera da festa de Santo Agostinho, nos lembra que a santidade muitas vezes passa pela perseverança oculta, pelo sacrifício silencioso, pela esperança que não decepciona.
Nas palavras de Agostinho, dirigidas a Deus pela mãe, encontramos a síntese de sua herança espiritual: “Não posso dizer o quanto minha alma lhe é devedora, meu Deus; mas tu sabes tudo. Recompensa-a com tua misericórdia pelo que te pediu com tantas lágrimas por mim” (Conf., IX, 13).

Santa Mônica, através dos acontecimentos de sua vida, alcançou a felicidade eterna que ela mesma definiu: “A felicidade consiste, sem dúvida, em alcançar o fim e devemos confiar que podemos ser conduzidos a ele por uma fé firme, por uma viva esperança, por uma ardente caridade”. (A Felicidade 4,35).




Tornar-se um sinal de esperança em Essuatíni – Lesoto – África do Sul após 130 anos

No coração da África Austral, entre as belezas naturais e os desafios sociais de Essuatíni, Lesoto e África do Sul, os Salesianos celebram 130 anos de presença missionária. Neste tempo de Jubileu, de Capítulo Geral e de aniversários históricos, a Inspetoria África Meridional compartilha seus sinais de esperança: a fidelidade ao carisma de Dom Bosco, o compromisso educativo e pastoral entre os jovens e a força de uma comunidade internacional que testemunha fraternidade e resiliência. Apesar das dificuldades, o entusiasmo dos jovens, a riqueza das culturas locais e a espiritualidade do Ubuntu continuam a indicar caminhos de futuro e comunhão.

Saudações fraternas dos Salesianos da menor Visitadoria e da mais antiga presença na Região África-Madagascar (desde 1896, quando os primeiros 5 coirmãos foram enviados pelo P. Rua). Este ano agradecemos aos 130 SDB que trabalharam em nossos 3 países e que agora intercedem por nós do céu. “Pequeno é belo”!

No território da AFM vivem 65 milhões de pessoas que se comunicam em 12 línguas oficiais, entre tantas maravilhas da natureza e grandes recursos do subsolo. Estamos entre os poucos países da África subsaariana onde os católicos são uma pequena minoria em relação às outras Igrejas cristãs, com apenas 5 milhões de fiéis.

Quais são os sinais de esperança que nossos jovens e a sociedade estão buscando?
Em primeiro lugar, estamos tentando superar os famigerados recordes mundiais da crescente disparidade entre ricos e pobres (100.000 milionários contra 15 milhões de jovens desempregados), da falta de segurança e do aumento da violência no cotidiano, do colapso do sistema educacional, que produziu uma nova geração de milhões de analfabetos, lidando com várias dependências (álcool, drogas…). Além disso, 30 anos após o fim do regime do apartheid em 1994, a sociedade e a Igreja ainda estão divididas entre as várias comunidades em termos de economia, oportunidades e muitas feridas ainda não cicatrizadas. De fato, a comunidade do “País do Arco-Íris” está lutando com muitas “lacunas” que só podem ser “preenchidas” com os valores do Evangelho.

Quais são os sinais de esperança que a Igreja Católica na África do Sul está buscando?
Participando do encontro trienal “Joint Witness” [Testemunha Conjunta] dos superiores religiosos e bispos em 2024, percebemos muitos sinais de declínio: menos fiéis, falta de vocações sacerdotais e religiosas, envelhecimento e diminuição do número de religiosos, algumas dioceses em falência, perda contínua/diminuição de instituições católicas (assistência médica, educação, obras sociais ou mídia) devido à forte queda no número de religiosos e leigos comprometidos. A Conferência Episcopal Católica (SACBC – que inclui Botswana, Essuatíni e África do Sul) indica como prioridade o atendimento aos jovens dependentes de álcool e outras substâncias.

Quais são os sinais de esperança que os salesianos da África Meridional estão buscando?
Rezamos todos os dias por novas vocações salesianas, para poder acolher novos missionários. De fato, terminou a época da Inspetoria Anglo-Irlandesa (até 1988) e o Projeto África não incluía a ponta sul do continente. Após 70 anos em Essuatíni (ex-Suazilândia) e 45 anos no Lesoto, temos apenas 4 vocações locais de cada Reino. Hoje temos apenas 5 jovens coirmãos e 4 noviços em formação inicial. No entanto, a menor Visitadoria da África-Madagascar, através de suas 7 comunidades locais, é responsável pela educação e cuidado pastoral em 6 grandes paróquias, 18 escolas primárias e secundárias, 3 centros de formação profissional (TVET) e vários programas de assistência social. Nossa comunidade inspetorial, com 18 nacionalidades diferentes entre os 35 SDB que vivem nas 7 comunidades, é um grande dom e um desafio a ser acolhido.

Como comunidade católica minoritária e frágil da África Austral
Acreditamos que o único caminho para o futuro é construir mais pontes e comunhão entre os religiosos e as dioceses: quanto mais fracos somos, mais nos esforçamos para trabalhar juntos. Como toda a Igreja Católica busca focar nos jovens, Dom Bosco foi escolhido pelos bispos como Padroeiro da Pastoral Juvenil e sua Novena é celebrada com fervor na maioria das dioceses e paróquias no início do ano pastoral.

Como Salesianos e Família Salesiana, nos encorajamos constantemente uns aos outros: “work in progress” (um trabalho constante)
Nos últimos dois anos, após o convite do Reitor-Mor, temos buscado relançar nosso carisma salesiano, com a sabedoria de uma visão e direção comum (a partir da assembleia anual inspetorial), com uma série de pequenos e simples passos diários na direção certa e com a sabedoria da conversão pessoal e comunitária.

Somos gratos pelo encorajamento do P. Pascual Chávez para nosso recente Capítulo Inspetorial de 2024: «Vocês sabem bem que é mais difícil, mas não impossível, “refundar” do que fundar [o carisma], porque existem hábitos, atitudes ou comportamentos que não correspondem ao espírito do nosso Santo Fundador, Dom Bosco, e ao seu Projeto de Vida, e que têm “direito de cidadania” [na Inspetoria]. Há realmente necessidade de uma verdadeira conversão de cada coirmão a Deus, tendo o Evangelho como suprema regra de vida, e de toda a Inspetoria a Dom Bosco, assumindo as Constituições como verdadeiro projeto de vida».

Foi aprovado o conselho do P. Pascual e o compromisso: “Tornar-se mais apaixonados por Jesus e dedicados aos jovens”, investindo na conversão pessoal (criando um espaço sagrado em nossa vida, para deixar que Jesus a transforme), na conversão comunitária (investindo na formação permanente sistemática mensal segundo um tema) e na conversão inspetorial (promovendo a mentalidade inspetorial através do “One Heart One Soul” [Um só coração e uma só alma] – fruto da nossa assembleia inspetorial) e com encontros mensais online dos diretores.

Na foto de lembrança da nossa Visitadoria do Beato Miguel Rua, ao lado dos rostos de todos os 46 coirmãos e 4 noviços (35 vivem em nossas 7 comunidades, 7 estão em formação no exterior e 5 SDB aguardam visto; um está nas catacumbas de São Calisto e um missionário faz quimioterapia na Polônia). Também somos abençoados por um número crescente de coirmãos missionários enviados pelo Reitor-Mor ou por um período específico por outras Inspetorias africanas para nos ajudar (AFC, ACC, ANN, ATE, MDG e ZMB). Somos muito gratos a cada um desses jovens coirmãos. Acreditamos que, com a ajuda deles, nossa esperança de relançamento carismático está se tornando tangível. Nossa Visitadoria – a menor da África-Madagascar, após quase 40 anos da fundação, ainda não tem uma verdadeira casa inspetorial. A construção começou, com a ajuda do Reitor-Mor, apenas no ano passado. Também aqui dizemos: “trabalhos em andamento”…

Queremos compartilhar também nossos humildes sinais de esperança com todas as outras 92 Inspetorias neste precioso período do Capítulo Geral. A AFM tem uma experiência única de 31 anos de voluntários missionários locais (envolvidos na Pastoral Juvenil do Centro Juvenil Bosco de Joanesburgo desde 1994), o programa “Love Matters” [O amor é o que importa] para um crescimento sexual saudável dos adolescentes desde 2001. Nossos voluntários, de fato, envolvidos por um ano inteiro na vida da nossa comunidade, são os membros mais preciosos da nossa Missão e dos novos grupos da Família Salesiana que estão crescendo lentamente (VDB, Salesianos Cooperadores e Ex-alunos de Dom Bosco).

Nossa casa-mãe na Cidade do Cabo celebrará já no próximo ano seu centésimo trigésimo (130º) aniversário e, graças ao centésimo quinquagésimo (150º) aniversário das Missões Salesianas, realizamos, com a ajuda da Inspetoria da China, uma especial “Sala da Memória de São Luís Versiglia”, onde nosso Protomártir passou um dia durante seu retorno da Itália para a China-Macau em maio de 1917.

Dom Bosco ‘Ubuntu’ – caminho sinodal
“Estamos aqui graças a vocês!” – Ubuntu é uma das contribuições das culturas da África Meridional para a comunidade global. A palavra na língua Nguni significa “Eu sou porque vocês são” (“I’m because you are!”. Outras possíveis traduções: “Eu existo porque vocês existem”). No ano passado iniciamos o projeto “Eco Ubuntu” (projeto de conscientização ambiental com duração de 3 anos) que envolve cerca de 15.000 jovens das nossas 7 comunidades em Essuatíni, Lesoto e África do Sul. Além da linda celebração e da partilha do Sínodo dos Jovens 2024, nossos 300 jovens [que participaram] guardam principalmente o Ubuntu em suas memórias. O entusiasmo deles é uma fonte de inspiração. A AFM precisa de vocês: Estamos aqui graças a vocês!

