Coroa das sete dores de Maria

A publicação “Coroa das sete dores de Maria” representa uma devoção querida que São João Bosco incutia em seus jovens. Seguindo a estrutura da “Via Crucis” [Via Sacra], as sete cenas dolorosas são apresentadas com breves considerações e orações, para guiar a uma participação mais viva nos sofrimentos de Maria e de seu Filho. Rico em imagens afetivas e espiritualidade contrita, o texto reflete o desejo de unir-se a Nossa Senhora das Dores na compaixão redentora. As indulgências concedidas por vários Pontífices atestam o alto valor pastoral do texto, que é um pequeno tesouro de oração e reflexão, para alimentar o amor pela Mãe das dores.

Prólogo
O principal objetivo desta pequena obra é facilitar a lembrança e a meditação das amarguradíssimas dores do terno Coração de Maria, algo que a Ela é muito agradável, como revelou várias vezes a seus devotos, e um meio muito eficaz para nós obtermos seu patrocínio.
Para tornar mais fácil o exercício de tal meditação, praticar-se-á primeiramente com uma coroa na qual são indicadas as sete principais dores de Maria, que poderão ser meditadas em sete breves considerações distintas, do modo como se costuma fazer na Via Sacra.
Que o Senhor nos acompanhe com sua graça celestial e bênção para que se alcance o intento desejado, de modo que a alma de cada um fique vivamente penetrada pela frequente memória das dores de Maria, com proveito espiritual da alma, e tudo para maior glória de Deus.

Coroa das sete dores da Bem-Aventurada Virgem Maria com sete breves considerações sobre as mesmas expostas na forma da Via Sacra

Preparação
Queridos irmãos e irmãs em Jesus Cristo, fazemos nossos habituais exercícios meditando devotamente as amarguradíssimas dores que a Bem-Aventurada Virgem Maria sofreu na vida e morte de seu amado Filho e nosso Divino Salvador. Imaginemo-nos presentes a Jesus pendente na cruz, e que sua aflita mãe diga a cada um de nós: Venham e vejam se há uma dor igual à minha.
Convencidos de que esta Mãe piedosa quer nos conceder proteção especial ao meditarmos suas dores, invoquemos a ajuda divina com as seguintes orações:

Antífona: Vem, Espírito Santo, enche os corações dos teus fiéis e acende neles o fogo do teu amor.

Envia o teu Espírito e tudo será criado,
e renovarás a face da terra.
Lembra-te da tua Congregação,
que possuías desde o princípio.
Senhor, escuta a minha oração,
e chegue a ti o meu clamor.

Oremos.
Ilumina, Senhor, nossas mentes com a luz da tua claridade, para que possamos ver o que deve ser feito e agir corretamente. Por Cristo nosso Senhor. Amém.

Primeira dor. Profecia de Simeão
A primeira dor foi quando a Santa Virgem, Mãe de Deus, tendo apresentado seu Filho no Templo, o depôs nos braços do santo velho Simeão, que lhe disse: A espada da dor traspassará a tua alma: o que significa a Paixão e Morte de seu Filho Jesus.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Virgem dolorosa, por aquela agudíssima espada com que o santo velho Simeão te predisse que tua alma seria traspassada na paixão e morte do teu querido Jesus, suplico-te que me concedas a graça de ter sempre presente a memória do teu coração traspassado e das amarguradíssimas penas sofridas por teu Filho para minha salvação. Assim seja.

Segunda dor. Fuga para o Egito
A segunda dor foi quando a Santa Virgem se viu obrigada a fugir para o Egito a fim de evitar a perseguição do cruel Herodes, que impiamente procurava dar a morte a seu amado Filho Jesus.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Maria, mar amarguíssimo de lágrimas, por aquela dor que sentiste fugindo para o Egito para proteger teu Filho da bárbara crueldade de Herodes, suplico que sejas minha guia, para que, por teu intermédio, eu fique livre das perseguições dos inimigos visíveis e invisíveis da minha alma. Assim seja.

Terceira dor. Perda de Jesus no templo
A terceira dor da Bem-Aventurada Virgem foi quando, pelo tempo da Páscoa, depois de ter estado com o seu esposo José e com o seu amado filho Jesus em Jerusalém, de volta à sua pobre casa, perdeu o seu divino Filho e por três dias seguidos o procurou, lamentando a perda de seu único amor.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Mãe desconsolada, tu que na perda da presença corporal de teu Filho o procuraste ansiosamente por três dias seguidos, rogo-te que obtenhas a graça para todos os pecadores, para que também eles o procurem com atos de contrição e o encontrem. Assim seja.

Quarta dor. Encontro de Jesus carregando a cruz
A quarta dor da Santa Virgem foi quando encontrou seu dulcíssimo Filho Jesus, que carregava uma pesada cruz, em seus ombros delicados, até ao Monte Calvário, para ser crucificado pela nossa salvação.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Virgem mais apaixonada do que todas, por aquele sofrimento que sentiste no coração ao encontrar teu Filho enquanto ele carregava o madeiro da Santíssima Cruz rumo ao Monte Calvário, peço-te que eu o acompanhe continuamente com o pensamento, chore meus pecados, causa manifesta dos seus e dos teus tormentos. Assim seja.

Quinta dor. Crucificação de Jesus
A quinta dor da Santa Virgem foi quando viu seu Filho Jesus suspenso sobre o duro madeiro da Cruz, vertendo sangue de todo o seu Santíssimo Corpo e morrendo depois de três horas de agonia.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Rosa entre os espinhos, por aquelas dores amargas que traspassaram teu peito ao ver com teus próprios olhos teu Filho traspassado e elevado na Cruz, obtém para mim, peço-te, que eu busque com meditações assíduas somente Jesus crucificado por causa dos meus pecados. Assim seja.

Sexta dor. Deposição de Jesus da cruz
A sexta dor da Santa Virgem foi quando seu amado Filho Jesus, depois de ter sido traspassado no peito com um golpe de lança e despregado da cruz, foi deposto em seu santo regaço.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Virgem aflita, tu que acolheste teu Filho morto no colo, vencido pela Cruz, e beijando aquelas santíssimas feridas, derramaste sobre elas um mar de lágrimas, rogo-te que eu também lave continuamente com lágrimas de verdadeiro arrependimento as feridas mortais que meus pecados te causaram. Assim seja.

Sétima dor. Sepultamento de Jesus
A sétima e última dor da Santa Virgem, Senhora e Advogada dos seus servos e dos pobres pecadores, foi quando viu sepultado o Corpo Santíssimo de seu Filho Jesus.
Um Pai-Nosso e sete Ave-Marias.

Oração
Ó Mártir dos Mártires, Maria, por aquele tormento amargo que sofreste quando, sepultado teu Filho, tiveste que afastar-te daquele túmulo amado, concede graça, peço-te, a todos os pecadores, para que conheçam o quanto é grave dano para a alma estar longe de seu Deus. Assim seja.

Digam-se em seguida três Ave-Marias em sinal de profundo respeito às lágrimas que a Santíssima Virgem derramou nas suas Dores, a fim de impetrar uma verdadeira dor dos nossos pecados e para ganhar as santas indulgências.
Ave Maria etc.

Terminada a Coroa, recita-se o pranto da Bem-Aventurada Virgem, ou seja, o hino Stabat Mater etc.

Hino – Pranto da Bem-Aventurada Virgem Maria

Stabat Mater dolorosa
Iuxta crucem lacrymosa,
Dum pendebat Filius.

Cuius animam gementem
Contristatam et dolentem
Pertransivit gladius.

O quam tristis et afflicta
Fuit illa benedicta
Mater unigeniti!

Quae moerebat, et dolebat,
Pia Mater dum videbat.
Nati poenas inclyti.

Quis est homo, qui non fleret,
Matrem Christi si videret
In tanto supplicio?

Quis non posset contristari,
Christi Matrem contemplari
Dolentem cum filio?

Pro peccatis suae gentis
Vidit Iesum in tormentis
Et flagellis subditum.

Vidit suum dulcem natura
Moriendo desolatum,
Dum emisit spiritum.

Eia mater fons amoris,
Me sentire vim doloris
Fac, ut tecum lugeam.

Fac ut ardeat cor meum
In amando Christum Deum,
Ut sibi complaceam.

Sancta Mater istud agas,
Crucifixi fige plagas
Cordi meo valide.

Tui nati vulnerati
Tam dignati pro me pati
Poenas mecum divide.

Fac me tecum pie flere,
Crucifixo condolere,
Donec ego vixero.

Iuxta Crucem tecum stare,
Et me tibi sociare
In planctu desidero.

Virgo virginum praeclara,
Mihi iam non sia amara,
Fac me tecum plangere.

Fac ut portem Christi mortem,
Passionis fac consortem,
Et plagas recolere.

Fac me plagis vulnerari,
Fac me cruce inebriari,
Et cruore Filii.

Flammis ne urar succensus,
Per te, Virgo, sim defensus
In die Iudicii.

Christe, cum sit hine exire,
Da per matrem me venire
Ad palmam victoriae.

Quando corpus morietur,
Fac ut animae donetur
Paradisi gloria. Amen.

Estava a mãe dolorosa
junto da cruz, lacrimosa,
via o filho que pendia.

Na sua alma gemia,
contristada e dolorida
por um gládio transpassada.

Oh! Quão triste e aflita
entre todas, Mãe bendita,
que só tinha aquele Filho.

Quanta angústia não sentia,
Mãe piedosa quando via
as penas do Filho seu.

Quem não chora vendo isso:
contemplando a Mãe de Cristo
num suplício tão enorme?

Quem haverá que resista
se a Mãe assim se contrista
padecendo com seu Filho?

Por culpa de sua gente
Viu Jesus inocente,
Ao flagelo submetido.

Vê agora o seu amado
pelo Pai abandonado,
entregando seu espírito.

Faze, ó Mãe, fonte de amor
que eu sinta o espinho da dor,
para contigo chorar.

Faze arder meu coração
do Cristo Deus na paixão
para que o possa agradar.

Ó Santa Mãe, dá-me isto,
trazer as chagas de Cristo
gravadas no coração.

Do teu filho que por mim
entrega-se a morte assim,
divide as penas comigo.

Oh! Dá-me enquanto viver,
com Cristo compadecer,
chorando sempre contigo.

Junto à cruz eu quero estar,
quero o meu pranto juntar
às lágrimas que derramas.

Virgem, que às virgens aclara,
não sejas comigo avara,
dá-me contigo chorar.

Traga em mim do Cristo a morte,
da Paixão seja consorte,
suas chagas celebrando.

Por elas seja eu rasgado,
pela cruz inebriado,
pelo sangue de teu Filho.

No Julgamento consegue,
que às chamas não seja entregue
quem por ti é defendido.

Quando do mundo eu partir,
dai-me, ó Cristo, conseguir
por tua Mãe a vitória.

Quando meu corpo morrer,
possa a alma merecer
do Reino Celeste, a glória. Amém.

O Sumo Pontífice Inocêncio XI concede indulgência de 100 dias toda vez que se reza o Stabat Mater. Bento XIII concedeu indulgência de sete anos a quem rezar a Coroa das sete dores de Maria. Muitas outras indulgências foram concedidas por outros sumos Pontífices, especialmente aos Confrades e Coirmãs da Companhia de Maria Dolorosa.

As sete dores de Maria meditadas na forma da Via Crucis

Invoque-se a ajuda divina dizendo:
Actiones nostras, quaesumus, Domine, aspirando praeveni, et adiuvando prosequere, ut cuncta nostra oratio et operatio a te semper incipiat, et per te coepta finiatur. Per Christum Dominum Nostrum. Amen. [Inspirai, Senhor, todas as nossas ações e orações, e ajudai-nos a realizá-las, para que em Vós comece e para Vós termine tudo aquilo que fizermos. Por Cristo, Senhor nosso. Amém.]

Ato de Contrição
Virgem muitíssimo aflita, ai! quão ingrato fui no tempo passado para com meu Deus, com quanta ingratidão correspondi aos seus inúmeros benefícios! Agora me arrependo, e na amargura do meu coração e no pranto da minha alma, peço humildemente a Ele perdão por ter ultrajado sua infinita bondade, estando decidido no futuro, com a graça celestial, a nunca mais ofendê-lo. Ah! por todas as dores que suportastes na bárbara paixão do vosso amado Jesus, peço-vos com os mais profundos suspiros que me obtenhais do mesmo, piedade e misericórdia dos meus pecados. Aceitai este santo exercício que estou para fazer e recebei-o em união com aquelas penas e dores que Vós sofrestes por vosso filho Jesus. Ah, concedei-me! sim, concedei-me que aquelas mesmas espadas que traspassaram o vosso espírito, atravessem também o meu, e que eu viva e morra na amizade do meu Senhor, para participar eternamente da glória que Ele me conquistou com seu precioso Sangue. Assim seja.

Primeira dor
Nesta primeira dor, imaginemo-nos no templo de Jerusalém, onde a Bem-Aventurada Virgem ouviu a profecia do velho Simeão.

Meditação
Ah! Que angústias terá sentido o coração de Maria ao ouvir as dolorosas palavras com que lhe foi predita pelo Santo velho Simeão a amarga paixão e a atroz morte do seu dulcíssimo Jesus: enquanto naquele mesmo instante lhe surgiram à mente os ultrajes, os tormentos e as carnificinas que os ímpios judeus fariam ao Redentor do mundo. Mas sabes qual foi a espada mais penetrante que a traspassou nessa circunstância? Foi considerar a ingratidão com que seu amado Filho seria retribuído pelos homens. Agora, refletindo que, por causa dos teus pecados, estás miseravelmente entre esses tais, ah! lança-te aos pés desta Mãe Dolorosa e dize chorando assim (todos se ajoelham): Ah! Virgem piedosíssima, que sentistes tão amarga dor no vosso espírito ao ver o abuso que eu, criatura indigna, teria feito do sangue do vosso amável Filho, fazei, sim fazei por vosso aflito Coração, que eu no futuro corresponda às Divinas Misericórdias, aproveite as graças celestiais, não receba em vão tantas luzes e inspirações que Vós vos dignareis obter para mim, para que eu tenha a sorte de estar entre aqueles para quem a amarga paixão de Jesus seja de salvação eterna. Assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Segunda dor
Nesta segunda dor, consideremos a dolorosíssima viagem que a Virgem fez ao Egito para libertar Jesus da cruel perseguição de Herodes.

Meditação
Considera a amarga dor que Maria terá sentido quando, à noite, teve que partir por ordem do Anjo para preservar seu Filho da matança ordenada por aquele feroz Príncipe. Ah! que a cada grito de animal, a cada sopro de vento, a cada movimento de folha que ouvia por aquelas estradas desertas, se enchia de medo temendo algum infortúnio para o menino Jesus que levava consigo. Ora se voltava para um lado, ora para o outro, ora apressava o passo, ora se escondia crendo ter sido alcançada pelos soldados, que, arrancando de seus braços seu amabilíssimo Filho, teriam feito sob seus olhos um tratamento bárbaro, e fixando o olhar lacrimoso sobre seu Jesus e apertando-o fortemente ao peito, dando-lhe mil beijos, mandava do coração os suspiros mais angustiados. E aqui reflete quantas vezes renovaste essa amarga dor a Maria, forçando seu Filho com teus graves pecados a fugir da tua alma. Agora que conheces o grande mal cometido, volta-te arrependido a esta piedosa Mãe e dize-lhe assim:
Ah, Mãe dulcíssima! Uma vez Herodes obrigou-vos, com vosso Jesus, a fugir da inumana perseguição por ele ordenada; mas eu, oh! quantas vezes obriguei meu Redentor e, por consequência, também a vós, a partir rapidamente do meu coração, introduzindo nele o maldito pecado, inimigo cruel vosso e do meu Deus. Ah! todo dolorido e contrito vos peço humildemente perdão.
Sim, misericórdia, ó querida Mãe, misericórdia, e prometo-vos no futuro, com a ajuda divina, manter sempre meu Salvador e Vós no total domínio da minha alma. Assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Terceira dor
Nesta terceira dor, consideremos a Virgem muitíssimo aflita que, lacrimosa, vai à procura do seu Jesus perdido.

Meditação
Quão grande foi a dor de Maria quando percebeu que havia perdido seu amável Filho! E como cresceu sua dor quando, tendo-o procurado diligentemente entre amigos, parentes e vizinhos, não pôde obter nenhuma notícia dele. Ela, não se importando com os incômodos, o cansaço, os perigos, vagou por três dias seguidos pelas regiões da Judeia, repetindo aquelas palavras de desolação: talvez alguém tenha visto aquele que verdadeiramente ama a minha alma? Ah! que a grande ansiedade com que o procurava a fazia imaginar a cada momento vê-lo ou ouvir sua voz; mas, ao se reconhecer frustrada, oh, como se aterrorizava e sentia mais intensamente o pesar por tão deplorável perda! Grande confusão para ti, pecador, que tantas vezes perdeste teu Jesus pelos graves pecados cometidos, e não te preocupaste em procurá-lo, claro sinal de que pouco ou nenhum valor dás ao precioso tesouro da amizade divina. Chora, pois, tua cegueira, e voltando-te a esta Mãe Dolorosa, dize-lhe suspirando assim:
Virgem muitíssimo aflita, fazei que eu aprenda de vós a verdadeira maneira de buscar Jesus que perdi para seguir minhas paixões e as iníquas sugestões do demônio, para que eu consiga encontrá-lo, e quando o tiver recuperado, repetirei continuamente aquelas vossas palavras: Encontrei aquele que verdadeiramente ama meu coração; o guardarei sempre comigo, e nunca mais o deixarei partir. Assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Quarta dor
Na quarta dor, consideremos o encontro que a Virgem Dolorosa teve com seu Filho apaixonado.

Meditação
Venham, ó corações endurecidos, e vejam se conseguem suportar este espetáculo lacrimoso. É uma mãe, a mais terna, a mais amorosa, que encontra seu Filho, o mais doce, o mais amável; e como o encontra? Oh Deus! no meio da mais ímpia turba que o arrasta cruelmente para a morte, carregado de feridas, pingando sangue, rasgado pelas feridas, com uma coroa de espinhos na cabeça e com um tronco pesado sobre os ombros, ofegante, cansado, exausto, que parece a cada passo querer exalar o último suspiro.
Ah! considera, minha alma, a parada mortal que a Santíssima Virgem faz ao primeiro olhar que fixa sobre seu Jesus atormentado; ela gostaria de lhe dar o último adeus, mas como, se a dor a impede de pronunciar palavra? Gostaria de lançar-se ao seu pescoço, mas fica imóvel e petrificada pela força da aflição interna; gostaria de desabafar com o pranto, mas sente o coração tão apertado e oprimido que não consegue derramar uma lágrima. Oh! e quem pode conter as lágrimas ao ver uma pobre Mãe imersa em tão grande aflição? Mas quem é a causa de tão amarga dor? Ah, sou eu; sim, sou eu com meus pecados que fiz uma ferida tão bárbara ao vosso terno coração, ó Virgem Dolorosa. Porém, quem acreditaria? Permaneço insensível sem me comover. Mas se fui ingrato no passado, no futuro não serei mais.
Enquanto isso, prostrado aos vossos pés, ó Santíssima Virgem, peço humildemente perdão por tanto sofrimento que vos causei. Sei e confesso que não mereço piedade, sendo eu a verdadeira causa de vossa dor ao encontrar vosso Jesus todo coberto de feridas; mas lembrai-vos, sim, lembrai-vos que sois mãe de misericórdia. Ah, mostrai-vos, pois, assim para comigo, que eu vos prometo no futuro ser mais fiel ao meu Redentor, e assim compensar tantos desgostos que causei ao vosso aflito espírito. Assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Quinta dor
Nesta quinta dor, imaginemo-nos no Monte Calvário onde a Virgem muitíssimo aflita viu seu amado Filho expirar na Cruz.

Meditação
Aqui estamos no Calvário onde já estão erguidos dois altares de sacrifício, um no corpo de Jesus, outro no coração de Maria. Oh espetáculo terrível! Vemos a Mãe afogada num mar de aflições ao ver ser levado à morte cruel o caro e amável fruto de suas entranhas. Ai de mim! Cada martelada, cada ferida, cada rasgo que o Salvador recebe em seu corpo ressoa profundamente no coração da Virgem. Ela está aos pés da Cruz tão penetrada pela dor e transpassada pelo sofrimento que não se sabe quem será o primeiro a expirar, se Jesus ou Maria. Fixa o olhar no rosto agonizante do Filho, considera as pupilas cansadas, o rosto pálido, os lábios lívidos, a respiração difícil e finalmente sabe que Ele não vive mais e que já entregou o espírito no seio do eterno Pai. Ah, então a alma dela faz todo esforço possível para se separar do corpo e unir-se à de Jesus. E quem pode suportar tal visão.
Ó Mãe muitíssimo dolorosa, em vez de se retirar do Calvário para não sentir tão intensamente as angústias, permaneceis imóvel para absorver até a última gota o cálice amargo de vossas aflições. Que confusão deve ser esta para mim que busco todos os meios para evitar as cruzes e os pequenos sofrimentos que, para meu bem, o Senhor se digna enviar-me? Virgem muitíssimo dolorosa, humilho-me diante de vós, ah! fazei que eu conheça claramente o valor e o grande mérito do sofrimento, para que me apegue tanto a ele que nunca me canse de exclamar com São Francisco Xavier: Plus Domine, Plus Domine, mais sofrer, meu Deus. Ah sim, mais sofrer, ó meu Deus. Assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Sexta dor
Nesta sexta dor, imaginemo-nos vendo a Virgem desconsolada que recebe nos braços o corpo morto de seu Filho, retirado da Cruz.

Meditação
Considera a dor mais amarga que penetrou a alma de Maria quando viu no seu colo o corpo morto do amado Jesus. Ah! ao fixar o olhar nas feridas e nas chagas dele, ao contemplá-lo tingido com seu próprio sangue, foi tal o ímpeto da dor interior que seu coração foi mortalmente traspassado, e se não morreu foi a onipotência divina que a conservou viva. Ó pobre Mãe, sim, pobre mãe, que conduzis ao túmulo o caro objeto de vossas mais ternas complacências, e que de um ramo de rosas se tornou um feixe de espinhos pelos maus-tratos e rasgos feitos pelos ímpios malfeitores. E quem não terá compaixão de vós? Quem não se sentirá dilacerado pela dor ao ver-vos num estado de aflição que comove até a pedra mais dura? Vejo João inconsolável, Madalena com as outras Marias que choram amargamente, Nicodemos que não pode mais suportar a aflição. E eu? Eu sozinho não derramo uma lágrima em meio a tanto sofrimento! Ingrato e ignorante que sou!
Ah! Mãe piedosíssima, aqui estou aos vossos pés, recebei-me sob a vossa poderosa proteção e fazei com que este meu coração seja traspassado por aquela mesma espada que atravessou de parte a parte o vosso aflito espírito, para que se amoleça uma vez e chore verdadeiramente meus graves pecados que vos causaram tão cruel martírio. E assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Sétima dor
Nesta sétima dor, consideremos a Virgem muitíssimo dolorosa que vê seu Filho morto ser sepultado.

Meditação
Considera o suspiro mortal que enviou o aflito coração de Maria quando viu seu amável Jesus ser colocado no túmulo! Oh que dor, que sofrimento sentiu seu espírito quando foi levantada a pedra com que se deveria fechar aquele sacratíssimo monumento! Não era possível afastá-la da borda do sepulcro, enquanto a dor era tal que a tornava insensível e imóvel, sem cessar de contemplar aquelas chagas e aquelas feridas cruéis. Quando então o túmulo foi fechado, oh, então sim, tal foi a força da dor interior que ela teria certamente caído morta se Deus não a tivesse conservado viva. Ó Mãe muitíssimo atribulada! Agora partireis com o corpo deste lugar, mas aqui certamente ficará vosso coração, pois aqui está vosso verdadeiro tesouro. Ah destino, que em companhia dele fique todo nosso afeto, todo nosso amor, como poderá ser que não nos derretamos de benevolência para com o Salvador, que deu todo seu sangue por nossa salvação? Como poderá ser que não amemos a Vós que tanto sofrestes por nossa causa.
Agora nós, chorando arrependidos por termos causado tantas dores a vosso Filho e a vós tanta amargura, prostramo-nos aos vossos pés e por todas aquelas dores que nos fizestes a graça de meditar, concedei-nos este favor: que a memória das mesmas fique sempre vivamente impressa em nossa mente, que nossos corações se consumam por amor ao nosso bom Deus, e a Vós, nossa doce Mãe, e que o último suspiro de nossa vida se una àqueles que derramastes do fundo da vossa alma na dolorosa paixão de Jesus, a quem seja honra, glória e ação de graças pelos séculos dos séculos. Assim seja. Ave Maria etc. Glória ao Pai etc.

Maria, meu doce bem,
Gravai no meu coração as vossas dores.

Então se reza o Stabat Mater, como acima.

Antífona. Tuam ipsius animam (ait ad Mariam Simeon) pertransiet gladius. [Tua própria alma (disse Simeão a Maria) uma espada transpassará]
Rogai por nós, Virgem Dolorosa.
Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

Oremos
Deus, em cuja paixão, segundo a profecia de Simeão, a doce alma da Gloriosa Virgem e Mãe Maria Dolorosa foi traspassada pela espada, concedei propício que, nós que recordamos a memória de suas dores, alcancemos felizmente o efeito da vossa paixão. Vós que viveis e reinais pelos séculos dos séculos. Amém.

Louvado seja Deus e a Virgem Dolorosa.

Com permissão da Revisão Eclesiástica

A Festa das Sete Dores de Maria Virgem Dolorosa, celebrada pela Pia União e Sociedade, ocorre no terceiro domingo de setembro na Igreja de São Francisco de Assis.