Marco Fulgaro




Mensagem do Padre Fábio Attard na festa do Reitor-Mor

Caríssimos irmãos, caríssimos colaboradores e colaboradoras das nossas Comunidades Educativo-Pastorais, caríssimos jovens,

            Permitam-me compartilhar com vocês esta mensagem que vem do fundo do meu coração. Eu a comunico com todo o carinho, apreço e respeito que tenho por cada um de vocês enquanto se empenham na missão de educadores, pastores e animadores dos jovens em todos os continentes.
            Todos nós sabemos que a educação dos jovens exige cada vez mais pessoas adultas significativas, pessoas com uma espinha dorsal moralmente sólida, capazes de transmitir esperança e visão para o futuro deles.
            Enquanto todos nós estamos comprometidos em caminhar com os jovens, acolhendo-os em nossas casas, oferecendo-lhes oportunidades educativas de todos os tipos e gêneros, na variedade de ambientes que promovemos, também estamos conscientes dos desafios culturais, sociais e econômicos que devemos enfrentar.
            Junto com esses desafios que fazem parte de todo processo educativo-pastoral, por se tratar sempre de um diálogo contínuo com as realidades terrenas, reconhecemos que, como consequência das situações de guerras e conflitos armados em várias partes do mundo, o chamado que vivemos está se tornando mais complexo e difícil. Tudo isso afeta o compromisso que estamos levando adiante. É encorajador ver que, apesar das dificuldades que enfrentamos, estamos determinados a continuar vivendo a nossa missão com convicção.
            Nestes últimos meses, a mensagem do Papa Francisco e agora a palavra do Papa Leão XIV têm convidado continuamente o mundo a encarar essa dolorosa situação que parece uma espiral que cresce de forma assustadora. Sabemos que as guerras nunca produzem paz. Estamos conscientes, e alguns de nós o estão vivendo na linha de frente, que todo conflito armado e toda guerra trazem sofrimento, dor e aumentam todo tipo de pobreza. Todos nós sabemos que aqueles que acabam pagando o preço dessas situações são os deslocados, os idosos, as crianças e os jovens que se encontram sem presente e sem futuro.
            Por esse motivo, queridos irmãos, queridos colaboradores e jovens do mundo todo, gostaria de pedir gentilmente que, para a festa do Reitor-Mor, que é uma tradição que remonta aos tempos de Dom Bosco, cada comunidade celebre a Santa Eucaristia pela paz ao redor do dia da festa do Reitor-Mor.
            É um convite à oração que tem a sua fonte no sacrifício de Cristo, crucificado e ressuscitado. Uma oração como testemunho para que ninguém permaneça indiferente diante de uma situação mundial abalada por um número crescente de conflitos.
            Este nosso é um gesto de solidariedade para com todos aqueles, especialmente salesianos, leigos e jovens, que neste momento particular, com grande coragem e determinação, continuam a viver a missão salesiana em meio a situações marcadas por guerras. São salesianos, leigos e jovens que pedem e valorizam a solidariedade de toda a Congregação, solidariedade humana, solidariedade espiritual, solidariedade carismática.
            Enquanto de minha parte e de todo o Conselho Geral estamos fazendo o que é possível para estar muito próximos de todos de forma concreta, acredito que neste momento particular deve ser dado esse sinal de proximidade e encorajamento por parte de toda a Congregação.
            A vocês, queridos irmãos e queridas irmãs em Myanmar, Ucrânia, Oriente Médio, Etiópia, Leste da República Democrática do Congo, Nigéria, Haiti e América Central, queremos dizer em voz alta que estamos com vocês. Agradecemos o seu testemunho. Asseguramos a nossa proximidade humana e espiritual.
            Continuemos a rezar pelo dom da paz. Continuemos a rezar por esses nossos irmãos, leigos e jovens que, vivendo em situações muito difíceis, continuam a esperar e a rezar para que surja a paz. O exemplo deles, a doação de si mesmos e a sua pertença ao carisma de Dom Bosco, é para nós um testemunho forte. Eles, junto com muitas pessoas consagradas, sacerdotes e leigos comprometidos, são os mártires modernos, ou seja, testemunhas da educação e da evangelização, que apesar de tudo, como verdadeiros pastores e ministros da caridade evangélica, continuam a amar, acreditar e esperar por um futuro melhor.
            Todos nós assumimos com todo o nosso coração este chamado à solidariedade. Obrigado.

Prot. 25/0243 Roma, 24 de junho de 2025
don Fabio ATTARD,
Reitor-Mor

Foto: shutterstock.com




El Venerable padre Carlo Crespi “testigo y peregrino de esperanza”

El padre Carlo Crespi, misionero salesiano en Ecuador, vivió su vida dedicándose a la fe y a la esperanza. En los últimos años, en el santuario de María Auxiliadora, consoló a los fieles, infundiendo optimismo incluso en los momentos de crisis. Su práctica ejemplar de las virtudes teologales, evidenciada por el testimonio de quienes lo conocieron, se expresó también en el compromiso por la educación: fundando escuelas e institutos, ofreció a los jóvenes nuevas perspectivas. Su ejemplo de resiliencia y dedicación continúa iluminando el camino espiritual y humano de la comunidad. Su legado perdura e inspira a generaciones de creyentes.

            En los últimos años de su vida, el padre Carlo Crespi (Legnano, 29 de mayo de 1891 – Cuenca, 30 de abril de 1982), misionero salesiano en Ecuador, dejando gradualmente en segundo plano los anhelos académicos de la juventud, se rodea de esencialidad y su crecimiento espiritual parece imparable. Se le ve en el santuario de María Auxiliadora divulgando la devoción a la Virgen, confesando y aconsejando a filas interminables de fieles, para quienes los horarios, las comidas e incluso el sueño ya no cuentan. Así como lo había hecho de manera ejemplar durante toda su vida, mantiene la mirada fija hacia los bienes eternos, que ahora parecen más cercanos que nunca.
            Él tenía esa esperanza escatológica que se liga a las expectativas del hombre en vida y más allá de la muerte, influyendo de modo significativo en la visión del mundo y el comportamiento cotidiano. Según san Pablo, la esperanza es un ingrediente indispensable para una vida que se dona, que crece colaborando con los otros y desarrollando la propia libertad. El futuro se convierte así en una tarea colectiva que nos hace crecer como personas. Su presencia nos invita a mirar al futuro con un sentido de confianza, iniciativa y conexión con los demás.
            ¡Esta era la esperanza del Venerable padre Crespi! Una gran virtud que, como los brazos de un yugo, sostiene la fe y la caridad; como el brazo transversal de la cruz es trono de salvación, es apoyo de la serpiente saludable levantada por Moisés en el desierto; puente del alma para emprender el vuelo en la luz.
            El no común nivel alcanzado por el padre Crespi en la práctica de todas las virtudes ha sido evidenciado, de manera concorde, por los testigos escuchados en el curso de la Investigación diocesana de la Causa de beatificación, pero emerge también del análisis atento de los documentos y de las vicisitudes biográficas del padre Carlo Crespi. El ejercicio de las virtudes cristianas por su parte fue, según quienes lo conocieron, no solo fuera de lo común, sino también constante en el curso de su larga vida. La gente lo seguía fielmente porque en su cotidiano traslucía, casi naturalmente, el ejercicio de las virtudes teologales, entre las cuales la esperanza destacaba de modo particular en los tantos momentos de dificultad. Él sembró la esperanza en el corazón de las personas y vivió tal virtud en grado máximo.
            Cuando la escuela “Cornelio Merchan” fue destruida por un incendio, al pueblo que acudió llorando delante de las ruinas humeantes, él, también llorando, manifestó una constante y no común esperanza animando a todos: “Pachilla ya no está, pero nosotros construiremos una mejor y los niños serán más felices y más contentos”. De sus labios no salió nunca una palabra de amargura o de dolor por lo que se había perdido.
            En la escuela de don Bosco y de Mamá Margarita, ha vivido y testimoniado la esperanza en plenitud porque, confiando en el Señor y esperando en la Divina Providencia, ha realizado grandes obras y servicios sin presupuesto, aunque nunca le faltó el dinero. No tenía tiempo para agitarse o desesperarse, su actitud positiva daba confianza y esperanza a los demás.
            Don Carlo era descrito a menudo como un hombre de corazón rico de optimismo y esperanza ante los grandes sufrimientos de la vida, porque estaba inclinado a relativizar las vicisitudes humanas, incluso las más difíciles; en medio de su gente era testigo y peregrino de esperanza en el camino de la vida.
            Muy edificante, a fin de comprender de qué modo y en cuáles ámbitos de la vida del Venerable la virtud de la esperanza encontró concreta expresión, es también el relato que el mismo padre Carlo Crespi hace en una carta, enviada desde Cuenca en 1925, al Rector Mayor don Filippo Rinaldi. En ella, acogiendo una insistente solicitud suya, le refiere un episodio vivido en primera persona, cuando, al consolar a una mujer kivara por la pérdida prematura del hijo, le anuncia la buena nueva de la vida sin fin: “Conmovido hasta las lágrimas me acerqué a la venerable hija de la selva de los cabellos sueltos al viento: le aseguré que el hijo había muerto bien, que antes de morir no había tenido en los labios más que el nombre de la madre lejana, y que había tenido una sepultura en una caja expresamente trabajada, siendo ciertamente su alma recogida por el gran Dios en el Paraíso […]. Pude entonces intercambiar tranquilamente algunas palabras, echando en aquel corazón destrozado el suave bálsamo de la Fe y de la Esperanza cristiana”.
            La práctica de la virtud de la esperanza creció paralelamente a la práctica de las otras virtudes cristianas, incentivándolas: fue hombre rico de fe, de esperanza y de caridad.
            Cuando la situación socioeconómica de Cuenca en el siglo XX empeoró notablemente, creando importantes repercusiones en la vida de la población, tuvo la intuición de comprender que formando a los jóvenes desde un punto de vista humano, cultural y espiritual, habría sembrado en ellos la esperanza en una vida y en un futuro mejor, contribuyendo a cambiar la suerte de la entera sociedad.
            El padre Crespi emprendió, por lo tanto, numerosas iniciativas en favor de la juventud de Cuenca, partiendo ante todo de la educación escolar. La Escuela Popular Salesiana “Cornelio Merchán”; el Colegio Normal Orientalista dirigido a los enseñantes salesianos; la fundación de las escuelas de artes y oficios – que sucesivamente se convirtieron en el “Técnico Salesiano” y el Instituto Tecnológico Superior, culminante en la Universidad Politécnica Salesiana – confirman el deseo del Siervo de Dios de ofrecer a la población cuencana mejores y más numerosas perspectivas para un crecimiento espiritual, humano y profesional. Los jóvenes y los pobres, considerados ante todo como hijos de Dios destinados a la beatitud eterna, fueron por lo tanto alcanzados por el padre Crespi a través de una promoción humana y social capaz de confluir en una dinámica más amplia, la de la salvación.
            Todo esto fue realizado por él con pocos medios económicos, pero abundante esperanza en el futuro de los jóvenes. Trabajó activamente sin perder de vista el objetivo último de la propia misión: la consecución de la vida eterna. Es precisamente en este sentido que el padre Carlo Crespi entendió la virtud teologal de la esperanza y es a través de esta perspectiva que pasó todo su sacerdocio.
            La reafirmación de la vida eterna fue sin duda uno de los temas centrales tratados en los escritos del padre Carlo Crespi. Este dato nos permite captar la evidente importancia por él asignada a la virtud de la esperanza. Tal dato muestra claramente cómo la práctica de esta virtud permeó constantemente el recorrido terreno del Siervo de Dios.
            Ni siquiera la enfermedad pudo apagar la inagotable esperanza que siempre animó al padre Crespi.
            Poco antes de cerrar su propia existencia terrena don Carlo pidió que le fuera dado entre las manos un crucifijo. Su muerte ocurrió el 30 de abril de 1982 a las 17.30 en la Clínica Santa Inés de Cuenca a causa de una bronconeumonía y de un ataque cardíaco.
            El médico personal del Venerable Siervo de Dios, que durante 25 años y hasta la muerte, fue testigo directo de la serenidad y de la conciencia con la cual el padre Crespi, que siempre había vivido con la mirada dirigida al cielo, vivió el tan esperado encuentro con Jesús.
            En el proceso testimonió: “Para mí una señal especial es precisamente aquella actitud de haber comunicado con nosotros en un acto simplemente humano, riendo y bromeando y, cuando -digo- ha visto que las puertas de la eternidad estaban abiertas y quizás la Virgen lo esperaba, nos ha hecho callar y nos ha hecho rezar a todos”.

Carlo Riganti
Presidente Asociación Carlo Crespi




Com Nino Baglieri, peregrino da Esperança, no caminho do Jubileu

O percurso do Jubileu 2025, dedicado à Esperança, encontra um testemunho luminoso na história do Servo de Deus Nino Baglieri. Da queda dramática aos dezessete anos, que o tornou tetraplégico, até o renascimento interior em 1978, Baglieri passou da sombra do desespero para a luz de uma fé ativa, transformando sua cama de dor em escola de alegria. Sua história entrelaça os cinco sinais jubilares – peregrinação, porta, profissão de fé, caridade e reconciliação – mostrando que a esperança cristã não é fuga, mas força que abre o futuro e sustenta todo caminho.