Texto da 3ª edição, Turim, Tipografia de Giulio Speirani e filhos, 1871




Dom Bosco com seus salesianos

Se com seus meninos Dom Bosco brincava alegremente para vê-los alegres e serenos, com seus salesianos revelava também em tom de brincadeira a estima que tinha por eles, o desejo de vê-los formar com ele uma grande família, pobre sim, mas confiante na Divina Providência, unida na fé e na caridade.

Os feudos de Dom Bosco
Em 1830, Margarida Occhiena, viúva de Francisco Bosco, fez a divisão dos bens herdados de seu marido entre seu enteado Antônio e seus dois filhos José e João. Consistia, entre outras coisas, de oito lotes de terra com prado, campo e vinhedo. Não sabemos nada exato sobre os critérios seguidos por Mamãe Margarida ao dividir a herança paterna entre os três. Entretanto, entre os lotes de terra havia um vinhedo próximo aos Becchi (em Bric dei Pin), um campo em Valcapone (ou Valcappone) e outro em Bacajan (ou Bacaiau). De qualquer forma, essas três terras constituem os “feudos” que Dom Bosco, às vezes, chamava por brincadeira de sua propriedade.
Os Becchi, como todos sabemos, são o humilde povoado do vilarejo onde Dom Bosco nasceu; Valcapponé (ou Valcapone) era um local a leste do Colle, sob a Serra di Capriglio, mas no fundo do vale, na área conhecida como Sbaruau (= espantalho), porque era densamente arborizada, com algumas cabanas escondidas entre os galhos, que serviam como local de armazenamento para lavanderias e como refúgio para bandidos. Bacajan (ou Bacaiau) era um campo a leste do Colle, entre os lotes de Valcapone e Morialdo. Estes são os “feudos” de Dom Bosco!
As Memórias Biográficas dizem que, por algum tempo, Dom Bosco conferiu títulos de nobreza a seus colaboradores leigos. Assim, havia o Conde dos Becchi, o Marquês de Valcappone, o Barão de Bacaiau, isto é, os três terrenos que Dom Bosco devia conhecer como parte de sua herança. “Com esses títulos costumava chamar Rossi, Gastini, Enria, Pelazza, Buzzetti, não só em casa, mas também fora, sobretudo quando viajava com alguns deles” (MB VIII, 198-199 – MB VIII, 231-232).
Entre esses “nobres” salesianos, sabemos com certeza que o conde dos Becchi (ou do Bricco del Pino) era José Rossi, o primeiro salesiano leigo, ou “Coadjutor”, que amava Dom Bosco como um filho muito afeiçoado e lhe foi fiel para sempre.
Um dia, Dom Bosco foi à estação de Porta Nova e José Rossi o acompanhou carregando sua mala. Eles chegaram quando o trem estava prestes a partir e os vagões estavam cheios de gente. Dom Bosco, não conseguindo encontrar um assento, voltou-se para Rossi e, em voz alta, disse-lhe:
– Oh, senhor conde, lamento que esteja tendo tanto trabalho por mim!
– Imagine, Dom Bosco, é uma honra para mim!
Alguns viajantes que estavam na janela, ao ouvirem aquelas palavras “Senhor Conde” e “Dom Bosco”, olharam uns para os outros com espanto e um deles gritou do vagão:
– Dom Bosco! Senhor Conde! Subam aqui; ainda há dois lugares!
– Mas eu não queria incomodá-los – respondeu Dom Bosco.
– Subam! É uma honra para nós. Vou retirar minhas malas; estarão à vontade!
E assim o “Conde dos Becchi” pôde entrar no trem com Dom Bosco e a mala.

As bombas e uma cabana
Dom Bosco viveu e morreu pobre. Para comer, ele se contentava com muito pouco. Até mesmo um copo de vinho já era demais para ele, e ele sistematicamente misturava com água.
“Muitas vezes se esquecia de beber por estar absorto em outros pensamentos, e cabia aos vizinhos de mesa completar-lhe o copo. Então, se o vinho era do bom, logo procurava água “para fazê-lo melhor”, dizia. E acrescentava sorrindo: ‘Renunciei ao mundo e ao demônio, mas não às pompas’, aludindo às bombas que tiram água dos poços” (MB IV, 191-192 – MBp IV, 181).
Até mesmo para as acomodações, sabemos como ele vivia. Em 12 de setembro de 1873, foi realizada a Conferência Geral dos Salesianos para reeleger um ecônomo e três conselheiros. Naquela ocasião, Dom Bosco pronunciou palavras memoráveis e proféticas sobre o desenvolvimento da Congregação. Então, quando chegou a hora de falar sobre o Capítulo Superior, que a essa altura parecia precisar de uma residência adequada, ele disse, em meio à hilaridade universal: “Se fosse possível, eu gostaria de fazer no meio do pátio uma ‘söpanta’ (leia-se: supanta = barraca, abrigo), onde o Capítulo Superior pudesse ficar separado de todos os mortais. Como os membros deste Capítulo Superior têm o direito de continuar a viver nesta terra, ele poderá estar ora aqui, ora lá, nas diversas casas, segundo parecer melhor!” (MB X, 1061-1062 – MBp X, 888-889).

Otis, botis, pija tutis
Um jovem lhe perguntava um dia como ele conhecia o futuro e adivinhava tantos segredos. Respondeu-lhe:
– “Escute-me. A maneira é esta, e se explica com: Ótis, bótis, pija tútis. Sabe o que significam estas palavras? Preste atenção. São palavras gregas. E soletrando, repetiu: Ó-tis, bó-tis, pi-ja tú-tis. Entende?
– É um negócio complicado de entender!
– Também sei disso. Eu mesmo nunca quis revelar a ninguém o que significa essa epígrafe. E ninguém sabe mesmo. Nem nunca saberá. É conveniente não o revelar. Este é o grande segredo com que opero todas as coisas fora do comum. Com ele eu leio as consciências, e por meio dele revelam-se os mistérios. Mas se você é esperto, veja se pode entender alguma coisa.
E repetia aquelas quatro palavras, acentuando-as sucessivamente ao pronunciar cada uma delas. Passava o indicador na testa, sobre a boca, sobre o queixo, sobre o peito do jovem e acabava por dar-lhe, de improviso, um tapinha no rosto. O jovem ria, mas insistia:
– Mas, ao menos, traduza-me as quatro palavras em língua vulgar.
– Posso traduzi-las, mas não entenderá a tradução.
E, brincando, falava em dialeto piemontês:
– Quand ch’at dan ed bòte, pije tute (Quando lhe dão bofetadas, tome-as todas) (MB VI, 424 – MB VI, 401-402). E queria dizer que, para se tornar santo, é preciso aceitar todos os sofrimentos que a vida nos reserva.

Protetor dos funileiros
Todos os anos, os jovens do Oratório de São Leão, em Marselha, faziam um passeio à casa do Sr. Olive, um generoso benfeitor dos Salesianos. Naquela ocasião, o pai e a mãe serviam os superiores à mesa, e seus filhos, os alunos.

Em 1884, o passeio aconteceu durante a estada de Dom Bosco em Marselha.
Enquanto os alunos estavam se divertindo nos jardins, o cozinheiro correu até a Madame Olive para lhe dizer:
– Madame, a panela de sopa para os meninos está vazando e não há como remediar a isso. Terão de ficar sem sopa!
A senhora, que tinha muita fé em Dom Bosco, teve uma ideia. Mandou chamar todos os jovens:
– “Escutem”, disse-lhes ela, “se quiserem comer a sopa, ajoelhem-se aqui e rezem uma oração a Dom Bosco para que a panela deixe de vazar”.
Eles obedeceram. A panela parou de vazar instantaneamente. Mas Dom Bosco, ao ouvir o fato, riu muito e disse:
– De agora em diante, chamarão Dom Bosco de patrono dos funileiros (MB XVII, 55-56).




As sete alegrias de Nossa Senhora

No coração da obra educativa e espiritual de São João Bosco, a figura de Nossa Senhora ocupa um lugar privilegiado e luminoso. Dom Bosco não foi apenas um grande educador e fundador, mas também um fervoroso devoto da Virgem Maria, a quem venerava com profundo afeto e a quem confiava todos os seus projetos pastorais. Uma das expressões mais características dessa devoção é a prática das “Sete alegrias de Nossa Senhora”, proposta de forma simples e acessível em sua publicação “O jovem instruído”, um dos textos mais difundidos em sua pedagogia espiritual.

Uma obra para a alma dos jovens
Em 1875, Dom Bosco publicou uma nova edição de “O jovem instruído na prática de seus deveres nos exercícios de piedade cristã”, um manual de orações, exercícios espirituais e normas de conduta cristã pensado para os jovens. Este livro, redigido com um estilo sóbrio e paternal, tinha a intenção de acompanhar os jovens em sua formação moral e religiosa, introduzindo-os a uma vida cristã integral. Nele também havia espaço para a devoção às “Sete Alegrias de Maria Santíssima”, uma oração simples, mas intensa, estruturada em sete pontos. Diferentemente das “Sete Dores de Nossa Senhora”, muito mais conhecidas e difundidas na piedade popular, as “Sete alegrias” de Dom Bosco enfatizam as alegrias da Santíssima Virgem no Paraíso, consequência de uma vida terrena vivida na plenitude da graça de Deus.
Essa devoção tem origens antigas e foi particularmente apreciada pelos Franciscanos, que a difundiram a partir do século XIII, como Rosário das Sete Alegrias da Bem-Aventurada Virgem Maria (ou Coroa Seráfica). Na forma franciscana tradicional, é uma oração devocional composta por sete dezenas de Ave Marias, cada uma precedida por um mistério alegre (alegria) e introduzida por um Pai Nosso. Ao final de cada dezena, reza-se um Glória ao Pai. As alegrias são: 1. A Anunciação do Anjo; 2. A visita a Santa Isabel; 3. O nascimento do Salvador; 4. A adoração dos Magos; 5. O encontro de Jesus no templo; 6. A ressurreição do Filho; 7. A assunção e coroação de Maria no céu.
Dom Bosco, inspirando-se nessa tradição, oferece uma versão simplificada, adequada à sensibilidade dos jovens.
Cada uma dessas alegrias é meditada através da recitação de uma Ave Maria e um Glória ao Pai.

A pedagogia da alegria
A escolha de propor aos jovens essa devoção não responde apenas a um gosto pessoal de Dom Bosco, mas se insere plenamente em sua visão educativa. Ele estava convencido de que a fé deveria ser transmitida através da alegria, não do medo; através da beleza do bem, não do temor do mal. As “Sete alegrias” tornam-se assim uma escola de alegria cristã, um convite a reconhecer que, na vida da Virgem, a graça de Deus se manifesta como luz, esperança e realização.
Dom Bosco conhecia bem as dificuldades e sofrimentos que muitos de seus jovens enfrentavam diariamente: a pobreza, o abandono familiar, a precariedade do trabalho. Por isso, oferecia-lhes uma devoção mariana que não se limitasse ao pranto e à dor, mas que fosse também uma fonte de consolo e alegria. Meditar as alegrias de Maria significava abrir-se a uma visão positiva da vida, aprender a reconhecer a presença de Deus mesmo nos momentos difíceis e confiar com fé na ternura da Mãe celeste.
Na publicação “O jovem instruído”, Dom Bosco escreve palavras tocantes sobre o papel de Maria: apresenta-a como mãe amorosa, guia segura e modelo de vida cristã. A devoção às suas alegrias não é uma simples prática devocional, mas um meio para entrar em relação pessoal com Nossa Senhora, para imitar suas virtudes e receber sua ajuda materna nas provas da vida.
Para o santo turinense, Maria não é distante ou inacessível, mas próxima, presente, ativa na vida de seus filhos. Essa visão mariana, fortemente relacional, atravessa toda a espiritualidade salesiana e se reflete também na vida cotidiana dos oratórios: ambientes onde a alegria, a oração e a familiaridade com Maria caminham lado a lado.

Um legado vivo
Ainda hoje, a devoção às “Sete alegrias de Nossa Senhora” mantém intacto seu valor espiritual e educativo. Em um mundo marcado por incertezas, medos e fragilidades, ela oferece um caminho simples, mas profundo, para descobrir que a fé cristã é, antes de tudo, uma experiência de alegria e luz. Dom Bosco, profeta da alegria e da esperança, nos ensina que a verdadeira educação cristã passa pela valorização dos afetos, das emoções e da beleza do Evangelho.
Redescobrir hoje as “Sete alegrias” significa também recuperar um olhar positivo sobre a vida, a história e a presença de Deus. Com sua humildade e sua confiança, Nossa Senhora nos ensina a guardar e meditar no coração os sinais da verdadeira alegria, aquela que não passa, porque fundada no amor de Deus.
Em um tempo em que também os jovens buscam luz e sentido, as palavras de Dom Bosco permanecem atuais: “Se quiserem ser felizes, pratiquem a devoção a Maria Santíssima”. As “Sete alegrias” são, então, uma pequena escada para o céu, um rosário de luz que une a terra ao coração da Mãe celeste.

Aqui está também o texto original retirado de “O jovem instruído na prática de seus deveres religiosos”, 1952 (pp. 230-231), com nossos títulos.

As sete alegrias que Maria desfruta no Céu

1. Pureza cultivada
Alegrai-vos, ó Esposa imaculada do Espírito Santo, por aquele gozo que experimentais agora no Paraíso, porque por vossa humildade, pureza e virgindade fostes exaltada acima de todos os Anjos e sublimada além de todos os santos.
Ave Maria e Glória.

2. Sabedoria buscada
Alegrai-vos, ó Mãe de Deus, por aquele gozo que experimentais no Paraíso, porque da mesma forma que o sol cá na terra ilumina o mundo inteiro, assim vós com vosso resplendor embelezais e fazeis resplandecer todo o Paraíso.
Ave Maria e Glória.

3. Obediência filial
Alegrai-vos, ó Filha de Deus, pela sublime dignidade a que fostes exaltada no Paraíso, porque todas as Hierarquias dos Anjos, dos Arcanjos, dos Tronos, das Dominações e de todos os Espíritos Bem-Aventurados vos prestam honra e reverência e vos reconhecem como Mãe de seu Criador, e ao menor aceno vosso, vos prestam imediata obediência.
Ave Maria e Glória.

4. Oração contínua
Alegrai-vos, ó Serva da Santíssima Trindade, pelo grande poder que tendes no Paraíso, porque vos são imediatamente concedidas todas as graças que pedis ao vosso Filho Jesus, de tal sorte que, diz São Bernardo, não se concede nenhuma graça aos homens, sem que antes passe por vossas mãos santíssimas.
Ave Maria e Glória.

5. Humildade vivida
Alegrai-vos, ó Augustíssima Rainha, porque só vós merecestes sentar à direita do vosso Santíssimo Filho, que está assentado à direita do Eterno Pai.
Ave Maria e Glória.

6. Misericórdia praticada
Alegrai-vos, ó Esperança dos pecadores, Refúgio dos atribulados, ao ver que todos os que vos louvam e veneram neste mundo são premiados pelo Eterno Pai com a sua santa graça na terra e com a sua imensa glória no céu.
Ave Maria e Glória.

7. Esperança premiada
Alegrai-vos, ó Mãe, Filha e Esposa de Deus, porque todas as graças, todos os gozos, todas as alegrias e todos os privilégios que agora gozais no Paraíso não diminuirão jamais; antes, aumentarão até ao dia do juízo e durarão por toda a eternidade.
Ave Maria e Glória.

Oração à beatíssima Virgem
Ó gloriosa Virgem Maria, Mãe do meu Senhor, fonte de todas as nossas consolações, por estas vossas alegrias, que recordei com a maior devoção que me foi possível, rogo-vos me alcanceis de Deus a remissão dos meus pecados e o auxílio contínuo de sua graça, para que nunca me torne indigno da vossa proteção, mas pelo contrário tenha a dita de receber todos os favores celestes que costumais alcançar e conceder aos que fazem devota comemoração destas alegrias, que inundam o vosso belo Coração, ó Rainha imortal do Céu. Assim seja.

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O oratório festivo de Valdocco

Em 1935, após a canonização de Dom Bosco em 1934, os salesianos tiveram o cuidado de coletar testemunhos sobre ele. Um tal Pedro Pons, que quando menino tinha frequentado o oratório festivo de Valdocco por cerca de dez anos (de 1871 a 1882) e que também tinha frequentado dois anos de escola primária (com salas de aula sob a Basílica de Maria Auxiliadora), no dia 8 de novembro deu um belo testemunho daqueles anos. Extraímos dele algumas passagens, quase todas inéditas.

A figura de Dom Bosco
Ele era o centro de atração de todo o Oratório. É assim que o nosso ex-oratoriano Pedro Pons se lembra dele no final dos anos 1970: “Ele não tinha mais vigor, mas estava sempre calmo e sorridente. Tinha dois olhos que perfuravam e penetravam a mente. Comparecia entre nós: era uma alegria para todos”. O P. Rua, o P. Lazzero estavam ao seu lado como se tivessem o Senhor no meio deles. O P. Barberis e todos os rapazes corriam em sua direção, cercando-o, alguns andando ao seu lado, outros atrás dele com o rosto voltado para ele. Era uma sorte, um privilégio cobiçado poder estar perto dele, conversar com ele. Ele passeava devagar, conversando e olhando para todos, com aqueles dois olhos que se voltavam para todos os lados, eletrizando os corações com alegria”.
Entre os episódios que ficaram gravados em sua mente 60 anos depois, ele se lembra de dois em particular: “Um dia… ele apareceu sozinho na porta da frente do santuário. Então, um bando de meninos correu para encontrá-lo como uma rajada de vento. Mas ele segura na mão o guarda-chuva, que tem um cabo e uma haste tão grossa como a dos camponeses. Ele o levanta e, usando-o como uma espada, faz malabarismos para repelir aquele ataque afetuoso, ora para a direita, ora para a esquerda, para abrir a passagem. Toca um com a ponta, outro para o lado, mas, enquanto isso, os outros se aproximam pelo outro lado. Assim, o jogo, a brincadeira continua, alegrando os corações, ansiosos por ver o bom Pai voltar de sua viagem. Ele parecia um pároco de aldeia, mas daqueles bem simples”.

Os jogos e o teatrinho
É impensável um oratório salesiano sem jogos. O ex-aluno idoso recorda: “O pátio era ocupado por um prédio, a igreja de Maria Auxiliadora e no final de um muro baixo… no canto esquerdo havia uma espécie de cabana, onde sempre havia alguém para vigiar quem entrava… Logo na entrada à direita, havia um balanço com um único assento, depois as barras paralelas e a barra fixa para os meninos maiores, que gostavam de dar piruetas e cambalhotas, e também o trapézio e o passo do gigante, que ficavam, porém, perto das sacristias, além da capela de São José”. E ainda: “Esse pátio era bem comprido e se prestava muito bem as corridas de velocidade que partiam da lateral da igreja e retornavam para lá no caminho de volta. Também se brincava com “prende e solta”, corridas de sacos e quebra-pote. Esses últimos jogos eram anunciados desde o domingo anterior. O mesmo acontecia com o pau de sebo, mas o pau era fincado com a ponta fina na parte inferior para que fosse mais difícil subir. Havia loterias, e o bilhete custava um ou dois centavos. Dentro da casinha havia uma pequena biblioteca em um armário”.

O jogo era acompanhado pelo famoso “teatrinho”, no qual eram apresentados dramas autênticos, como “O filho do cruzado”, as canções de Dom Cagliero e os “musicais”, como o Sapateiro, personificado pelo lendário Carlos Gastini [um brilhante animador dos ex-alunos]. A peça, assistida gratuitamente pelos pais, era realizada no salão sob a nave da igreja de Maria A., mas o antigo oratoriano também lembra que “uma vez foi apresentada na casa Moretta [atual igreja paroquial perto da praça]. As pessoas pobres viviam lá na mais miserável pobreza. Nos porões que podem ser vistos sob a varanda, havia uma mãe pobre que, ao meio-dia, levava nos ombros seu filho Carlos, cujo corpo era rígido por causa de uma doença, a fim de poder tomar sol”.

As funções religiosas e as reuniões formativas
No oratório festivo não faltavam as funções religiosas nas manhãs de domingo: Santa Missa com a Sagrada Comunhão, orações do bom cristão; à tarde, seguia-se a recreação, o catecismo e a pregação do P. Júlio Barberis. Já idoso, “Dom Bosco nunca vinha para rezar a missa ou pregar, mas apenas para visitar e entreter-se com os meninos durante o recreio… Os catequistas e assistentes levavam seus alunos com eles para a igreja durante as funções e lhes ensinavam o catecismo. A pequena pregação era feita para todos. Exigia-se que a lição fosse memorizada em cada festa e também a explicação”. As festas solenes terminavam com uma procissão e um lanche para todos: “Ao sair da igreja depois da missa, havia um lanche. Um jovem à direita, do lado de fora da porta, dava o pão, outro à esquerda colocava duas fatias de salame com um garfo”. Aqueles meninos se contentavam com pouco, mas estavam muito felizes. Quando os meninos internos se juntavam aos oratorianos para cantar as vésperas, suas vozes podiam ser ouvidas na Rua Milão e na Rua Corte de Apelação!
As reuniões formativas do grupo também eram realizadas no oratório festivo. Na casinha perto da igreja de São Francisco, havia “uma sala pequena e baixa com capacidade para cerca de vinte pessoas… Na sala havia uma pequena mesa para o palestrante, havia bancos para as reuniões e conferências para os mais crescidos em geral e para a Companhia de São Luís, quase todos os domingos”.

Quem eram os oratorianos?
De seus cerca de 200 companheiros – mas seu número diminuía no inverno devido ao retorno dos trabalhadores sazonais para suas famílias – nosso alegre senhor lembrava que muitos eram de Biella “quase todos ‘bic’, ou seja, carregavam o balde de madeira cheio de cal e o cesto de vime cheio de tijolos para os pedreiros das construções”. Outros eram “aprendizes de pedreiros, mecânicos, funileiros”. Pobres aprendizes: trabalhavam da manhã à noite, todos os dias, e somente aos domingos podiam se dar ao luxo de um pouco de recreação “na casa de Dom Bosco” (como era chamado seu oratório): “Brincávamos de “Elefante voa”, sob a direção do então Sr. Milanesio [um futuro padre que foi um grande missionário na Patagônia]. O senhor Ponzano, mais tarde padre, era professor de ginástica. Ele nos obrigava a fazer exercícios corporais sem instrumentos, com bastões, em aparelhos”.
As lembranças de Pedro Pons são muito mais amplas, tão ricas em sugestões distantes quanto permeadas por uma sombra de nostalgia; elas esperam para serem conhecidas em sua totalidade. Esperamos que isso aconteça em breve.




Ninguém assustava as galinhas (1876)

Ambientada em janeiro de 1876, a peça apresenta um dos mais sugestivos “sonhos” de Dom Bosco, instrumento predileto com que o santo turinense sacudia e guiava os jovens do Oratório. A visão se abre para uma planície interminável onde fervilham os trabalhos dos semeadores: o trigo, símbolo da Palavra de Deus, só germinará se protegido. Mas galinhas vorazes caem sobre a semente e, enquanto os camponeses cantam versículos evangélicos, os clérigos encarregados da custódia permanecem mudos ou distraídos, deixando que tudo se perca. A cena, animada por diálogos argutos e citações bíblicas, torna-se parábola da murmuração que apaga o fruto da pregação e advertência à vigilância ativa. Com tons ao mesmo tempo paternos e severos, Dom Bosco transforma o elemento fantástico em lição moral incisiva.

Na segunda metade de janeiro o Servo de Deus teve um sonho simbólico do qual falou com alguns Salesianos. P. Barberis pediu-lhe para contá-lo em público porque os seus sonhos agradavam muito aos jovens, faziam-lhes muito bem e os afeiçoava ao Oratório.
– Sim, isso é verdade, respondeu o Beato, fazem bem e são ouvidos com avidez; o único prejudicado sou eu, pois precisaria ter pulmões de ferro. Bem se pode dizer que no Oratório não há sequer um que não se sinta emocionado com tais narrações, pois na maioria das vezes esses sonhos impressionam a todos e cada um quer saber em que situação o tenha visto, o que deva fazer, que significado tenha isto ou aquilo. E eu fico aflito dia e noite. Se depois quero despertar o desejo das confissões gerais, não tenho outra coisa a fazer senão narrar um sonho. Escute, faça uma coisa. Domingo irei falar aos jovens e você interrompe-me em público. Eu então contarei o sonho.
No dia 23 de janeiro, após as orações da noite, ele subiu na cátedra. O seu rosto, radiante de alegria, manifestava, como sempre, a própria alegria de encontrar-se entre seus filhos. Após um pouco de silêncio, P. Barberis pediu para falar e perguntou:
– Desculpe, senhor Dom Bosco, permite-me fazer-lhe uma pergunta?
– Pois não, diga.
– Ouvi dizer que nestas noites passadas, teve um sonho de semeadura, com semeador, com galinhas e que já o contou ao clérigo Calvi. Poderia fazer o favor de contá-lo também a nós? Isso nos daria muito prazer.
– Curioso! – disse Dom Bosco em tom de bronca. E então explodiu uma gargalhada geral.
– Não importa, sabe, que me chame de curioso; contanto que nos conte o sonho. E com este meu pedido creio interpretar a vontade de todos os jovens que certamente o ouvirão com muito gosto.
– Se é assim, eu o conto. Não queria dizer nada porque há coisas que se referem a vários de vocês em particular e algumas também para você, que fazem arder um pouco as orelhas; mas já que me pediram, eu contarei.
– Mas, eh!, senhor Dom Bosco, se há alguma paulada para mim, poupe-a aqui em público.
– Eu contarei as coisas como as sonhei, cada um tome a sua parte. Mas antes de tudo é preciso que cada um tenha em mente que os sonhos me acontecem dormindo e dormindo não se pensa; por isso, se há algo de bom, alguma advertência a tomar, se tome. Além disso, ninguém fique preocupado. Disse que sonhando eu de noite dormia, porque alguns sonham também de dia e algumas vezes até mesmo estando acordados e com não leve incômodo dos professores para os quais tornam-se estudantes que importunam.