1. Esperar como expectativa
            A esperança, segundo o dicionário on-line Treccani, é um sentimento de “confiante expectativa na realização, presente ou futura, do que se deseja”. A etimologia do substantivo “esperança” deriva do latim spes, que por sua vez vem da raiz sânscrita spa-, que significa tender a um objetivo. Na língua espanhola, “esperar” e “aguardar” são traduzidos pelo verbo esperar, que reúne em uma única palavra ambos os significados: como se só se pudesse aguardar aquilo que se espera. Esse estado de espírito nos permite enfrentar a vida e seus desafios com coragem e uma luz no coração sempre acesa. A esperança é expressa – positiva ou negativamente – também em alguns provérbios da sabedoria popular: “A esperança é a última que morre”, “Enquanto há vida, há esperança”, “Quem vive de esperança, morre desesperado”.
            Quase recolhendo esse “sentir compartilhado” sobre a esperança, mas consciente da necessidade de ajudar a redescobrir a esperança em sua dimensão mais plena e verdadeira, o Papa Francisco quis dedicar o Jubileu Ordinário de 2025 à Esperança (Spes non confundit [A esperança não engana] é a Bula de convocação) e, já em 2014, dizia: “A ressurreição de Jesus não é o final feliz de uma bonita fábula, não é o happy end de um filme; mas a intervenção de Deus Pai sobrevém onde se rompe a esperança humana. O momento em que tudo parece perdido, na hora do sofrimento, no qual numerosas pessoas sentem como que a necessidade de descer da cruz, é o momento mais próximo da ressurreição. A morte torna-se mais obscura precisamente antes que desponte a manhã, antes que surja a luz. É na hora mais obscura que Deus intervém e ressuscita” (cf. Audiência de 16 de abril de 2014).
            Nesse contexto, encaixa-se perfeitamente a história do Servo de Deus Nino Baglieri (Modica, 1º de maio de 1951 – 2 de março de 2007), que, jovem pedreiro de dezessete anos, ao cair de um andaime de dezessete metros devido ao súbito rompimento de uma tábua, chocou-se contra o chão, ficando tetraplégico: desde essa queda, em 6 de maio de 1968, só pôde mover a cabeça e o pescoço, dependendo dos outros em tudo para toda a vida, até nas coisas mais simples e humildes. Nino não podia nem apertar a mão de um amigo, nem fazer um carinho na mãe… e via desaparecer a possibilidade de realizar seus sonhos. Que esperança de vida tem agora esse jovem? Com quais sentimentos pode lidar? Que futuro o espera? A primeira resposta de Nino foi o desespero, a escuridão total diante de uma busca de sentido que não encontrava resposta: primeiro uma longa peregrinação por hospitais de várias regiões italianas, depois a compaixão de amigos e conhecidos levou Nino a se rebelar e se fechar em dez longos anos de solidão e raiva, enquanto o túnel da vida se aprofundava cada vez mais.
            Na mitologia grega, Zeus confia a Pandora um vaso que contém todos os males do mundo: ao ser aberto, os homens perdem a imortalidade e começam uma vida de sofrimento. Para salvá-los, Pandora reabre o vaso e libera elpis, a esperança, que ficou no fundo: era o único antídoto para as aflições da vida. Olhando para o Doador de todo bem, sabemos que «a esperança não engana» (Rm 5,5). O Papa Francisco, na Spes non confundit, escreve: “Sob o sinal da esperança, o apóstolo Paulo infunde coragem à comunidade cristã de Roma. […]. Todos esperam. No coração de cada pessoa, encerra-se a esperança como desejo e expetativa do bem, apesar de não saber o que trará consigo o amanhã. Porém, esta imprevisibilidade do futuro faz surgir sentimentos por vezes contrapostos: desde a confiança ao medo, da serenidade ao desânimo, da certeza à dúvida. Muitas vezes encontramos pessoas desanimadas que olham, com ceticismo e pessimismo, para o futuro como se nada lhes pudesse proporcionar felicidade. Que o Jubileu seja, para todos, ocasião de reanimar a esperança” (Ibid., 1).

2. De Testemunha do “desespero” a “embaixador” da esperança
            Voltemos então à história do nosso Servo de Deus, Nino Baglieri.
            Foram necessários dez longos anos para que Nino saísse do túnel do desespero, as densas trevas se dissipassem e entrasse a Luz. Era a tarde de 24 de março, Sexta-feira Santa de 1978, quando o P. Aldo Modica, com um grupo de jovens, foi à casa de Nino, à pedido da sua mãe, Peppina, e por algumas pessoas que frequentavam o caminho do Renovação Carismática, então em seus primórdios na vizinha paróquia salesiana. Escreve Nino: “Enquanto invocavam o Espírito Santo, senti uma sensação estranhíssima, um grande calor invadia meu corpo, um forte formigamento em todos os [meus] membros, como se uma força nova entrasse em mim e algo velho saísse. Naquele momento disse meu ‘sim’ ao Senhor, aceitei minha cruz e renasci para uma vida nova, tornei-me um homem novo. Dez anos de desespero apagados em poucos instantes, porque uma alegria desconhecida entrou no meu coração. Eu desejava a cura do meu corpo e, em vez disso, o Senhor me concedia uma alegria ainda maior: a cura espiritual”.
            Começa para Nino um novo caminho: de “testemunha do desespero” torna-se “peregrino da esperança”. Não mais isolado em seu quartinho, mas “embaixador” dessa esperança, conta sua experiência por meio de um programa transmitido por uma rádio local e – graça ainda maior – o bom Deus lhe dá a alegria de poder escrever com a boca. Nino confessa: “No mês de março de 1979, o Senhor me fez um grande milagre: aprendi a escrever com a boca, comecei assim, estava com meus amigos que estavam fazendo os deveres, pedi para me darem um lápis e um caderno, comecei a fazer sinais e a desenhar algo, mas depois descobri que podia escrever e assim comecei a escrever”. Começa então a redigir suas memórias e a manter contato por carta com pessoas de todas as categorias e em várias partes do mundo, com milhares de cartas até hoje guardadas. A esperança reencontrada o torna criativo, agora Nino redescobre o gosto pelas relações e quer se tornar – como pode – independente: com a ajuda de uma vareta que usa com a boca e de um elástico aplicado ao telefone, disca os números para se comunicar com muitas pessoas doentes, para lhes dirigir uma palavra de conforto. Descobre uma nova forma de enfrentar sua condição de sofrimento, que o tira do isolamento e o leva a se tornar testemunha do Evangelho da alegria e da esperança: “Agora há muita alegria no meu coração, em mim não existe mais dor, no meu coração há o Teu amor. Obrigado, Jesus, meu Senhor, do meu leito de dor quero Te louvar e com todo o meu coração Te agradecer porque me chamaste para conhecer a vida, para conhecer a verdadeira vida”.
            Nino mudou de perspectiva, fez uma volta de 180 graus – o Senhor lhe deu a conversão – depositou sua confiança naquele Deus misericordioso que, através da “desgraça”, o chamou para trabalhar em sua vinha, para ser sinal e instrumento de salvação e esperança. Assim, muitas pessoas que iam visitá-lo para consolá-lo saíam consoladas, com lágrimas nos olhos: não encontravam naquela caminha um homem triste e abatido, mas um rosto sorridente que irradiava – apesar de tantas dores, entre elas as feridas e os problemas respiratórios – alegria de viver: o sorriso era constante em seu rosto e Nino se sentia “útil em um leito de dor”. Nino Baglieri é o oposto de muitas pessoas hoje, eternamente em busca do sentido da vida, que buscam o sucesso fácil e a felicidade de coisas efêmeras e sem valor, vivem on-line, consomem a vida em um clique, querem tudo e já, mas têm os olhos tristes, apagados. Nino aparentemente não tinha nada, e, no entanto, tinha paz e alegria no coração: não viveu isolado, mas sustentado pelo amor de Deus expresso pelo abraço e pela presença de toda sua família e de cada vez mais pessoas que o conhecem e se relacionam com ele.

3. Reavivar a esperança
            Construir a esperança é: toda vez que não me contento com minha vida e me esforço para mudá-la. Toda vez que não me deixo endurecer pelas experiências negativas e evito que elas me tornem desconfiado. Toda vez que caio e tento me levantar, que não permito que os medos tenham a última palavra. Toda vez que, em um mundo marcado por conflitos, escolho a confiança e a renovação constante, com todos. Toda vez que não fujo do sonho de Deus que me diz: “quero que sejas feliz”, “quero que tenhas uma vida plena… plena também de santidade”. O ápice da virtude da esperança é, de fato, um olhar para o Céu para habitar bem a terra ou, como diria Dom Bosco, um caminhar com os pés no chão e o coração no Céu.
            Nesse caminho de esperança se realiza o jubileu que, com seus sinais, nos pede para nos pôr em movimento, para atravessar algumas fronteiras.
            Primeiro sinal, a peregrinação: quando nos movemos de um lugar para outro, estamos abertos ao novo, à mudança. Toda a vida de Jesus foi “um pôr-se a caminho”, um caminho de evangelização que se realiza no dom da vida e depois além, com a Ressurreição e a Ascensão.
            Segundo sinal, a porta: em Jo 10,9 Jesus afirma «Eu sou a porta. Se alguém entrar por mim, será salvo; tanto entrará como sairá e encontrará pastagem». Passar pela porta é deixar-se acolher, ser comunidade. No evangelho fala-se também da “porta estreita”: o Jubileu torna-se caminho de conversão.
            Terceiro sinal, a profissão de fé: expressar a pertença a Cristo e à Igreja e declará-lo publicamente.
            Quarto sinal, a caridade: a caridade é a senha para o céu, em 1Pd 4,8 o apóstolo Pedro admoesta «mantende entre vós uma ardente caridade, porque a caridade cobre a multidão dos pecados».
            Quinto sinal, portanto, a reconciliação e a indulgência jubilar: trata-se de um “tempo favorável” (cf. 2Cor 6,2) para experimentar a grande misericórdia de Deus e percorrer caminhos de reaproximação e perdão para com os irmãos; para viver a oração do Pai Nosso onde se pede “perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. É tornar-se criaturas novas.
            Também na vida de Nino há episódios que o ligam – no “fio” da esperança – a essas dimensões jubilares. Por exemplo, o arrependimento por algumas travessuras da infância, como quando, em três (ele conta), “roubávamos as ofertas das Missas na sacristia, usávamos para jogar pebolim. Quando se encontra más companhias, elas levam para os maus caminhos. Depois um pegou o molho de chaves do Oratório e escondeu na minha bolsa de livros que estava no escritório; encontraram as chaves, chamaram os pais, nos deram dois tapas e nos expulsaram da escola. Vergonha!”. Mas sobretudo na vida de Nino há a caridade, ajudar o irmão pobre, na prova física e moral, fazer-se presente para quem tem dificuldades até psicológicas e alcançar por escrito os irmãos na prisão para testemunhar-lhes a bondade e o amor de Deus. A Nino, que antes da queda fora pedreiro, «[eu] gostava construir com minhas mãos algo que permanecesse no tempo: também agora – escreve – sinto-me um pedreiro que trabalha no Reino de Deus, para deixar algo que permaneça no tempo, para ver as Obras Maravilhosas de Deus que realiza em nossa Vida». Confessa: «Meu corpo parece morto, mas no meu peito continua a bater meu coração. As pernas não se movem, e, no entanto, pelas estradas do mundo eu caminho».