Parecia-me estar longe daqui e encontrar-me em Castelnuovo d’Asti, minha terra. Diante de mim, havia uma grande extensão de terra, situada em uma vasta e bela planície; mas aquele terreno não era nosso e não sabia de quem era.
Naquele campo vi muitos que trabalhavam com pás, enxadas e outros instrumentos. Havia um que arava, quem semeava o grão, quem aplainava a terra, quem fazia outras coisas. Havia aqui e lá chefes escolhidos para dirigir os trabalhos e, entre esses, parecia-me estar também eu. Coros de camponeses estavam em outro lugar cantando. Eu observava maravilhado e não sabia dar-me conta daquele lugar. Dizia a mim mesmo: – Mas, com que finalidade estas pessoas trabalham tanto? E respondia a mim mesmo: – Para prover o pão de cada dia aos meus jovens. E era realmente uma maravilha ver como aqueles bons agricultores não desistiam sequer um instante do trabalho e sem cessar continuavam no seu trabalho com um ardor contínuo e com a mesma constância. Só alguns estavam rindo e brincando entre eles.
Enquanto eu contemplava tão belo quadro, olho ao meu redor e vejo que me rodeavam alguns padres e muitos dos meus clérigos, alguns próximos e outros a uma certa distância. Dizia comigo mesmo: – Mas eu sonho; os meus clérigos estão em Turim, aqui, ao invés, estamos em Castelnuovo. E depois, como pode ser isso? Eu estou com roupa de inverno da cabeça aos pés, somente ontem eu estava com tanto frio e agora aqui se semeia o grão. Eu me tocava as mãos e caminhava e dizia: – Mas realmente não estou sonhando, este é um campo real; este clérigo aqui é o clérigo A… em pessoa; este outro é o clérigo B. E depois, como no sonho eu poderia ver esta coisa e aquela outra?
Nesse meio tempo, vi ali perto mais à parte, um velho que aparentemente se mostrava muito benévolo e sensato, prudente, atento a observar-me e aos outros. Aproximei-me dele e lhe perguntei: – Diga-me, bravo homem, escute-me! Que é isso que eu vejo e não compreendo nada? Onde estamos aqui? Quem são esses trabalhadores? De quem é este campo?
– Oh, respondeu-me aquele homem; belas perguntas a serem feitas! É um padre e não sabe estas coisas?
– Mas por isso diga-me! Você acredita que eu sonho ou que esteja acordado? Pois me parece sonhar e não me parecem possíveis as coisas que vejo.
– Possibilíssimas, antes, reais e me parece que o senhor esteja bem desperto. Não se percebe? Fala, ri, brinca.
– E no entanto há alguns, eu acrescentei, que no sonho parecem falar, escutar, agir, como se estivessem acordados.
– Mas não; deixe de lado tudo isso. O senhor está aqui com corpo e alma.
– Seja pois assim; e se eu despertar, diga-me, então, de quem é este campo.
– O senhor estudou latim; qual é o primeiro nome da segunda declinação que estudou no Donato? Sabe-o ainda?
– Eh, claro que sei; mas o que tem a ver isso com a minha pergunta?
– Tem a ver e muitíssimo. Diga, pois, qual é o primeiro nome que se estuda na segunda declinação.
– É Dominus.
– E como é o genitivo?
– Domini!
– Bravo, bem, Domini; este campo é pois Domini, do Senhor.
– Ah! Agora começo a compreender alguma coisa! – exclamei.
Estava maravilhado pela conclusão obtida daquele bom velho. No momento vi várias pessoas chegando com sacos de grãos para semear e um grupo de camponeses cantava: Exit, qui seminat, seminare semem suum (O semeador saiu a semear a sua semente – Lc 8,5).
A mim parecia um pecado jogar fora aquela semente e fazê-las morrer enterrada. Era tão belo aquele grão! Não seria melhor, dizia comigo mesmo, não seria melhor triturá-lo e fazer dele pão ou massa? – Mas depois pensava: – Quem não semeia não recolhe. Se não se lança a semente e essa não apodrece, o que se recolherá depois?
Naquele instante vejo sair de todas as partes uma multidão de galinhas e irem para a semeadura bicar todo grão que outros espalhavam.
E aquele grupo de cantores continuava o seu canto: Venerunt aves caeli, sustulerunt frumentum e reliquerunt zizaniam (Vieram as aves do céu, pegaram o trigo e deixaram a cizânia – cf. Mt 12,43).
Dou uma olhada ao redor e observo aqueles clérigos que estavam comigo. Um com as mãos entrelaçadas estava olhando com fria indiferença; outro tagarelava com os colegas, outros se abraçavam; outros olhavam o céu, outros riam daquele quadro, outros continuavam tranquilamente o seu recreio e os seus jogos, outros terminavam algum trabalho seu; mas ninguém espantava as galinhas para fazê-las ir embora. Eu me dirijo a eles muito magoado e, chamando cada um pelo nome, dizia: – Mas o que fazem? Não veem aquelas galinhas comendo todo o grão? Não veem que destroem a boa semente, fazem desaparecer as esperanças destes bons lavradores? O que colherão depois? Por que estão assim calados? Por que não gritam, por que não as fazem ir embora?
Mas os clérigos encolhiam os ombros, olhavam-me e nada diziam. Alguns nem sequer se viraram: não cuidavam antes daquele campo nem cuidarão depois que eu ralhei.
Vocês são todos insensatos! – eu continuava. As galinhas já estão todas com o papo cheio. Vocês não poderiam bater as mãos e fazer assim? E, no entanto, eu batia as mãos encontrando-me em uma verdadeira confusão, pois de nada adiantavam as minhas palavras. Então alguns se puseram a afugentar as galinhas, mas eu repetia comigo mesmo: – Eh, sim! Agora que todo o grão foi comigo, se espantam as galinhas!
Naquele momento me surpreendeu o ouvido o canto daquele grupo de lavradores os quais cantavam assim: Canes muti nescientes latrare (São cães mudos incapazes de ladrar – cf. Is 56,10).
Então me dirigi àquele bom velho e, entre estupefato e indignado, disse-lhe: – Vamos lá! Dê-me uma explicação do que vejo; eu não entendo nada disso. O que é aquela semente que se lança por terra?
– Oh, amigo! Semen est verbum Dei (A semente é a Palavra de Deus – Lc 8,11).
– Mas o que quer dizer isso, pois vejo que lá as galinhas a comem?
O velho, mudando o tom de voz, prosseguiu:
– Oh! Se quer uma explicação mais completa eu lha dou. O campo é a vinha do Senhor, da qual se fala no Evangelho, e se pode também entender do coração do homem. Os cultivadores são os operários evangélicos que, especialmente com a pregação, semeiam a Palavra de Deus. Esta palavra produziria muito fruto naquele coração, terreno bem preparado. Mas quê? Vêm os pássaros do céu e a levam embora.
– O que significam esses pássaros?
– Quer que eu lhe diga o que indicam? Indicam as murmurações. Ouvida aquela pregação que traria efeito, vai-se com os colegas. Um faz o comentário sobre um gesto, em voz alta, durante uma palavra do pregador, e então se perde todo o fruto da pregação. Um outro culpa o pregador por algum defeito físico ou intelectual, um terceiro ri do seu italiano, e todo o fruto da pregação fica perdido. O mesmo deve-se dizer de uma boa leitura cujo bem fica impedido por uma murmuração. As murmurações são tanto piores, pois geralmente são secretas, ocultas e ali vivem e crescem onde nada mais podemos esperar. O grão, ainda que seja num campo não muito cultivado, todavia nasce, cresce, alcança uma boa altura e produz fruto. Quando num campo, há pouco semeado, vem um temporal, então ele se torna chão batido e não produz mais tanto fruto, mas ainda produz. Se também a semeadura não for tão boa, no entanto crescerá: trará pouco fruto, mas o trará. Ao invés, quando as galinhas ou os pássaros bicam as sementes, não tem mais jeito: o campo não produz mais nada; não traz fruto de qualidade. Do mesmo modo, se às pregações, aos conselhos, aos bons propósitos houver por trás alguma outra coisa como distração, tentação etc., haverá menos fruto; mas quando há murmuração, o falar mal ou coisa semelhante, aqui não há o pouco que permanece, mas há logo o tudo que é levado embora. E a quem compete bater palmas, insistir, ralhar, vigiar, para que estas murmurações, estas más conversas não aconteçam? O senhor o sabe!
– Mas o que faziam esses clérigos? – eu lhe perguntei. Não podiam eles impedir tanto mal?
– Não impediram nada, ele prosseguiu. Alguns estavam observando como estátuas mudas, outros não olhavam, não pensavam, não viam e ali estavam com os braços cruzados, outros não tinham a coragem para impedir esse mal; alguns poucos, porém, se uniam também aos murmuradores, tomavam parte nas suas maledicências, faziam o papel de destruidores da Palavra de Deus. Você que é padre insista sobre isto: prega, exorta, fala, não tenha medo de jamais falar demais; e todos saibam que criticar quem prega, quem exorta, quem dá bom conselho é o que provoca a parte maior do mal. E o ficar calado quando se vê alguma desordem e não impedi-la, especialmente quem poderia ou deveria, isto é, em resumo, tornar-se cúmplice do mal alheio.
Eu, ciente de tudo por essas palavras, queria ainda olhar, observar esta e aquela coisa, repreender os clérigos, estimulá-los a cumprir o próprio dever. E eles já se mexiam e procuravam afugentar as galinhas. Mas eu, tendo dado alguns passos, tropecei num rastelo, destinado a aplainar a terra, deixado naquele campo, e acordei. Agora deixemos de lado tudo e vamos à moral. P. Barberis, o que nos diz a respeito deste sonho?
– Digo, respondeu P. Barberis, que é uma boa surra e um golpe a quem toca.
– Está certo, retomou Dom Bosco, é uma lição que precisa fazer-nos bem; e tenham em mente isto, meus queridos jovens, evitar entre vocês de qualquer maneira a murmuração, como um mal extraordinário, fugindo dela como se foge da peste, e não só evitá-la vocês, mas com toda força procurar fazer com os outros a evitem. Algumas vezes santos conselhos, ótimas obras não fazem o bem, que leva a impedir uma murmuração e qualquer palavra que possa prejudicar a outros. Armemo-nos de coragem e combatamo-la com franqueza. Não há pior desgraça do que a de fazer perder a palavra de Deus. E basta um mote, basta uma brincadeira.
Contei-lhes um sonho ocorrido já em várias noites, mas nesta noite passada tive um outro que agora desejo narrar-lhes. Ainda não é muito tarde; são apenas as nove eu posso expô-lo a vocês. Contudo procurarei não demorar.
Pareceu-me, então, encontrar-me num lugar que agora não me lembro mais qual fosse; eu não estava mais em Castelnuovo, mas parece-me que nem mesmo estivesse no Oratório. Veio alguém apressadamente me chamar: – Dom Bosco, venha! Dom Bosco, venha!
– Mas qual é o motivo de tanta pressa? – eu respondi.
– Está sabendo das coisas acontecidas?
– Eu não entendo o que você quer dizer: explique-me claramente, respondi ansioso.
– Não sabe, Dom Bosco, que tal jovem tão bom, tão animado, está gravemente enfermo, aliás, moribundo?
– Eu duvido que você queira brincar comigo, lhe disse: porque exatamente esta manhã falei e passeei com o mesmo jovem que você agora me diz estar moribundo.
– Ah, Dom Bosco! Eu não o estou enganando e me julgo na obrigação de narrar-lhe a pura verdade. Aquele jovem tem grande necessidade do senhor e deseja vê-lo e falar-lhe pela última vez. Mas venha logo porque senão não chega em tempo.
Eu, sem saber o lugar, fui apressadamente atrás daquele tal. Chego em um lugar e vejo gente triste e chorando que me diz:  Ajude-nos logo, por favor, porque está nas últimas.
– Mas o que aconteceu? – respondo. Fui levado em um quarto onde vejo deitado um jovem muito pálido no rosto, com uma cor quase cadavérica, com uma tosse e um estertor que o sufocava e mal permitia que ele falasse.
– Mas você não é o fulano de tal? – eu lhe disse:
– Sim, sou o tal.
– Como está?
– Estou mal!
– E como é que agora o vejo neste estado? Você não estava andando tranquilo sob os pórticos ontem e esta manhã?
– Sim, respondeu o jovem, ontem e esta manhã passeava sob os pórticos; mas agora faça depressa que eu tenho necessidade de confessar-me; vejo que me resta muito pouco tempo.
– Não se aflija, não se aflija; você confessou-se há poucos dias.
– É verdade e me parece não havia nenhuma falta grave no meu coração; todavia desejo receber a santa absolvição antes de apresentar-me ao Divino Juiz.
Eu ouvi a sua confissão. Mas observei que piorava visivelmente e um catarro estava para sufocá-lo. – Mas aqui é preciso agir rápido, digo comigo mesmo, se quiser que receba ainda o santo viático e o óleo santo. Antes, o viático não poderá mais recebê-lo, seja porque requer mais tempo para os preparativos, seja porque a tosse poderia impedi-lo de engolir. Depressa, o óleo santo!
Assim dizendo, saio do quarto e mando imediatamente um homem pegar a bolsa com os óleos santos. Os jovens que estavam na sala me perguntavam:
– Mas está realmente em perigo? Está mesmo moribundo, como se está dizendo?
– Infelizmente! – eu respondia. Não vê que a respiração se lhe torna cada vez mais lenta e o catarro o sufoca?
– Mas será melhor trazer-lhe também o viático e assim fortalecido mandá-lo nos braços de Maria.
Mas enquanto eu me apressava preparando o necessário, ouço um voz. – Expirou!
Entro de novo no quarto e encontro o enfermo com os olhos arregalados; não respira mais; está morto.
– Está morto? – perguntei para aqueles dois que o assistiam.
– Está morto, responderam-me. Está morto.
– Mas como vai, assim tão depressa? Diga-me: não é esse o fulano?
– Sim, é o fulano.
– Não posso acreditar! Ainda ontem passeava comigo sob os pórticos.
– Ontem passeava e agora está morto, me replicaram.
– Felizmente era um jovem bom! – exclamei. E dizia aos jovens que estavam ao meu redor: – Veem, veem? Este não pôde nem mesmo receber o viático e a extrema unção. Agradeçamos, porém, ao Senhor que lhe deu tempo para confessar-se. Este jovem era bom, frequentava bastante os sacramentos, e esperamos que tenha ido para uma vida feliz, ou ao menos no purgatório. Mas se tocasse um pouco a outros o mesmo destino, o que seria agora de alguns?
Dito isso, colocamo-nos todos de joelhos e rezamos um De profundis pela alma do pobre falecido.
Enquanto eu ia para o quarto, vejo chegar Ferraris [Coadjutor João Antônio Ferraris, livreiro] da livraria, o qual todo aflito, me diz:
– Sabe, Dom Bosco, o que aconteceu?
– Eh, infelizmente já sei! Morreu o tal! – respondo.
– Não é isso que eu quero dizer; há outros dois mortos.
– Como? Quem?
– O sicrano e o beltrano.
– Mas quando? Não compreendo.
– Sim, dois outros que morreram antes que o senhor chegasse.
– E por que não me chamou?
– Faltou tempo. Mas o senhor sabe dizer-me quando este aqui morreu?
– Morreu agora, respondi.
– O senhor sabe que dia é hoje e de que mês? – continuou Ferraris.
– Claro que sei: hoje é 22 de janeiro, segundo dia da novena de São Francisco de Sales.
– Não, disse Ferraris. O senhor se engana, Dom Bosco; veja bem. – Eu ergo os olhos para o calendário e vejo: 26 de maio.
– Mas esta é boa! – exclamei. Estamos em janeiro e eu bem consciente de como estou vestido; não se veste assim em maio; em maio o aquecedor não estaria ligado.
            – Eu não sei o que dizer-lhe ou que explicação dar-lhe, mas agora estamos no dia 26 de maio.
– Mas se apenas ontem faleceu este nosso companheiro e estávamos em janeiro.
– Engana-se, insistiu Ferraris; estávamos no tempo pascal.
– Mais uma você acrescenta e ainda maior!
– Tempo pascal, sem dúvida; estávamos no tempo pascal, e ele teve mais sorte de morrer na Páscoa do que os outros dois, que morreram no mês de Maria.
– Você está zombando de mim, eu lhe disse. Explique-se melhor, do contrário eu não o entendo.
– Eu não estou zombando, em absoluto. A coisa é assim. Se depois quiser saber mais, e que eu me explique melhor, eis! Esteja atento!
– Abri os braços, depois bati as duas mãos uma contra a outra bem forte. E despertei. Então exclamei: – Oh, que sorte! Não é realidade, mas um sonho. Que medo que eu tive!
Eis o sonho que tive na noite passada. Vocês deem a ele a importância que quiserem. Eu mesmo não quero dar-lhe fé totalmente. Hoje, porém, quis ver se aqueles que me pareceram mortos no sonho estavam vivos ainda, e os vi sãos e fortes. Certamente não convém que eu diga e não direi quem são aqueles. Todavia estarei de olho sobre os dois; se for necessário algum conselho para viver bem, lhes darei, e os prepararei fazendo vistas largas sem que percebam; porque assim, se lhes ocorresse morrer, a morte não os encontre despreparados. Mas ninguém fique falando: Será este, será aquele. Cada um pense em si.
E não fiquem preocupados com isso. O efeito que deve surtir em vocês é simplesmente o que nos sugere o Divino Salvador no Evangelho: Estote parati, quia, qua hora non putatis, filius hominis veniet (Estejam preparados porque o Filho do homem virá na hora em que não pensais – Lc 12,4). É esta uma importante advertência que nos faz o Senhor, meus queridos jovens. Estejam sempre preparados porque na hora em que menos esperamos pode vir a morte, e aquele que não estiver preparado para morrer bem, corre o grave risco de morrer mal. Eu procuro estar preparado o melhor que posso e vocês façam o mesmo, a fim de que a qualquer hora que agrade ao Senhor chamar-nos, possamos estar prontos para passar à eternidade. Boa noite!