4. Peregrino rumo ao céu
            Nino, salesiano cooperador, consagrado da grande Família Salesiana, conclui sua “peregrinação” terrena na sexta-feira, 2 de março de 2007, às 8h da manhã, aos 55 anos, dos quais 39 foram vividos como tetraplégico entre cama e cadeira de rodas, após pedir desculpas à família pelas dificuldades que teve que enfrentar devido à sua condição. Deixa o palco deste mundo usando agasalho e tênis esportivo, como tinha expressamente pedido, para correr pelos verdes prados floridos e saltitar como uma corça ao longo dos cursos d’água. Lemos em seu Testamento Espiritual: “Nunca deixarei de agradecer-te, ó Senhor, por me ter chamado a Ti através da Cruz em 6 de maio de 1968. Uma cruz pesada para minhas forças jovens…”. No dia 2 de março, a vida – dom contínuo que começa com os pais e é lentamente alimentado com surpresa e beleza – insere para Nino Baglieri sua peça mais importante: o abraço com seu Senhor e Deus, acompanhado por Nossa Senhora.
            Ao saber de sua partida, de muitos lugares se ergue um coro unânime: «morreu um santo», um homem que fez de seu leito de dor o estandarte da vida plena, dom para todos. Portanto, um grande testemunho de esperança.
            Passados cinco anos da morte, assim como previsto pelas Normae Servandae in Inquisitionibus ab Episcopis faciendis in Causis Sanctorum de 1983, o bispo da Diocese de Noto, a pedido do Postulador Geral da Congregação Salesiana, ouvido o Conselho Episcopal Siciliano e obtido o Nihil obstat da Santa Sé, abre a Inquérito Diocesano da Causa de Beatificação e Canonização do Servo de Deus Nino Baglieri.
            O processo diocesano, que durou doze anos, desenvolveu-se ao longo de duas linhas principais: o trabalho da Comissão de História que pesquisou, coletou, estudou e apresentou muitas fontes, sobretudo Escritos “do” e “sobre” o Servo de Deus; o Tribunal Eclesiástico, titular do Inquérito, que também ouviu sob juramento as testemunhas.
            Esse percurso foi concluído no último dia 5 de maio de 2024, na presença de Dom Salvatore Rumeo, atual bispo da diocese de Noto. Poucos dias depois, os Atos processuais foram entregues ao Dicastério das Causas dos Santos, que procedeu à sua abertura em 21 de junho de 2024. No início de 2025, o mesmo Dicastério decretou sua “Validade Jurídica”, com a qual a fase romana da Causa pode entrar em seu momento principal.
            Agora, a contribuição para a Causa continua também divulgando a figura de Nino, que ao final de seu caminho terreno recomendou: “Não me deixem sem fazer nada. Eu continuarei do céu minha missão. Escreverei para vocês do Paraíso”.
            O caminho da esperança em sua companhia torna-se assim desejo do Céu, quando “encontrar-nos-emos face a face com a beleza infinita de Deus (cf. 1 Cor13, 12) e poderemos ler, com jubilosa admiração, o mistério do universo, o qual terá parte conosco na plenitude sem fim. […]. Na expectativa da vida eterna, unimo-nos para tomar a nosso cargo esta casa que nos foi confiada, sabendo que aquilo de bom que há nela será assumido na festa do Céu. Juntamente com todas as criaturas, caminhamos nesta terra à procura de Deus. […]. Caminhemos cantando!” (cf. Laudato Si’, 243-244).

Roberto Chiaramonte




Dom Bosco, promotor da “misericórdia divina”

Como padre muito jovem, Dom Bosco publicou um volume, em pequeno formato, intitulado “Exercício da devoção à Misericórdia de Deus”.

Tudo começou com a Marquesa de Barolo
            A Marquesa Júlia Colbert di Barolo (1785-1864), declarada Venerável pelo Papa Francisco em 12 de maio de 2015, cultivou pessoalmente uma devoção especial à misericórdia divina; por isso, nas comunidades religiosas e educacionais que havia fundado perto de Valdocco, tinha introduzido o costume de uma semana de meditações e orações sobre este assunto. Mas ela não estava satisfeita. Ela queria que essa prática se espalhasse também em outros lugares, especialmente nas paróquias, no meio do povo. Pediu o consentimento da Santa Sé, que não só concordou, mas também concedeu várias indulgências em favor dessa prática devocional. Tratava-se então de fazer uma publicação adequada ao fim a que se destinava.
            Estamos no verão de 1846, quando Dom Bosco, tendo superado a grave crise de esgotamento que o havia levado à beira da sepultura, se retirou para junto de Mamãe Margarida nos Becchi para convalescer e se “demitiu” de seu muito apreciado serviço como capelão de uma das obras de Barolo, com grande desgosto da própria Marquesa. Mas “seus jovens” o chamaram para a casa Pinardi, recentemente alugada.
            A essa altura interveio o famoso patriota Sílvio Péllico, secretário da marquesa e admirador e amigo de Dom Bosco, que tinha musicado alguns de seus poemas. As memórias salesianas nos dizem que Péllico, com uma certa ousadia, propôs à marquesa que encarregasse Dom Bosco de fazer a publicação que lhe interessava. O que fez a marquesa? Ela aceitou, embora não com muito entusiasmo. Quem sabe? Talvez ela quisesse colocá-lo à prova. E Dom Bosco também aceitou.

Um tema muito caro ao seu coração
            O tema da misericórdia de Deus estava entre seus interesses espirituais, aqueles sobre os quais ele havia sido formado no seminário de Chieri e, sobretudo, no Colégio Eclesiástico de Turim. Fazia só dois anos ele havia terminado de frequentar as aulas de seu conterrâneo São José Cafasso, apenas quatro anos mais velho que ele, mas seu diretor espiritual, cujos sermões seguia nos exercícios espirituais para sacerdotes, mas também o formador de meia dúzia de outros fundadores, alguns deles até santos. Pois bem, Cafasso, embora filho da cultura religiosa de seu tempo – feita de prescrições e da lógica de “fazer o bem para escapar do castigo divino e merecer o Paraíso” – não perdia uma oportunidade de falar da misericórdia de Deus, tanto em suas aulas como na pregação. E como podia deixar de fazê-lo, se se dedicava constantemente ao sacramento da Penitência e à assistência aos condenados à morte? Tanto mais que esta devoção indulgenciada constituía na época uma reação pastoral contra o rigorismo do jansenismo que sustentava a predestinação dos que eram salvos.
            Assim, Dom Bosco, logo que voltou do seu povoado, no início de novembro, começou a trabalhar, seguindo as práticas piedosas aprovadas por Roma e espalhadas pelo Piemonte. Com a ajuda de alguns textos que facilmente pôde encontrar na biblioteca do Colégio que ele conhecia muito bem, no fim do ano publicou, às suas custas, um livrinho de 111 páginas, num formato pequeno, intitulado “Exercício de devoção à Misericórdia de Deus”. Ele o doou imediatamente às meninas, mulheres e freiras das fundações Barolo. Não está documentado, mas a lógica e a gratidão quer que ele o tenha presenteado também à Marquesa Barolo, promotora do projeto. Mas a mesma lógica e gratidão fariam com que a Marquesa não se deixasse vencer em generosidade, enviando-lhe, talvez anonimamente como em outras ocasiões, uma contribuição para as despesas.
            Não há aqui espaço para apresentar os conteúdos “clássicos” do livrinho de meditações e orações de Dom Bosco; gostaríamos apenas de assinalar que seu princípio básico é: “cada um deve invocar a Misericórdia de Deus para si e para todos os homens, porque «somos todos pecadores», […] todos necessitados de perdão e de graça […] todos chamados à salvação eterna”.
            Significativo, pois, é o fato de que, ao concluir cada dia da semana, Dom Bosco, na lógica do título “exercícios de devoção”, ofereça uma prática de piedade: convidar outros a intervir, perdoar aquele que nos ofendeu, fazer logo uma mortificação para obter a misericórdia de Deus para todos os pecadores, dar alguma esmola ou substituí-la pela recitação de orações ou jaculatórias etc. No último dia, a prática é substituída por um belo convite, talvez até alusivo à Marquesa Barolo, para rezar “pelo menos uma Ave Maria para a pessoa que promoveu essa devoção”.

Prática educativa
            Mas, além dos escritos com fins edificantes e formativos, pode-se perguntar como Dom Bosco educou concretamente seus jovens para que confiassem na misericórdia divina. A resposta não é difícil e poderia ser documentada de muitas maneiras. Limitar-nos-emos a três experiências vitais vividas em Valdocco: os sacramentos da Confissão e da Comunhão e sua figura de um “pai cheio de bondade e de amor”.

A Confissão
            Dom Bosco iniciou centenas de jovens de Valdocco na vida cristã adulta. Mas com que meios? Dois em particular: Confissão e Comunhão.
            Como se sabe, Dom Bosco é um dos grandes apóstolos da Confissão, e isso se deve, antes de tudo, ao exercício pleno desse ministério, como fez, aliás, seu mestre e diretor espiritual, o P. Cafasso, acima mencionado, e a figura muito admirada de seu quase contemporâneo o santo Cura d’Ars (1876-1859). Se a vida do segundo, como está escrito, “foi passada no confessionário” e a do primeiro pôde oferecer muitas horas do dia (“o tempo necessário”) para ouvir em confissão “bispos, sacerdotes, religiosos, eminentes leigos e pessoas simples que a ele afluíam”. Dom Bosco não pôde fazer o mesmo por causa das muitas ocupações em que esteve envolvido. No entanto, no confessionário, ele se colocou à disposição dos jovens (e dos salesianos) todos os dias em que eram celebradas funções religiosas em Valdocco ou em casas salesianas, ou em ocasiões especiais.
            Tinha começado a fazer isso tão logo tinha terminado de “aprender a ser padre” no Colégio (1841-1844), quando aos domingos reunia os jovens no oratório itinerante no decurso de dois anos, quando ia ouvir confissões no santuário da Consolata ou nas paróquias piemontesas para as quais era convidado, quando aproveitava as viagens de carruagem ou de trem para ouvir confissões de cocheiros ou de passageiros. Nunca deixou de fazer isso até o fim da vida; quando lhe foi pedido para não se cansar com confissões, respondeu que por esta altura era a única coisa que ainda podia fazer por seus jovens. E qual foi o seu pesar quando, por razões burocráticas e mal-entendidos, sua licença de confissão não foi renovada pelo Arcebispo! Os testemunhos sobre Dom Bosco como confessor são inúmeros e, de fato, a famosa fotografia que o retratava no ato de confessar um jovem cercado de tantos outros esperando para fazê-lo, deve ter agradado ao próprio santo, que talvez tenha tido a ideia disso, e que continua sendo um ícone significativo e indelével de sua figura no imaginário coletivo.
            Mas, além de sua experiência como confessor, Dom Bosco foi um incansável promotor do sacramento da Reconciliação, divulgou sua necessidade, sua importância, a utilidade de sua frequência, apontou os perigos de uma celebração sem as condições necessárias, ilustrou as maneiras clássicas de abordá-la frutuosamente. Fê-lo através de palestras, boas noites, lemas espirituosos e palavrinhas ao ouvido, cartas circulares aos jovens nos colégios, cartas pessoais e a narração de numerosos sonhos que tinham como objeto a confissão, bem ou mal feita. De acordo com sua inteligente prática catequética, ele lhes contava episódios de conversões de grandes pecadores, e também suas próprias experiências pessoais a esse respeito.
            Dom Bosco, um profundo conhecedor da alma juvenil, para induzir todos os jovens ao arrependimento sincero, baseia-se no amor e gratidão para com Deus, apresentado em sua infinita bondade, generosidade e misericórdia. Em vez disso, para sacudir os corações mais frios e endurecidos, ele descreve os possíveis castigos do pecado e impressiona salutarmente suas mentes com descrições vívidas sobre o juízo divino e o inferno. Mesmo nesses casos, porém, não satisfeito em levar os meninos ao arrependimento por seus pecados, ele procura levá-los à necessidade da misericórdia divina, uma disposição importante para antecipar seu perdão mesmo antes da confissão sacramental. Como de costume, Dom Bosco não entra em discussões doutrinárias; apenas se interessa por uma confissão sincera, que cura terapeuticamente a ferida do passado, recompõe o tecido espiritual do presente para o futuro de uma “vida de graça”.
            Dom Bosco acredita no pecado, acredita no pecado grave, acredita no inferno e fala de sua existência aos leitores e ouvintes. Mas também está convencido de que Deus é a misericórdia em pessoa, razão pela qual deu ao homem o sacramento da Reconciliação. E assim ele insiste nas condições para recebê-lo bem, e sobretudo no confessor como “pai” e “médico” e não tanto como “médico e juiz”: “O confessor sabe quanto a misericórdia de Deus seja maior do que suas faltas e lhe concede o perdão através de sua intervenção” (Esboço biográfico do jovem Miguel Magone, pág. 24-25).
            Segundo as memórias salesianas, ele sugeria muitas vezes aos seus jovens que invocassem a misericórdia divina, que não desanimassem depois do pecado, mas que voltassem à confissão sem medo, confiando na bondade do Senhor e depois tomassem resoluções firmes para o bem.
            Como “educador no campo da juventude”, Dom Bosco sentiu a necessidade de insistir menos no ex opere operato (pela própria ação do sacramento) e mais no ex opere operantis (pela ação do indivíduo), isto é, nas disposições do penitente. Em Valdocco todos se sentiam convidados a fazer uma boa confissão, todos sentiam o risco de más confissões e a importância de fazer uma boa confissão; muitos deles sentiam então que estavam vivendo em uma terra abençoada pelo Senhor. Não foi à toa que a misericórdia divina fez despertar um jovem falecido depois que os panos funerários foram exibidos, para que pudesse confessar seus pecados (a Dom Bosco).
            Em suma, o sacramento da confissão, bem explicado em suas características específicas e frequentemente celebrado, foi talvez o meio mais eficaz pelo qual o santo piemontês levou seus jovens a confiar na imensa misericórdia de Deus.

A Comunhão
            Mas a comunhão, o segundo pilar da pedagogia religiosa de Dom Bosco, também serviu para este propósito.
            Dom Bosco é certamente um dos maiores promotores da prática sacramental da Comunhão frequente. Sua doutrina, modelada no modo de pensar da Contrarreforma, deu mais importância à Comunhão do que à celebração litúrgica da Eucaristia, mesmo havendo uma evolução em sua frequência. Nos primeiros vinte anos de sua vida sacerdotal, na esteira de Tertuliano e Santo Agostinho e, depois, do Concílio de Trento e de Santo Afonso, sugeriu a Comunhão semanal, ou várias vezes por semana ou mesmo diariamente, dependendo da perfeição das disposições correspondentes às graças do sacramento. Domingos Sávio, que em Valdocco tinha começado a se confessar e a comungar quinzenalmente, passou a fazê-lo todas as semanas, depois três vezes por semana, finalmente, depois de um ano de intenso crescimento espiritual, todos os dias, obviamente sempre seguindo o conselho de seu confessor, o próprio Dom Bosco.
            Mais tarde, na segunda metade dos anos 60, Dom Bosco, com base em suas experiências pedagógicas e de uma forte corrente teológica a favor da comunhão frequente, que teve como líderes o bispo francês Dom de Ségur e o prior de Gênova, Padre José Frassinetti, Dom Bosco passou a convidar mais vezes seus jovens para a comunhão frequente, convencido de que permitia passos decisivos na vida espiritual e favorecia seu crescimento no amor de Deus. E no caso da impossibilidade da Comunhão Sacramental diária, ele sugeriu a Comunhão espiritual, talvez durante uma visita ao Santíssimo Sacramento, tão apreciada por Santo Afonso. O importante, porém, era manter a consciência em estado de poder comungar todos os dias: a decisão estava, de certa maneira, a cargo do confessor.
            Para Dom Bosco, toda comunhão dignamente recebida – jejum prescrito, estado de graça, disposição para desligar-se do pecado, uma bela ação de graças depois – anula as faltas diárias, fortalece a alma para evitá-las no futuro, aumenta a confiança em Deus e em sua infinita bondade e misericórdia; além disso, é fonte de graça para ter sucesso na escola e na vida, é uma ajuda para suportar os sofrimentos e vencer as tentações.
            Dom Bosco crê que a comunhão é uma necessidade para que os “bons” se mantenham como tais e para que os “maus” se tornem “bons”. É para aqueles que querem se tornar santos, não para os santos, como os remédios são dados aos doentes. Obviamente, ele sabe que a frequência, por si só, não é um indício seguro de bondade, pois há aqueles que a recebem com muita tibieza e por hábito, tanto mais que a própria superficialidade dos jovens muitas vezes não lhes permite compreender toda a importância do que estão fazendo.
            Com a Comunhão, então, pode-se pedir graças particulares do Senhor para si mesmo e para os outros. As cartas de Dom Bosco estão cheias de pedidos a seus jovens para rezar e comungar de acordo com sua intenção, a fim de que o Senhor lhe conceda bom êxito nos “assuntos” de toda ordem em que se encontre envolvido. E ele fez o mesmo com todos os seus correspondentes, que foram convidados a se aproximar deste sacramento para obter as graças pedidas, enquanto ele faria o mesmo na celebração da Santa Missa.
            Dom Bosco se preocupava muito que seus rapazes crescessem alimentados pelos sacramentos, mas também queria o máximo respeito pela liberdade deles. E deixou instruções precisas a seus educadores em seu tratado sobre o Sistema Preventivo: “Nunca se obriguem os jovens a frequentar os santos sacramentos: basta encorajá-los e dar-lhes comodidade de se aproveitarem deles”.
            Ao mesmo tempo, porém, permaneceu inflexível em sua convicção de que os sacramentos são de suma importância. Escreveu peremptoriamente: “Diga-se o que se quiser sobre os vários sistemas de educação, mas não encontro base segura a não ser na frequência da Confissão e da Comunhão” (O pastorzinho dos Alpes, ou vida do jovem Francisco Besucco de Argentera, 1864. p. 100).

Uma paternidade e misericórdia personificada
            A misericórdia de Deus, operante particularmente no momento dos sacramentos da Confissão e da Comunhão, encontrava então sua expressão externa não só num Dom Bosco “padre confessor”, mas também num “pai, irmão, amigo” dos jovens na vida cotidiana ordinária. Com algum exagero, pode-se dizer que a confiança deles em Dom Bosco era tal que muitos deles quase não faziam distinção entre Dom Bosco “confessor” e Dom Bosco “amigo” e “irmão”; outros, às vezes, podiam trocar a acusação sacramental com as efusões sinceras de um filho para com seu pai; por outro lado, o conhecimento que Dom Bosco tinha dos jovens era tal que, com perguntas sóbrias, ele os inspirava com extrema confiança e não raro sabia como fazer a acusação no lugar deles.
            A figura de Deus Pai, misericordioso e providente, que ao longo da história manifestou sua bondade desde Adão, para com os homens, justos ou pecadores, mas todos necessitados de ajuda e objeto de cuidados paternos, e em todo caso todos chamados à salvação em Jesus Cristo, é assim modulada e refletida na bondade de Dom Bosco “Pai de seus jovens”, que só quer o bem deles, que não os abandona, sempre pronto a compreendê-los, a compadecer-se deles, a perdoá-los. Para muitos deles, órfãos, pobres e abandonados, acostumados desde tenra idade ao duro trabalho cotidiano, objeto de manifestações muito modestas de ternura, filhos de uma época em que o que prevalecia era a submissão decisiva e a obediência absoluta a qualquer autoridade constituída, Dom Bosco era talvez a carícia jamais experimentada de um pai, a “ternura” de que fala o Papa Francisco.
            Sua carta aos jovens da casa Mirabello, no final de 1864, continua comovente: “Aquelas vozes, aqueles vivas, aquele beijo e aquele aperto de mão, aquele sorriso cordial, aquele falar um com o outro sobre a alma, aquele encorajar o outro a fazer o bem são coisas que embalsamaram meu coração, e por isso não posso pensar nisso sem me comover até as lágrimas”. Eu lhes direi […] que vocês são a pupila do meu olho” (Epistolário II, editado por F. Motto II, carta n. 792).
            Ainda mais comovente é sua carta aos jovens de Lanzo de 3 de janeiro de 1876: “Deixem-me dizer-lhes e que ninguém se ofenda, vocês são todos ladrões; digo-o e repito, vocês me tiraram tudo. Quando estive em Lanzo, vocês me encantaram com sua benevolência e com sua bondade amorosa, vocês me ataram as faculdades da mente com sua piedade; ainda sobrava-me esse pobre coração, cujos afetos vocês já me havia roubado inteiramente. Agora sua carta marcada por 200 mãos amigas e caríssimas tomou posse de todo esse coração, ao qual nada mais restou senão um vivo desejo de amá-los no Senhor, de lhes fazer o bem e de salvar as almas de todos” (Epistolário III, carta n. 1389).
            A bondade amorosa com que ele tratava e queria que os salesianos tratassem os meninos tinha um fundamento divino. Afirmava-o citando uma expressão de São Paulo: “A caridade é benigna e paciente; sofre tudo, mas espera tudo, e suporta qualquer problema”.
            A bondade amorosa foi, portanto, um sinal de misericórdia e de amor divino que fugia ao sentimentalismo e às formas de sensualidade por causa da caridade teológica que foi sua fonte. Dom Bosco comunicava esse amor aos meninos individualmente e também a grupos deles: “Que eu lhes nutro muito carinho, não preciso lhes dizer, eu lhes dei provas claras disso. Que vocês também me amam, não preciso que me digam, porque me demonstraram isso constantemente. Mas em que se baseia esse nosso afeto mútuo? […] Portanto, o bem de nossas almas é o fundamento de nosso afeto” (Epistolário II, n. 1148). O amor de Deus, o primum teológico, é, portanto, o fundamento do primum pedagógico.
            A bondade amorosa foi também a tradução do amor divino em amor verdadeiramente humano, feito de sensibilidade reta, cordialidade amável, afeto benevolente e paciente, tendente à comunhão profunda do coração. Em suma, aquele amor efetivo e afetivo que se experimenta de maneira privilegiada na relação entre educando e educador, quando gestos de amizade e de perdão por parte do educador induzem o jovem, em virtude do amor que guia o educador, a abrir-se à confiança, a sentir-se apoiado em seu esforço de superação e de compromisso, a dar seu consentimento e a aderir em profundidade aos valores que o educador vive pessoalmente e lhe propõe. O jovem compreende que essa relação o reconstrói e o reestrutura como homem. O empreendimento mais árduo do Sistema Preventivo é precisamente o de conquistar o coração do jovem, de gozar de sua estima, de sua confiança, de fazer dele um amigo. Se um jovem não ama o educador, este pode fazer muito pouco do jovem e em favor do jovem.