As palavras de Dom Bosco eram ouvidas sempre em religioso silêncio, mas quando ele falava destas coisas extraordinárias, entre as centenas de meninos que lotavam o lugar, não se ouvia um rumor de tosse nem a mais leve roçadura dos pés. A forte impressão durava semanas e meses; e com a impressão aconteciam mudanças radicais no comportamento de alguns endiabrados. Fazia-se depois fila ao redor do confessionário de Dom Bosco. Não vinha à cabeça de ninguém supor que ele inventasse aquelas narrativas para assustar e melhorar a vida dos jovens, porque os anúncios de mortes próximas tornavam-se realidade sempre e certos estados de consciência vistos em sonhos correspondiam à realidade.
Mas o temor produzido por tão lúgubres prognósticos não era uma angústia opressora? Não parece. Apresentavam-se muitas possibilidades e hipóteses a uma multidão de mais de oitocentos jovens a fim de que cada um pudesse preocupar-se disso. Além do mais, a persuasão realmente difundida, que quem morria no Oratório ia certamente para o Paraíso, e que Dom Bosco preparava os designados sem assustá-los, contribuía para expulsar todo temor do espírito. Por outro lado, sabe-se bem quão grande é a volubilidade juvenil, num instante a fantasia dos jovens é atingida e abalada; mas depois aquela lembrança se liberta bem depressa de qualquer preocupação. É o que nos atestavam unânimes os sobreviventes daqueles tempos.
Tendo os jovens ido dormir, alguns coirmãos que rodeavam o Beato cobriam-no de perguntas para saber se algum deles estava entre aqueles que deviam morrer. O Servo de Deus, sorrindo conforme o seu costume e girando a cabeça, repetia:
– Já, já! Virei dizer-lhes quem é, com perigo de fazer alguém morrer antes do tempo!
Visto que ali não se tirava nada, perguntaram-lhe se no primeiro sonho havia também clérigos fazendo parte das galinhas, que se entregassem à murmuração. Dom Bosco, que passeava, parou, olhou para os interlocutores e deu um risinho como para dizer: – Eh! Alguém sim; mas poucos, e não acrescentou nada mais. – Então lhe pediram que dissesse ao menos se eles estavam entre os cães mudos; o Beato se firmou nos princípios gerais, observando que era preciso estar atentos para evitar e fazer evitar as murmurações e em geral todas as desordens, especialmente as más conversas. – Ai do padre e do clérigo, disse, o qual, encarregado da vigilância, vê as desordens, e não as impede! Desejo que se saiba e se lembrem que com a palavra “murmurações” eu não entendo apenas o cortar a casaca pelas costas, mas toda conversa, todo gracejo, toda palavra que possa diminuir em um colega o fruto da Palavra de Deus ouvida. Em geral, entendo dizer que é um grande mal calar-se, quando se conhece alguma desordem, não a impedindo ou não procurando que a impeça quem de direito.
Um mais ousado fez ao Servo de Deus uma pergunta um tanto arriscada.
– E P. Barberis, por que entra no sonho? O senhor disse que havia também para ele, e o próprio P. Barberis parecia esperar para si uma boa paulada. – P. Barberis estava presente. Inicialmente Dom Bosco acenava a não querer responder. Mas depois, permanecendo ao seu lado apenas alguns padres e mostrando-se P. Barberis satisfeito que ele revelasse o segredo, o Beato disse:
– Eh! P. Barberis não prega suficientemente sobre este ponto; não insiste quanto é preciso sobre este assunto. – P. Barberis confirmou que nem no ano anterior nem no ano em curso jamais se tinha fixado de propósito sobre aqueles temas aos seus noviços; gostou muito da observação e pendurou-a na orelha para o futuro.
Dito isto, subiram as escadas e todos, após beijar a mão de Dom Bosco, se afastaram e foram dormir. Todos, menos P. Barberis que, conforme o costume, acompanhou-o até a porta do seu quarto. Dom Bosco, vendo que ainda era cedo e pressentindo que não poderia dormir, porque fortemente impressionado pelas coisas expostas, contra o seu hábito costumeiro, fez P. Barberis entrar em seu aposento, dizendo:
– Já que ainda temos tempo podemos dar dois passos num vai-e-vem pela sala.
Assim continuou a discorrer por uma meia hora. Disse então outras coisas: – Eu, no sonho, vi todos e vi o estado em que cada um se encontrava; se galinha, se cão mudo, se no número daqueles que avisados se puseram mãos à obra ou não se moveram. Sirvo-me desta doutrina confessando, exortando em público até ver que produzam o bem. No início não dava muita importância a esses sonhos; mas percebi que na maior parte das vezes são mais eficazes que as pregações; antes, para alguns são mais eficazes do que um curso de Exercícios Espirituais, por isso sirvo-me deles. E por que não? Lê-se na Sagrada Escritura: Probate spiritus: quod bonum est tenete (Examinai vossas almas; guardai o que é bom – cf. 1Ts 5,21). Vejo que valem, vejo que agradam, e por que mantê-los secretos? Antes, vejo que contribuem para afeiçoar muitos à Congregação.
– Experimentei eu mesmo, interrompeu P. Barberis, quão úteis são esses sonhos e quão salutares. Mesmo narrados alhures, fazem bem. Onde Dom Bosco é conhecido, pode-se dizer que são sonhos que ele teve; onde não é conhecido, pode-se apresentar como semelhança. Oh, se se pudesse fazer disso uma antologia, expondo-lhes em forma de semelhanças! Seriam procurados e lidos por crianças e por adultos, por jovens e por idosos, com vantagem para suas almas.
– Já, já! Fariam bem, estou intimamente convicto disso.
– Mas, talvez, lamentou P. Barberis, ninguém os recolheu por escrito.
– Eu, retomou Dom Bosco, não tenho tempo e de muitas coisas não me lembro mais.
– Aquilo de que me lembro, replicou P. Barberis, são os sonhos que se referiam aos progressos da Congregação, ao estender-se do manto de Nossa Senhora.
– Ah, sim! – exclamou o Beato. E acenou a várias visões deste gênero. Tomando depois um ar mais sério e meio conturbado, prosseguiu:
– Quando penso na minha responsabilidade na posição em que me encontro, tremo inteiramente… Que contas tremendas deverei prestar a Deus por todas as graças que nos concede para o bom andamento da nossa Congregação!
(MBp XII, 36-48)

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Dom Bosco e a Igreja do Santo Sudário

O Santo Sudário de Turim, impropriamente chamado de “Santo Sudário” pelo costume francês de chamá-lo de “Le Saint Suaire”, era propriedade da Casa de Saboia desde 1463 e foi transferido de Chambery para a nova capital da Saboia em 1578.
            Naquele mesmo ano, foi realizada a primeira Exposição, que Emanuel Filiberto quis fazer em homenagem ao Card. Carlos Borromeu, que veio a Turim em peregrinação para venerá-la.