As obras de misericórdia
            Poderíamos agora continuar com as obras de misericórdia, que o Catecismo distingue entre obras corporais e espirituais, estabelecendo dois grupos de sete. Não seria difícil documentar como Dom Bosco viveu, praticou e encorajou a prática dessas obras de misericórdia e como, por seu “ser e trabalhar”, ele constituiu de fato um sinal e um testemunho visível, em obras e palavras, do amor de Deus pela humanidade. Devido a limitações de espaço, limitamo-nos a indicar a possibilidade de pesquisa. Resta, porém, inquestionável que hoje elas parecem ficar abandonadas também por causa da falsa oposição entre misericórdia e justiça, como se a misericórdia não fosse uma maneira típica de expressar esse amor que, como tal, jamais poderá contradizer a justiça.




Com Dom Bosco. Sempre

Não é indiferente celebrar um Capítulo Geral em um lugar ou em outro. Certamente, em Valdocco, no “berço do carisma”, temos a oportunidade de redescobrir a gênese da nossa história e reencontrar a originalidade que constitui o coração da nossa identidade de consagrados e apóstolos dos jovens.

Na moldura antiga de Valdocco, em que tudo fala das nossas origens, sou quase obrigado a fazer memória daquele dezembro de 1859, em que Dom Bosco havia tomado uma decisão incrível, única na história: fundar uma congregação religiosa com alguns jovens.
Ele os havia preparado, mas eram ainda muito jovens. «Há muito tempo pensava em fundar uma Congregação. Eis que chegou disso se tornar realidade.» explicou Dom Bosco com simplicidade. «Na verdade, esta Congregação não está nascendo só agora: ela já existia naquele conjunto de Regras que, por costume, vocês sempre observaram… Trata-se agora de andar avante, de constituir normalmente a Congregação e de aceitar as suas Regras. Saibam, porém, que nela serão inscritos somente aqueles que, depois de terem refletido seriamente, quiserem fazer, a seu tempo, os votos de pobreza, castidade e obediência… Deixo-lhes uma semana de tempo para pensarem nisso».
À saída da reunião houve um silêncio insólito. Bem depressa, quando começaram a falar, pode-se constatar que Dom Bosco tinha razão em proceder com lentidão e prudência. Alguns murmuravam consigo mesmos que Dom Bosco queria fazer deles frades. Cagliero caminhava pelo pátio, envolvido em sentimentos contraditórios.
Mas o desejo de «permanecer com Dom Bosco» prevaleceu na maioria. Cagliero disse então a frase que se tornaria histórica: «Frade ou não frade, eu fico com Dom Bosco».
Na «conferência de adesão», que se realizou na noite de 18 de dezembro, eram em 17. Dom Bosco convocou o primeiro Capítulo Geral em 5 de setembro de 1877, em Lanzo Torinese. Os participantes eram vinte e três e o Capítulo durou três dias inteiros. Hoje, para o Capítulo de número 29, os capitulares são 227. Chegaram de todas as partes do mundo, representando todos os salesianos.
Na abertura do primeiro Capítulo Geral, Dom Bosco disse aos nossos irmãos: «O Divino Salvador diz no santo Evangelho que onde estão dois ou três reunidos em seu nome, Ele mesmo está entre deles. Nós não temos outro fim nestes encontros senão a maior glória de Deus e a salvação das almas redimidas pelo precioso Sangue de Jesus Cristo». Podemos estar certos, portanto, de que o Senhor estará em nosso meio e que conduzirá Ele mesmo as coisas de tal modo que todos se sintam à vontade.

Uma mudança de época
A expressão evangélica: «Designou doze dentre eles para ficar em sua companhia. Ele os enviaria a pregar» (Mc 3,14-15), diz que Jesus escolhe e chama aqueles que quer. Entre estes estamos também nós. O Reino de Deus se torna realidade e aqueles primeiros Doze são um exemplo e um modelo para nós e para as nossas comunidades. Os Doze são pessoas comuns, com qualidades e defeitos, não formam uma comunidade de puros e nem sequer um simples grupo de amigos.
Sabem, como disse o Papa Francisco, que “Vivemos uma mudança de época mais que uma época de mudanças”. Em Valdocco, nestes dias, se percebe grandemente esta consciência. Todos os irmãos sentem que este é um momento de grande responsabilidade.
Na vida da maioria dos irmãos, das inspetorias e da Congregação há muitas coisas positivas, mas isto não basta e não pode servir de “consolo”, porque o grito do mundo, as grandes e novas pobrezas, a luta quotidiana de tantas pessoas – não somente pobres, mas também simples e trabalhadoras – se levanta forte como pedido de ajuda. São todas perguntas que nos devem provocar e sacudir e não nos deixar tranquilos.
Com a ajuda das inspetorias através da consulta, acreditamos ter individuado, por um lado, os principais motivos de preocupação e, por outro, os sinais de vitalidade da nossa Congregação, adaptados sempre com aos traços culturais específicos de cada contexto.
Durante o Capítulo propomos concentrar-nos sobre o que significa para nós sermos verdadeiramente salesianos apaixonados por Jesus Cristo, porque sem isto ofereceremos bons serviços, faremos o bem às pessoas, ajudaremos, mas não deixaremos uma marca profunda.
A missão de Jesus continua e se torna visível hoje no mundo também através de nós, seus enviados. Somos consagrados para construir amplos espaços de luz para o mundo de hoje, para sermos profetas. Fomos consagrados por Deus e chamados ao seguimento do seu amado Filho Jesus para vivermos verdadeiramente como conquistados por Deus. É por isso que o essencial continua a ser a fidelidade da Congregação ao Espírito Santo, vivendo, com o espírito de Dom Bosco, uma vida consagrada salesiana centrada em Jesus Cristo.
A vitalidade apostólica, como vitalidade espiritual, é compromisso a favor dos adolescentes e jovens nas mais variadas pobrezas e, por isso, não se pode somente oferecer serviços educativos. O Senhor nos chama a educar evangelizando, levando a Sua presença e acompanhando a vida com oportunidades de futuro.
Somos chamados a procurar, em nome de Deus, novos modelos de presença, novas expressões do carisma salesiano. E que isto seja feito, em comunhão com os jovens e com o mundo, através de “uma ecologia integral” e da formação de uma cultura digital nos mundos habitados pelos jovens e pelos adultos.
E é forte o desejo e a expectativa de que este seja um Capítulo Geral corajoso, em que se digam as coisas, sem se preocupar com frases corretas e bem ditas, mas que não tocam a vida.
Nesta missão não estamos sozinhos. Sabemos e sentimos que a Virgem Maria é um modelo de fidelidade.
É belo voltar com a mente e com o coração ao dia da solenidade da Imaculada Conceição de 1887, quando, dois meses antes da sua morte, Dom Bosco disse a alguns Salesianos que o acompanhavam e escutavam com comoção: «Até agora caminhamos no certo. Não podemos errar; é Maria quem nos guia».
Maria Auxiliadora, a Nossa Senhora de Dom Bosco, nos guia. Ela é a Mãe de todos nós e é Ela que diz ao CG29, como o fez em Caná da Galileia: «Fazei o que ele vos disser».
A nossa Mãe Auxiliadora nos ilumine e nos guie, como fez com Dom Bosco, a sermos fiéis ao Senhor e a jamais desiludir os jovens, sobretudo aqueles mais necessitados.




Vera Grita, peregrina de esperança

            Vera Grita, filha de Hamlet e de Maria Anna Zacco da Pirrera, nasceu em Roma no dia 28 de janeiro de 1923; era a segunda de quatro irmãs. Viveu e estudou em Savona, onde obteve a habilitação para o magistério. Aos 21 anos, durante uma repentina incursão aérea sobre a cidade (1944), foi atropelada e pisoteada pela multidão em fuga, sofrendo graves consequências para seu corpo, que a partir de então ficou marcado para sempre pelo sofrimento. Passou despercebida em sua breve vida terrena, ensinando nas escolas do interior da Ligúria (Rialto, Erli, Alpicella, Deserto de Varazze), onde conquistou a estima e o afeto de todos por seu caráter bondoso e manso.
            Em Savona, na paróquia salesiana de Maria Auxiliadora, participava da Missa e era assídua ao sacramento da Penitência. Desde 1963, seu confessor era o salesiano P. João Bocchi. Salesiana Cooperadora desde 1967, realizou sua vocação no dom total de si ao Senhor, que de maneira extraordinária se doava a ela, no íntimo de seu coração, com a “Voz”, com a “Palavra”, para comunicar-lhe a Obra dos Tabernáculos Vivos. Submeteu todos os escritos ao diretor espiritual, o salesiano P. Gabriel Zucconi, e guardou no silêncio de seu coração o segredo daquela vocação, guiada pelo divino Mestre e pela Virgem Maria que a acompanharam ao longo do caminho da vida oculta, do despojamento e do aniquilamento de si.
            Sob o impulso da graça divina e acolhendo a mediação dos guias espirituais, Vera Grita respondeu ao dom de Deus, testemunhando em sua vida, marcada pelo sofrimento da doença, o encontro com o Ressuscitado e dedicando-se com heroica generosidade ao ensino e à educação dos alunos, suprindo as necessidades da família e testemunhando uma vida de pobreza evangélica. Centrada e firme no Deus que ama e sustenta, com grande firmeza interior, foi capaz de suportar as provas e os sofrimentos da vida. Com base nessa solidez interior, deu testemunho de uma existência cristã feita de paciência e constância no bem.
            Morreu no dia 22 de dezembro de 1969, aos 46 anos, em um quartinho do hospital em Pietra Lígure, onde havia passado os últimos seis meses de vida em um crescendo de sofrimentos aceitos e vividos em união com Jesus Crucificado. “A alma de Vera – escreveu o P. Borra, Salesiano, seu primeiro biógrafo – com as mensagens e as cartas entra na fileira daquelas almas carismáticas chamadas a enriquecer a Igreja com chamas de amor a Deus e a Jesus Eucarístico para a dilatação do Reino”.

Uma vida privada das esperanças humanas
            Humanamente, a vida de Vera é marcada desde a infância pela perda de um horizonte de esperança. A perda da autonomia econômica em seu núcleo familiar, portanto, o afastamento dos pais para ir a Módica, na Sicília, com as tias e, sobretudo, a morte do pai em 1943, colocam Vera diante das consequências de eventos humanos particularmente sofridos. Após o dia 4 de julho de 1944, dia do bombardeio sobre Savona que marcará toda a vida de Vera, suas condições de saúde também estarão comprometidas para sempre. Por isso, a Serva de Deus se viu jovem sem qualquer perspectiva de futuro e teve que, em várias ocasiões, rever seus projetos e renunciar a muitos desejos: dos estudos universitários ao ensino e, sobretudo, a uma própria família com o jovem com quem estava namorando. Apesar do fim repentino de todas as suas esperanças humanas entre 20 e 21 anos, a esperança está muito presente em Vera: tanto como uma virtude humana que acredita em uma mudança possível e se empenha para realizá-la (mesmo muito doente, preparou e venceu o concurso para lecionar), quanto, sobretudo, como uma virtude teologal – ancorada na fé – que lhe infunde energia e se torna um instrumento de consolação para os outros.
            Quase todas as testemunhas que a conheceram ressaltam tal aparente contradição entre condições de saúde comprometidas e a capacidade de nunca se queixar, atestando, em vez disso, alegria, esperança e coragem mesmo em circunstâncias humanamente desesperadoras. Vera se tornou “portadora de alegria”.
            Uma sobrinha afirma: «Ela estava sempre doente e sofrendo, mas nunca a vi desanimada ou enraivecida por sua condição; sempre tinha uma luz de esperança sustentada pela grande fé. […] Minha tia estava frequentemente internada no hospital, sofrida e frágil, mas sempre serena e cheia de esperança pelo grande Amor que tinha por Jesus».
            Também a irmã Liliana tirou, dos telefonemas vespertinos com ela, encorajamento, serenidade e esperança, embora a Serva de Deus estivesse então sobrecarregada por numerosos problemas de saúde e por vínculos profissionais: «ela me infundia – diz – confiança e esperança, fazendo-me refletir que Deus está sempre perto de nós e nos conduz. Suas palavras me traziam de volta aos braços do Senhor e eu encontrava a paz».
            Inês Zannino Tibirosa, cujo testemunho é de particular valor pois visitou assiduamente Vera no hospital “Santa Corona” em seu último ano de vida, atesta: «apesar das graves dores que a doença lhe causava, nunca a ouvi reclamar de seu estado. Ela aliviava e dava esperança a todos que se aproximavam e, quando falava de seu futuro, o fazia com entusiasmo e coragem».
            Até o final, Vera Grita se manteve assim: mesmo na última parte de seu caminho terreno, guardou um olhar para o futuro, esperava que com os tratamentos o tuberculoma pudesse ser reabsorvido, esperava poder ocupar a cátedra nos Piani di Invrea no ano letivo de 1969-1970, assim como se dedicar à sua missão espiritual, logo que saísse do hospital.

Educada na esperança e no caminho espiritual pelo confessor
            Nesse sentido, a esperança atestada por Vera está enraizada em Deus e naquela leitura sapiencial dos eventos que seu guia espiritual, o P. Gabriel Zucconi, e, antes dele, o confessor, P. João Bocchi, lhe ensinaram. Precisamente o ministério do P. Bocchi – homem de alegria e esperança – exerceu uma influência positiva sobre Vera, que ele acolheu em sua condição de doente e a quem ensinou a dar valor aos sofrimentos – não buscados – dos quais estava sobrecarregada. Antes de tudo, o P. Bocchi foi mestre de esperança; dele se disse: «com palavras sempre cordiais e cheias de esperança, ele abriu os corações à magnanimidade, ao perdão, à transparência nas relações interpessoais; viveu as bem-aventuranças com naturalidade e fidelidade diária».
«Esperando e tendo a certeza de que, como aconteceu com Cristo, também acontecerá conosco: a Ressurreição gloriosa», o P. Bocchi realizava, através de seu ministério, um anúncio da esperança cristã, fundamentada na onipotência de Deus e na ressurreição de Cristo. Mais tarde, da África, para onde partiu como missionário, dirá: «estava lá porque queria levar e doar a eles Jesus Vivo e presente na Santíssima Eucaristia com todos os dons de Seu Coração: a Paz, a Misericórdia, a Alegria, o Amor, a Luz, a União, a Esperança, a Verdade, a Vida eterna».
            Vera se tornou portadora de esperança e de alegria também em ambientes marcados pelo sofrimento físico e moral, por limitações cognitivas (como entre seus pequenos alunos com deficiência auditiva) ou condições familiares e sociais não ideais (como no “clima escaldante” de Erli).
            A amiga Maria Mattalia recorda: «Vejo o doce sorriso de Vera, às vezes cansado por tanto lutar e sofrer; lembrando sua força de vontade, busco seguir seu exemplo de bondade, de grande fé, esperança e amor […]».
            Antonieta Fazio – ex-zeladora da escola de Casanova – testemunhou sobre ela: «era muito querida por seus alunos, que amava muito, e em particular por aqueles com dificuldades intelectuais […]. Muito religiosa, transmitia a cada um fé e esperança, embora ela mesma estivesse sofrendo muito fisicamente, mas não abatida moralmente».
            Nesses contextos, Vera trabalhava para fazer renascer as razões da esperança. Por exemplo, no hospital (onde a comida é pouco satisfatória) ela se privou de um cacho especial de uvas para deixar uma parte no criado-mudo de todas as doentes do quarto, assim como sempre cuidou de sua aparência para se apresentar bem, em ordem, com compostura e refinamento, contribuindo assim para combater o ambiente de sofrimento de uma clínica, e às vezes a perda da esperança em muitos doentes que correm o risco de “se deixar levar”.
            Através das Mensagens da Obra dos Tabernáculos Vivos, o Senhor a educou a uma postura de espera, paciência e confiança nele. Incontáveis são, de fato, as exortações sobre esperar o Esposo ou o Esposo que espera sua esposa:

“Espere em seu Jesus sempre, sempre.

Que Ele venha às nossas almas, venha às nossas casas; venha conosco para compartilhar alegrias e tristezas, cansaços e esperanças.

Deixe meu Amor agir e aumente sua fé, sua esperança.

Siga-me na escuridão, nas sombras porque você conhece o «caminho».

Espere em Mim, espere em Jesus!

Após o caminho da esperança e da espera, haverá a vitória.

Para chamá-los às coisas do Céu”.

Portadora de esperança ao morrer e ao interceder
            Mesmo na doença e na morte, Vera Grita testemunhou a esperança cristã.
            Sabia que, quando sua missão estivesse cumprida, também a vida na terra teria terminado. «Esta é a sua tarefa e quando estiver terminada você se despedirá da terra para os Céus»: por isso não se sentia “proprietária” do tempo, mas buscava a obediência à vontade de Deus.
            Nos últimos meses, apesar de uma condição agravante e exposta a um piora do quadro clínico, a Serva de Deus atestou serenidade, paz, percepção interior de um “cumprimento” de sua vida.
            Nos últimos dias, embora estivesse naturalmente apegada à vida, o P. José Formento a descreveu «já em paz com o Senhor». Nesse espírito, pôde receber a Comunhão até poucos dias antes de morrer, e receber a Unção dos Enfermos no dia 18 de dezembro.
            Quando a irmã Pina a visitou pouco antes da morte – Vera estava há cerca de três dias em coma – desobedecendo ao seu habitual recato, disse-lhe que havia visto muitas coisas, coisas belíssimas que, infelizmente, não tinha tempo de contar. Soube das orações do Padre Pio e do Papa Bom por ela, além de acrescentar – referindo-se à Vida eterna – «Todos vocês virão para o paraíso comigo, tenham certeza disso».
            Liliana Grita também testemunhou como, no último período, Vera «sabia mais do Céu do que da terra». Da sua vida foi feito o seguinte balanço: «ela, tão sofredora, consolava os outros, infundindo-lhes esperança e não hesitava em ajudá-los».
            Muitas graças atribuídas à mediação intercessora de Vera dizem respeito, por fim, à esperança cristã. Vera – mesmo durante a Pandemia de Covid 19 – ajudou muitos a reencontrar as razões da esperança e foi para eles proteção, irmã no espírito, ajuda no sacerdócio. Ajudou interiormente um sacerdote que, após um AVC, havia esquecido as orações, não conseguindo mais pronunciá-las com sua extrema dor e desorientação. Fez com que muitos voltassem a rezar, pedindo a cura de um jovem pai atingido por uma hemorragia.
            Também a Irmã Maria Hilária Bossi, Mestra das Noviças das Beneditinas do Santíssimo Sacramento de Ghiffa, observa como Vera – irmã no espírito – é uma alma que direciona ao Céu e acompanha em direção ao Céu: «Sinto-a irmã no caminho para o céu… Muitos […] que se reconhecem nela, e a ela se referem, no caminho evangélico, na corrida em direção ao céu».
            Em síntese, compreende-se como toda a história de Vera Grita foi sustentada não por esperanças humanas, pelo mero olhar para o “amanhã”, esperando que fosse melhor que o presente, mas por uma verdadeira Esperança teologal: «ela era serena porque a fé e a esperança sempre a sustentaram. Cristo estava no centro de sua vida, dele ela tirava a força. […] era uma pessoa serena porque tinha no coração a Esperança teologal, não a esperança superficial […], mas aquela que deriva somente de Deus, que é dom e nos prepara para o encontro com Ele».

            Numa oração a Maria da Obra dos Tabernáculos Vivos, lê-se: «Levante-nos [Maria] da terra para que aqui vivamos e sejamos para o Céu, para o Reino do seu Filho».
            É bonito também lembrar que o P. Gabriel teve que peregrinar na esperança entre tantas provas e dificuldades, como escreve em uma carta a Vera de 4 de março de 1968 de Florença: «No entanto, devemos sempre esperar. A presença das dificuldades não impede que, no final, o bem, o bom, o belo triunfem. A paz, a ordem, a alegria retornarão. O homem filho de Deus recuperará toda a glória que teve desde o princípio. O homem será salvo em Jesus e encontrará em Deus todo o bem. Então, vêm à mente todas as coisas belas prometidas por Jesus e a alma nele encontra sua paz. Coragem: agora estamos como em combate. Virá o dia da vitória. Essa é a certeza em Deus».
            Na igreja de Santa Corona em Pietra Lígure, Vera Grita participava da Missa e ia rezar durante os longos internamentos. Seu testemunho de fé na presença viva de Jesus Eucarístico e da Virgem Maria em sua breve vida terrena é um sinal de esperança e de conforto, para aqueles que neste lugar de cura pedirem sua ajuda e sua intercessão junto ao Senhor para serem aliviados e libertados do sofrimento.
            O caminho de Vera Grita na cansativa labuta dos dias também oferece uma nova perspectiva leiga à santidade, tornando-se exemplo de conversão, aceitação e santificação para os ‘pobres’, os ‘frágeis’, os ‘doentes’ que nela podem se reconhecer e reencontrar esperança.
            Escreve São Paulo, «que os sofrimentos do momento presente não são comparáveis à glória futura que deverá ser revelada em nós». Com «impaciência» esperamos contemplar o rosto de Deus, pois «na esperança fomos salvos» (Rom 8,18.24). Portanto, é absolutamente necessário esperar contra toda esperança, «Spes contra spem». Porque, como escreveu Carlos Péguy, a Esperança é uma criança «irredutível». Em relação à Fé que «é uma esposa fiel» e à Caridade que «é uma Mãe», a Esperança parece, à primeira vista, não valer nada. E, no entanto, é exatamente o contrário: será a Esperança, escreve Péguy, «que veio ao mundo no dia de Natal» e que «trazendo as outras, atravessará os mundos».
            «Escreva, Vera de Jesus, eu te darei luz. A árvore florida na primavera deu seus frutos. Muitas árvores deverão florescer novamente na estação oportuna para que os frutos sejam abundantes… Peço que aceite com fé cada prova, cada dor por Mim. Você verá os frutos, os primeiros frutos da nova floração». (Santa Corona – 26 de outubro de 1969 – Festa de Cristo Rei – Penúltima mensagem).