Exposições no século XIX e o culto ao Sudário
            No século XIX, as Exposições de 1815, 1842, 1868 e 1898 são particularmente dignas de nota: a primeira por ocasião do retorno da família de Saboia aos seus estados, a segunda no casamento de Vítor Emanuel II com Maria Adelaide de Habsburgo-Lorena, a terceira no casamento de Humberto I com Margarida de Saboia-Gênova e a quarta na Exposição Universal.
            Os santos de Turim do século XIX, Cottolengo, Cafasso e Dom Bosco, eram devotos do Santo Sudário, imitando o exemplo do Beato Sebastião Valfré, o apóstolo de Turim durante o cerco de 1706.
            As Memórias Biográficas nos asseguram que Dom Bosco o venerou especialmente na Exposição de 1842 e na de 1868, quando também levou os meninos do oratório para vê-lo (MBp II, 110-111; IX, 182).
            Hoje, a tela de valor inestimável, doada por Umberto II de Saboia à Santa Sé, é confiada ao Arcebispo de Turim “Custódio Pontifício” e mantida na suntuosa Capela Guarini, atrás da Catedral.
            Em Turim, há também, na Rua Piave, na esquina da Rua São Domingos, a Igreja do Santo Sudário, construída pela Confraria de mesmo nome e reconstruída em 1761. Adjacente à igreja está o “Museu Sindonológico” e a sede do Sodalício “Cultores Sanctae Sindonis” [Cultores do Santo Sudário], um centro de estudos sindonológicos para o qual fizeram valiosas contribuições estudiosos salesianos como o P. Natal Noguier de Malijay, o P. Antônio Tonelli, o P. Alberto Caviglia, o P. Pedro Scotti e, mais recentemente, o P. Pedro Rinaldi e o P. Luís Fossati, para citar apenas os principais.

A Igreja do Santo Sudário em Roma
            Também existe uma Igreja do Santo Sudário em Roma, ao longo da rua homônima que vai do Largo Argentina paralelamente à Avenida Vitório. Erguida em 1604 com um projeto de Carlos di Castellamonte, era a Igreja dos Piemonteses, Saboianos e Niceanos, construída pela Confraria do Santo Sudário que havia surgido em Roma naquela época. Depois de 1870, ela se tornou a igreja particular da Casa de Saboia.
            Durante suas estadas em Roma, Dom Bosco celebrou a missa nessa igreja várias vezes e formulou um plano para ela e para a casa adjacente, de acordo com o propósito da então extinta Confraria, dedicada a obras de caridade para jovens abandonados, doentes e prisioneiros.
            A Confraria havia deixado de funcionar no início do século e a propriedade e a administração da igreja haviam passado para a Delegação Sarda junto à Santa Sé. Na década de 1860, a igreja estava precisando de grandes reformas, tanto que em 1868 foi temporariamente fechada.
            Mas, já em 1867, Dom Bosco teve a ideia de propor ao governo da Saboia que lhe entregasse o uso e a administração da igreja, oferecendo sua colaboração em dinheiro para concluir o trabalho de restauração. Talvez ele tenha previsto a entrada das tropas piemontesas em Roma, não muito distante, e, desejando abrir uma casa lá, pensou em fazê-lo antes que a situação se precipitasse, tornando mais difícil obter a aprovação da Santa Sé e o respeito do Estado pelos acordos (MBp IX, 461-462).
            Ele então apresentou o pedido ao governo. Em 1869, durante uma escala em Florença, ele preparou uma minuta de acordo que, ao chegar a Roma, apresentou a Pio IX. Depois de obter seu consentimento, ele passou para a solicitação oficial ao Ministério das Relações Exteriores, mas, infelizmente, a ocupação de Roma acabou prejudicando todo o caso. O próprio Dom Bosco percebeu a inadequação de insistir. Assumir, de fato, naquela época, a oficialização de uma igreja romana pertencente à Casa da Saboia por uma Congregação religiosa com sua Casa Mãe em Turim, poderia ter parecido um ato de oportunismo e servilismo em relação ao novo Governo.
            Em 1874, Dom Bosco testou novamente o terreno com o governo. Mas, infelizmente, as notícias intempestivas que vazaram dos jornais interromperam definitivamente o projeto (MBp X, 1041-1042).
            Gostaríamos, porém, de recordar o fato de que Dom Bosco, ao procurar uma oportunidade favorável para abrir uma casa em Roma, pôs os olhos na Igreja do Santo Sudário.




A décima colina (1864)

O sonho da “Décima Colina”, narrado por Dom Bosco em outubro de 1864, é uma das páginas mais sugestivas da tradição salesiana. Nele, o santo se encontra em um vale imenso cheio de jovens: alguns já no Oratório, outros ainda a serem encontrados. Guiado por uma voz misteriosa, ele deve conduzi-los por uma escarpa íngreme e depois por dez colinas, símbolo dos dez mandamentos, em direção a uma luz que prefigura o Paraíso. O carro da Inocência, as hostes penitenciais e a música celestial desenham um afresco educativo: mostram a dificuldade de preservar a pureza, o valor do arrependimento e o papel insubstituível dos educadores. Com essa visão profética, Dom Bosco antecipa a expansão mundial de sua obra e o compromisso de acompanhar cada jovem no caminho da salvação.

            Dom Bosco tinha tido um sonho na noite anterior. Ao mesmo tempo um menino, chamado C… E…, de Casale Monferrato, teve o mesmo sonho, parecendo-lhe estar com Dom Bosco e conversar com ele. Quando acordou ficou muito impressionado e foi contar o sonho ao seu professor, que o exortou a contar tudo a Dom Bosco. O menino foi procurá-lo e se encontrou com o próprio, que descia a escada e soube que ele também estava à sua procura para lhe relatar a mesma coisa.
            Pareceu a Dom Bosco estar num vale enorme repleto de milhares de garotos, mas tão numerosos que ele não acreditava poder encontrar tantos no mundo inteiro. Entre estes ele podia reconhecer todos aqueles que foram e que estão agora no Oratório. Todos os outros eram talvez aqueles que virão mais tarde. No meio dos jovens, podiam-se ver os padres e os clérigos da casa.
            Uma escarpada muito alta fechava um lado daquele vale. Enquanto Dom Bosco pensava o que poderia fazer com todos estes jovens, “uma voz” lhe disse:
            – Está vendo aquela escarpada? Pois bem, precisa que você e os seus jovens alcancem o topo.
            Então Dom Bosco ordenou àquela multidão de jovens de se dirigir até o ponto indicado. Os jovens foram correndo e iniciaram a subir pela escarpada. Os padres da casa também correram e subiam ajudando os jovens: Levantavam os que caíam e carregavam os que, cansados, não aguentavam mais. P. Rua, com as mangas arregaçadas, trabalhava mais que todos e, até agarrando os meninos de dois em dois, lançava-os até o cume da escarpada, onde caíam em pé e corriam alegremente a brincar. P. Cagliero e P. Francesia corriam no meio dos meninos gritando:
            – Coragem, continuem; continuem, coragem.
            Em pouco tempo aquela multidão de jovens chegou no topo da escarpada; também Dom Bosco tinha chegado e disse: – E agora, o que vamos fazer?
            – E a “voz” continuou:
            – Você deve ultrapassar com os seus jovens estas dez colinas que estão à sua frente, uma após a outra.
            – Mas como é que vão conseguir aguentar uma caminhada tão longa, estes garotos tão pequenos e delicados?
            Foi-lhe respondido: – Quem não puder andar com suas próprias pernas será carregado.
            E eis, de fato, na extremidade da colina aparecer uma magnífica carruagem. Impossível descrever a beleza daquela carruagem, mas vou tentar. Era triangular e tinha três rodas que se movimentavam em todos os sentidos. Nos três cantos havia três hastes cujas extremidades se encontravam num mesmo ponto por cima da mesma carruagem, formando como que um pináculo de caramanchão. Sobre este ponto de união se levantava um magnífico estandarte sobre o qual estava escrito em caracteres cubitais: Innocentia (Inocência). Havia uma faixa ao redor da carruagem com a escrita: Adjutorio Dei Altissimi Patris et Filii et Spiritus Sancti (Com a ajuda do Deus Altíssimo Pai e Filho e Espírito Santo).
            A carruagem, que era de grande esplendor, por causa do ouro e pedras preciosas, veio até o meio dos jovens. Dada a ordem, muito meninos subiram na carruagem. Seu número era de quinhentos. Quinhentos apenas eram ainda inocentes, no meio a tantos milhares de jovens.
            Dispostos estes na carruagem, Dom Bosco pensava por qual caminho deveria ir, quando viu abrir-se à sua frente uma estrada ampla e bonita, mas cheia de espinhos. Apareceram então, de repente, seis jovens, já falecidos no Oratório, vestidos de branco, carregando outra belíssima bandeira onde estava escrito: Poenitentia (Penitência). Estes se puseram à frente daquelas legiões de jovens que deviam seguir o caminho a pé. Então foi dado o sinal da partida. Muitos padres puseram-se no timão da carruagem, que, dirigida por eles, começou a se mover. Os seis meninos, vestidos de branco, seguem-no. Atrás deles vinha a multidão. Os garotos que estavam na carruagem entoaram o Laudate pueri Dominum (Louvai, meninos, ao Senhor – Sl 112,1) com uma melodia magnífica e inexprimível.
            Dom Bosco caminhava encantado com aquela música celestial, quando se lembrou de olhar atrás para ver se todos os jovens o acompanhavam. Mas, oh, doloroso espetáculo! Muitos tinham ficado no vale, muitos voltaram atrás. Dom Bosco, agitado por dor inexprimível, decidiu voltar atrás para tentar convencer aqueles jovens levianos e ajudá-los a segui-lo. Mas foi-lhe decididamente negado.
            Exclamou ele: – Mas aqueles coitados vão se perder.
            Foi-lhe respondido:
            – Pior para eles: eles foram chamados como os outros e não quiseram acompanhá-lo. A estrada a ser percorrida, eles a viram e isso basta.
            Dom Bosco queria replicar; pediu, suplicou: inútil.
            Foi-lhe dito: – A obediência é para você também! – E teve que continuar o caminho.
            Nem tinha ainda suavizado esta dor, quando um outro acidente aconteceu. Muitos dos que estavam na carruagem, aos poucos, foram caindo por terra. De quinhentos, ficaram apenas 150 debaixo do estandarte da inocência.
            O coração de Dom Bosco partia-se por tanta angústia. Ele esperava que o que estava acontecendo fosse um sonho, fazia de tudo para acordar, mas infelizmente tudo aquilo era a triste realidade. Batia palmas e ouvia o som delas; gemia e ouvia seus gemidos ecoarem pelo quarto; queria fazer sumir aquele terrível fantasma, mas não podia.
            Neste ponto, narrando o sonho, exclamava: – Meus queridos jovens! Eu conheci e vi os que ficaram no vale, os que voltaram ou caíram da carruagem! Eu reconheci a todos vocês. Mas tenho a certeza de que farei de tudo para salvá-los. Muitos de vocês, convidados por mim para se confessar, não acataram o meu chamado! Pelo amor de Deus, salvem suas almas.
            Muitos dos garotos que tinham caído da carruagem foram aos poucos se juntar entre os que caminhavam atrás da segunda bandeira. E a música da carruagem continuava tão suave que aos poucos fez esquecer a dor que Dom Bosco sentia. Sete colinas já estavam ultrapassadas e, chegando aquelas legiões na oitava, entraram num maravilhoso povoado, onde pararam para descansar um pouco. As casas daquele lugar eram de uma riqueza e beleza indescritível.
            Dom Bosco, falando aos jovens sobre este lugar, acrescentou:
            – Vou dizer para vocês o que Santa Teresa afirmou das coisas do Paraíso: são coisas que ao se falar se degradam, porque são tão belas que é inútil esforçar-se para descrevê-las. Por isso digo-lhes só que os portais das casas pareciam um conjunto de ouro, cristal e diamante que surpreendia, enchia os olhos e infundia muita alegria. Os campos estavam cheios de árvores carregadas ao mesmo tempo de flores, botões, fruta madura e fruta verde. Era uma visão maravilhosa.
            Os jovens espalharam-se pelo povoado daqui e dali, uns para uma coisa, outros para outra, pois grande era a curiosidade deles e o desejo de provar daquela fruta.
            Foi nesta vila que aquele jovem de Casale se encontrou com Dom Bosco e conversou longamente com ele. Dom Bosco e o menino lembravam perfeitamente as perguntas feitas e as respostas. Singular combinação de dois sonhos.
            Dom Bosco neste ponto teve mais uma estranha surpresa. Os seus jovens apareceram-lhe, de repente, de idade avançada, curvos, desdentados, cheios de rugas no rosto, cabelos brancos, claudicantes, apoiados em bengalas. Ficou admirado com esta metamorfose, mas a “voz” lhe disse:
            – Você se admira; mas saiba que não são poucas horas desde que saiu do vale, mas já se passaram anos e anos. Foi aquela música que lhe fez parecer curto o caminho. Como prova, olhe a sua fisionomia e verá o que estou lhe dizendo.  – E foi apresentado a Dom Bosco um espelho. Ele olhou-se no espelho e viu que o seu aspecto era de um homem idoso, com o rosto cheio de rugas e com poucos dentes e estragados.
            A comitiva, entretanto, retomou o caminho, e os jovens de vez em quando pediam para parar a fim de olhar aquelas coisas novas. Mas Dom Bosco lhes dizia: – Em frente, em frente; nós não precisamos de nada; não temos fome, nem sede, portanto em frente.
            (Lá no fundo, distante, sobre a décima colina despontava uma luz que ia sempre aumentando, como que saída de um portal). Recomeçou, então, o canto, mas tão bonito que só mesmo no Paraíso se poderia ouvir coisa igual e deleitar-se. Não era música de instrumentos, nem parecia de vozes humanas. Era uma música impossível de descrever; e tamanha foi a alegria que invadiu a alma de Dom Bosco que acordou e se viu em sua cama.
            Dom Bosco, então, explicou o sonho:
            – O vale é o mundo. A escarpada são os obstáculos para afastar-se dele. A carruagem, vocês já entenderam. As turmas dos jovens a pé são os que, perdida a inocência, arrependeram-se de suas faltas.
            Dom Bosco acrescentou ainda que as dez colinas representavam os dez mandamentos da lei de Deus, cuja observância leva à vida eterna.
            Enfim, anunciou que, se fosse necessário, estaria disposto a revelar em particular a alguns jovens o que faziam naquele sonho; se ficaram no vale ou se caíram da carruagem.
            Descido do estrado, o aluno Antônio Ferraris aproximou-se dele e contou, estando nós presentes e entendendo perfeitamente o que ele dizia, como na noite anterior ele sonhou de estar com sua querida mãe, que lhe perguntou se por ocasião da Páscoa viria para casa de férias. Dom Bosco respondeu-lhe que antes da Páscoa estaria no Paraíso. Em seguida o jovem, em confiança, baixinho, falou algumas outras coisas ao ouvido de Dom Bosco. Antônio Ferraris faleceu no dia 16 de março de 1865.
            Colocamos logo por escrito o sonho, e na mesma noite de 22 de outubro de 1864, no final, acrescentamos a seguinte nota: “Eu tenho certeza de que Dom Bosco, pelas suas explicações, procurou encobrir o que o sonho tem de mais surpreendente, pelo menos por alguma circunstância. Aquela dos dez mandamentos não me convence. A oitava colina onde Dom Bosco parou, e se viu no espelho muito mais idoso, eu creio que indique o fim de sua vida, que deveria acontecer depois dos setenta anos. O futuro dirá”.
            Este futuro é agora, tempo que passou e confirmou a nossa opinião. O sonho indicava a Dom Bosco a duração de seu viver. Vamos confrontar com esse o da Roda, que a gente só pôde conhecer alguns anos depois. Os giros da Roda correspondem a uma dezena de anos; e assim, também, parece que tenha o mesmo espaço de tempo o proceder de colina em colina. Cada um das colinas corresponde a dez anos, de modo que elas significam cem anos, o máximo da vida de um homem. Agora, nós vemos Dom Bosco, menino de dez anos, iniciar sua missão entre os colegas dos Becchi e, assim, iniciar sua viagem; percorre todas as sete colinas, isto é, sete dezenas, portanto, a sua idade chega a setenta anos; sobe na oitava colina e aqui faz uma parada: vê casas e campos maravilhosos, isto é, a sua Congregação (Pia Sociedade), tornada grande e cheia de frutos pela infinita bondade de Deus. É ainda longo o caminho a percorrer na oitava colina, e retoma a viagem; mas não chega à nona colina, pois ele acordou. Assim ele não viveu a oitava dezena de anos, vindo a falecer aos 72 anos e cinco meses.
            O que diz o leitor sobre isso? Vou acrescentar que, na noite seguinte, tendo Dom Bosco perguntado nosso parecer sobre o sonho, respondi que o sonho não dizia respeito somente aos jovens, mas indicava a expansão da Congregação (Pia Sociedade) em todo o mundo.
            – Que nada – retrucou um dos nossos irmãos; temos já o Colégio de Mirabello e de Lanzo e talvez vamos ter mais alguns outros no Piemonte. O que quer mais?
            – Não! O sonho nos aponta outros destinos.
            E Dom Bosco aprovava, sorrindo, a nossa certeza.
(MBp VII, 820-826)