Nós somos Dom Bosco, hoje

«Tu levarás a cabo o trabalho que estou começando; eu farei os esboços, tu desenharás as cores» (Dom Bosco)

Queridos amigos e leitores, membros da Família Salesiana, na saudação deste mês no Boletim Salesiano, vou me concentrar num evento muito importante que a Congregação Salesiana está vivendo: o 29º Capítulo Geral. No caminho da Congregação Salesiana, a cada seis anos ocorre esta assembleia, a mais importante na vida da Congregação.
Muitas coisas fazem parte da nossa vida, e este ano jubilar nos está proporcionando muitos eventos importantes; no entanto, desejo me concentrar neste porque, mesmo que aparentemente esteja longe de nós, diz respeito a todos nós.
Dom Bosco, nosso Fundador, estava ciente de que nem tudo terminaria com ele, mas que o seu seria, sem dúvida, apenas o início de um longo caminho a percorrer. Aos sessenta anos, num dia de 1875, disse ao P. Júlio Barberis, um de seus colaboradores mais próximos: “Tu levarás a cabo o trabalho que estou começando; eu farei os esboços, tu desenharás as cores […] Farei uma cópia aproximada da Congregação e deixarei para aqueles que vierem depois de mim a tarefa de torná-la bela”.
Com esta feliz e profética expressão, Dom Bosco desenhava o caminho que todos somos chamados a percorrer; e de forma máxima está se realizando o Capítulo Geral dos Salesianos de Dom Bosco nestes tempos em Valdocco.

A profecia dos doces
O mundo de hoje não é o de Dom Bosco, mas há uma característica comum: é um tempo de profundas mutações. A humanização completa, equilibrada e responsável em seus componentes materiais e espirituais era o verdadeiro objetivo de Dom Bosco. Ele se preocupava em preencher o “espaço interior” dos jovens, formar “cabeças bem feitas”, “cidadãos honestos”. Neste aspecto, é totalmente atual. O mundo hoje precisa de Dom Bosco.
No início, para todos há uma pergunta muito simples: «Você quer uma vida qualquer ou quer mudar o mundo?» Mas ainda se pode falar de metas e ideais, hoje? Quando o rio para de correr, ele se torna um pântano. O mesmo acontece com o ser humano.
Dom Bosco não parou de caminhar. Hoje ele o faz com nossos pés.
Ele tinha uma convicção sobre os jovens: «Esta porção, a mais delicada e a mais preciosa da sociedade humana, sobre a qual se fundamentam as esperanças de um futuro feliz, não é por si mesma de índole perversa… porque se acontece às vezes que já estejam corrompidos nessa idade, isso se deve mais à imprudência do que à malícia consumada. Esses jovens realmente precisam de uma mão benéfica, que cuide deles, os cultive, os guie…»
Em 1882, numa conferência, disse aos Cooperadores em Gênova: «Ao retirar, instruir, educar os jovens em perigo, faz-se um bem a toda a sociedade civil. Se a juventude for bem educada, teremos com o tempo uma geração melhor». É como dizer: apenas a educação pode mudar o mundo.
Dom Bosco tinha uma capacidade de visão quase assustadora. Ele nunca diz “até agora”. Mas sempre “de agora em diante.
Guy Avanzini, eminente professor universitário, continua a repetir: «A pedagogia do século XXI será salesiana, ou não será pedagogia».
Numa noite de 1851, de uma janela do primeiro andar, Dom Bosco jogou entre os jovens um punhado de doces. Uma grande alegria se acendeu, e um garoto, vendo-o sorrir na janela, gritou: «Ó Dom Bosco, se pudesse ver todas as partes do mundo, e em cada uma delas tantos oratórios!».
Dom Bosco fixou seu olhar sereno no ar e respondeu: «Quem sabe se não deve vir o dia em que os filhos do oratório estejam realmente espalhados por todo o mundo».

Olhar distante
Mas o que é um Capítulo Geral? Por que ocupar estas linhas sobre um tema que é especificamente da Congregação Salesiana? 
As constituições de vida dos Salesianos de Dom Bosco, no artigo 146, definem assim o Capítulo Geral: 
“O Capítulo Geral é o sinal principal da unidade na diversidade da Congregação. É o encontro fraterno no qual os salesianos realizam uma reflexão comunitária, para se manterem fiéis ao Evangelho e ao carisma do Fundador, e sensíveis às necessidades dos tempos e lugares. 
Mediante o Capítulo Geral, toda a Sociedade, deixando-se guiar pelo Espírito do Senhor, procura conhecer, em determinado momento da história, a vontade de Deus para melhor servir à Igreja”
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O Capítulo Geral não é, portanto, um fato privado dos salesianos consagrados, mas uma assembleia importantíssima que diz respeito a todos nós, que toca toda a Família Salesiana e aqueles que têm Dom Bosco dentro de si, porque no centro estão as pessoas, a missão, o Carisma de Dom Bosco, a Igreja e cada um de nós, de vocês. 
No centro está a fidelidade a Deus e a Dom Bosco, na capacidade de ver os sinais dos tempos e dos diferentes lugares. Fidelidade que é um movimento contínuo, renovação, capacidade de olhar longe e, ao mesmo tempo, manter os pés bem plantados no chão.

Por isso, cerca de 250 coirmãos salesianos se reuniram de todas as partes do mundo para rezar, refletir, dialogar e olhar para o futuro… em fidelidade a Dom Bosco.
E, a partir da construção dessa visão, eleger o novo Reitor-Mor, o sucessor de Dom Bosco e seu Conselho Geral.
Não é algo fora da sua vida, caro amigo(a) que lê, mas dentro da sua existência e no seu “afeto” a Dom Bosco. Por que lhe digo isso? Porque você acompanha tudo isso com sua oração. A oração ao Espírito Santo que ajude todos os capitulares a conhecer a vontade de Deus para um melhor serviço à Igreja.
Acredito que o CG29, tenho certeza, será tudo isso. Uma experiência de Deus para purificar outras partes do esboço que Dom Bosco nos deixou, como sempre foi feito em todos os Capítulos Gerais da história da Congregação, sempre fiéis ao seu projeto.
Certos de que hoje também podemos continuar a ser iluminados para sermos fiéis ao Senhor Jesus na fidelidade ao carisma original, com os rostos, a música e as cores de hoje.
Não estamos sozinhos nesta missão e sabemos e sentimos que Maria, a Mãe Auxiliadora dos cristãos, a Auxiliadora da Igreja, modelo de fidelidade, sustentará os passos de todos nós.




Servos bons, fiéis e corajosos

Neste ano Jubilar, neste mundo difícil, somos convidados a nos levantar, recomeçar e percorrer em novidade de vida nosso caminho de homens e de crentes.

            O profeta Isaías se dirige a Jerusalém com estas palavras: «Levanta-te, reveste-te de luz, porque vem a tua luz, a glória do Senhor brilha sobre ti» (Is 60,1). O convite do profeta – a se levantar porque vem a luz – parece surpreendente, pois é gritado após o duro exílio e as numerosas perseguições que o povo experimentou.
            Este convite, hoje, ressoa também para nós que celebramos este ano Jubilar. Neste mundo difícil, também somos convidados a nos levantar, recomeçar e percorrer em novidade de vida nosso caminho de homens e de crentes.
            Tanto mais agora que tivemos a graça, sim, porque se trata de graça, de celebrar na lembrança litúrgica a Santidade de João Bosco. Não nos acostumemos: Dom Bosco é um grande homem de Deus, genial e corajoso, um incansável apóstolo porque discípulo apaixonado de Cristo. Para nós, um pai!
            Na vida, ter um pai é importantíssimo; na fé, ao seguir Cristo, é igual: ter um grande pai é um dom inestimável. Você sente dentro de si e sua experiência de fé move sua vida. Se assim é para Dom Bosco, por que não pode ser assim também para mim?
            Uma pergunta existencial que nos coloca em movimento e nos transforma, no espírito do Jubileu, tornando-nos pessoas “renovadas”, “mudadas”. Este é o sentido profundo da festa de Dom Bosco que acabamos de celebrar, para todos nós: imitar, não apenas admirar! Neste ano Jubilar que estamos vivendo, com o tema da Esperança, presença de Deus, que nos acompanha, Dom Bosco é uma referência clara e forte!
            Falando da Esperança, Dom Bosco escreve, como retomei no texto da Estreia para este ano:
            «O salesiano» – dizia Dom Bosco, e ao falar do salesiano fala a cada um de nós que lemos – «está pronto a suportar o calor e o frio, a sede e a fome, as fadigas e o desprezo sempre que se trate da glória de Deus e da salvação das almas»; o apoio interior dessa exigente capacidade ascética é o pensamento do paraíso como reflexo da boa consciência com a qual trabalha e vive. «Em cada um de nossos ofícios, em cada um de nossos trabalhos, penas ou desgostos, nunca nos esqueçamos de que Ele leva em conta cada pequena coisa feita pelo seu santo nome; e é de fé que, a seu tempo, nos compensará com abundante medida. No fim da vida, quando nos apresentarmos ao seu divino tribunal, olhando-nos com rosto amoroso, Ele nos dirá: “Parabéns, servo bom e fiel! Como te mostraste fiel na administração de tão pouco, eu te confiarei muito mais. Vem participar da alegria do teu Senhor” (Mt 25,21)».
            «Nas fadigas e nos sofrimentos, nunca se esqueça de que temos uma grande recompensa preparada no céu». E quando nosso Pai diz que o salesiano esgotado pelo excesso de trabalho representa uma vitória para toda a Congregação, parece sugerir até uma dimensão de comunhão fraterna na recompensa, quase um sentido comunitário do paraíso!
            De pé, Salesianos! Assim nos pede Dom Bosco.

«Salve, salvando salva-te»
            Dom Bosco foi um dos grandes da esperança. Há muitos elementos para demonstrá-lo. Seu espírito salesiano é todo permeado pelas certezas e pela operosidade características desse dinamismo audacioso do Espírito Santo.
            Dom Bosco soube traduzir em sua vida a energia da esperança em dois aspectos: o compromisso pela santificação pessoal e a missão de salvação para os outros; ou melhor – e aqui reside uma característica central de seu espírito – a santificação pessoal através da salvação dos outros. Lembremos a famosa fórmula dos três “S”: «Salve, salvando salva-te». Parece um jogo mnemônico dito assim simplesmente, a modo de slogan pedagógico, mas é profundo e indica como os dois aspectos da santificação pessoal e da salvação do próximo estão intimamente ligados entre si.
            Dom Erik Varden afirma: «Aqui e agora, a esperança se manifesta como um lampejo. Isso não quer dizer que seja irrelevante. A esperança tem um contágio abençoado que lhe permite se espalhar de coração a coração. Os poderes totalitários sempre trabalham para apagar a esperança e induzir ao desespero. Educar-se para a esperança significa exercitar-se para a liberdade. Em um poema, Péguy descreve a esperança como a chama da lâmpada do santuário. Esta chama, diz, “atravessou a profundidade das noites”. Nos permite ver o que é agora, mas também prever o que poderia ser. Esperar significa apostar a própria existência na possibilidade do vir a ser. É uma arte a ser praticada assiduamente na atmosfera fatalista e determinista em que vivemos».
            Que Deus nos conceda viver assim este ano Jubilar!
            Que possamos todos caminhar neste mês com esta visão que “brilha nas trevas”, com a Esperança no coração que é a presença de Deus.
            Recomendo-lhes, neste mês, a oração pela nossa Congregação Salesiana, que se reúne em Capítulo Geral, acompanhem-nos todos com sua oração e seu pensamento, para que possamos ser fiéis, como Salesianos, ao que desejava Dom Bosco.