O voluntariado missionário transforma a vida dos jovens no México

O voluntariado missionário representa uma experiência que transforma profundamente a vida dos jovens. No México, a Inspetoria Salesiana de Guadalajara desenvolveu, há décadas, um percurso orgânico de Voluntariado Missionário Salesiano (VMS) que continua a impactar de forma duradoura o coração de muitos rapazes e moças. Graças às reflexões de Margarita Aguilar, coordenadora do voluntariado missionário em Guadalajara, compartilharemos o caminho referente às origens, evolução, fases de formação e motivações que levam os jovens a se comprometerem para servir as comunidades no México.

Origens
O voluntariado, entendido como um compromisso em favor do outro nascido da necessidade de ajudar o próximo tanto no plano social quanto no espiritual, fortaleceu-se ao longo do tempo com a contribuição de governos e ONGs para sensibilizar sobre temas como saúde, educação, religião, meio ambiente e outros. Na Congregação Salesiana, o espírito voluntário está presente desde as origens: Mamãe Margarida, ao lado de Dom Bosco, foi uma das primeiras “voluntárias” no Oratório, dedicando-se ao cuidado dos jovens para cumprir a vontade de Deus e contribuir para a salvação de suas almas. Já o Capítulo Geral XXII (1984) começou a falar explicitamente sobre voluntariado, e os capítulos seguintes insistiram nesse compromisso como uma dimensão inseparável da missão salesiana.

No México, os salesianos estão divididos em duas Inspetorias: Cidade do México (MEM) e Guadalajara (MEG). Foi justamente nesta última que, a partir da metade dos anos 80, estruturou-se um projeto de voluntariado juvenil. A Inspetoria de Guadalajara, fundada há 62 anos, oferece há quase 40 anos a possibilidade para jovens desejosos de experimentar o carisma salesiano de dedicar um período de vida ao serviço das comunidades, especialmente nas zonas de fronteira.

Em 24 de outubro de 1987, o inspetor enviou um grupo de quatro jovens junto com salesianos para a cidade de Tijuana, numa zona de fronteira em forte expansão salesiana. Foi o início do Voluntariado Juvenil Salesiano (VJS), que se desenvolveu gradualmente e se organizou de forma cada vez mais estruturada.

O objetivo inicial era proposto a jovens de cerca de 20 anos, disponíveis para dedicar de um a dois anos para construir os primeiros oratórios nas comunidades de Tijuana, Ciudad Juárez, Los Mochis e outras localidades do norte. Muitos lembram os primeiros dias: pá e martelo na mão, convivendo em casas simples com outros voluntários, tardes passadas com crianças, adolescentes e jovens do bairro brincando no terreno onde surgiria o oratório. Às vezes faltava o teto, mas não faltavam a alegria, o senso de família e o encontro com a Eucaristia.

Essas primeiras comunidades de salesianos e voluntários levaram nos corações o amor a Deus, a Maria Auxiliadora e a Dom Bosco, manifestando espírito pioneiro, ardor missionário e cuidado total pelos outros.

Evolução
Com o crescimento da Inspetoria e da Pastoral Juvenil, surgiu a necessidade de itinerários formativos claros para os voluntários. A organização se fortaleceu por meio de:
Questionário de candidatura: cada aspirante a voluntário preenchia uma ficha e respondia a um questionário que delineava suas características humanas, espirituais e salesianas, iniciando o processo de crescimento pessoal.

Curso de formação inicial: oficinas teatrais, jogos e dinâmicas de grupo, catequese e ferramentas práticas para as atividades de campo. Antes da partida, os voluntários se reuniam para concluir a formação e receber o envio nas comunidades salesianas.

Acompanhamento espiritual: convidava-se o candidato a ser acompanhado por um salesiano em sua comunidade de origem. Por um certo período, a preparação foi realizada junto com aspirantes salesianos, fortalecendo o aspecto vocacional, embora essa prática tenha sofrido modificações conforme a animação vocacional da Inspetoria.

Encontro anual da Inspetoria: todos os anos, em dezembro, próximo ao Dia Internacional do Voluntário (5 de dezembro), os voluntários se reúnem para avaliar a experiência, refletir sobre o caminho de cada um e consolidar os processos de acompanhamento.

Visitas às comunidades: a equipe de coordenação visita regularmente as comunidades onde atuam os voluntários, para apoiar não apenas os jovens, mas também salesianos e leigos da comunidade educativo-pastoral, fortalecendo as redes de apoio.

Projeto de vida pessoal: cada candidato elabora, com a ajuda do acompanhante espiritual, um projeto de vida que ajude a integrar a dimensão humana, cristã, salesiana, vocacional e missionária. Prevê-se um período mínimo de seis meses de preparação, com momentos online dedicados às várias dimensões.

Envolvimento das famílias: encontros informativos com os pais sobre os processos do VJS, para fazer compreender o percurso e fortalecer o apoio familiar.

Formação contínua durante a experiência: a cada mês é abordada uma dimensão (humana, espiritual, apostólica etc.) por meio de materiais de leitura, reflexão e trabalho de aprofundamento em andamento.

Pós-voluntariado: após a conclusão da experiência, organiza-se um encontro de encerramento para avaliar a experiência, planejar os passos seguintes e acompanhar o voluntário na reinserção na comunidade de origem e na família, com fases presenciais e online.

Novas etapas e renovações
Recentemente, a experiência passou a se chamar Voluntariado Missionário Salesiano (VMS), em linha com a ênfase da Congregação na dimensão espiritual e missionária. Algumas novidades introduzidas:

Pré-voluntariado breve: durante as férias escolares (dezembro-janeiro, Semana Santa e Páscoa, e especialmente o verão) os jovens podem experimentar por curtos períodos a vida em comunidade e o compromisso de serviço, para ter um primeiro “gosto” da experiência.

Formação para a experiência internacional: foi instituído um processo específico para preparar os voluntários a viver a experiência fora das fronteiras nacionais.

Maior ênfase no acompanhamento espiritual: não mais apenas “enviar para trabalhar”, mas colocar no centro o encontro com Deus, para que o voluntário descubra sua vocação e missão.

Como destaca Margarita Aguilar, coordenadora do VMS em Guadalajara: “Um voluntário precisa ter as mãos vazias para poder abraçar sua missão com fé e esperança em Deus.”

Motivações dos jovens
Na base da experiência VMS está sempre a pergunta: “Qual é a sua motivação para se tornar voluntário?”. Podem ser identificados três grupos principais:

Motivação operacional/prática: quem acredita que realizará atividades concretas ligadas às suas competências (ensinar numa escola, servir em refeitório, animar um oratório). Muitas vezes descobre que o voluntariado não é apenas trabalho manual ou didático e pode ficar desapontado, se esperava uma experiência meramente instrumental.

Motivação ligada ao carisma salesiano: os que já se beneficiaram de obras salesianas e desejam aprofundar e viver mais intensamente o carisma, imaginando uma experiência intensa como um longo encontro festivo do Movimento Juvenil Salesiano, mas por um período prolongado.

Motivação espiritual: quem pretende compartilhar sua experiência de Deus e descobri-lo nos outros. Às vezes, porém, essa “fidelidade” é condicionada por expectativas (ex.: “sim, mas só nesta comunidade” ou “sim, mas se eu puder voltar para um evento familiar”), e é necessário ajudar o voluntário a amadurecer o “sim” de forma livre e generosa.

Três elementos-chave do VMS
A experiência do Voluntariado Missionário Salesiano se articula em três dimensões fundamentais:

Vida espiritual: Deus é o centro. Sem oração, sacramentos e escuta do Espírito, a experiência corre o risco de se reduzir a um simples compromisso operacional, cansando o voluntário até o abandono.

Vida comunitária: a comunhão com os salesianos e com os demais membros da comunidade fortalece a presença do voluntário junto a crianças, adolescentes e jovens. Sem comunidade não há apoio nos momentos de dificuldade nem contexto para crescer juntos.

Vida apostólica: o testemunho alegre e a presença afetiva entre os jovens evangelizam mais do que qualquer atividade formal. Não se trata apenas de “fazer”, mas de “ser” sal e luz no cotidiano.

Para viver plenamente essas três dimensões, é necessário um percurso de formação integral que acompanhe o voluntário do início ao fim, abraçando todos os aspectos da pessoa (humano, espiritual, vocacional) segundo a pedagogia salesiana e o mandato missionário.

O papel da comunidade de acolhida
O voluntário, para ser um instrumento autêntico de evangelização, precisa de uma comunidade que o apoie, sirva de exemplo e guia. Da mesma forma, a comunidade acolhe o voluntário para integrá-lo, apoiando-o nos momentos de fragilidade e ajudando-o a se libertar de vínculos que dificultam a dedicação total. Como destaca Margarita: “Deus nos chamou para ser sal e luz da Terra e muitos dos nossos voluntários encontraram a coragem de pegar um avião deixando para trás a família, os amigos, a cultura, seu modo de viver para escolher esse estilo de vida centrado em ser missionários.”

A comunidade oferece espaços de diálogo, oração comum, acompanhamento prático e emocional, para que o voluntário possa permanecer firme em sua escolha e dar frutos no serviço.

A história do voluntariado missionário salesiano em Guadalajara é um exemplo de como uma experiência pode crescer, se estruturar e se renovar aprendendo com erros e acertos. Colocando sempre no centro a motivação profunda do jovem, a dimensão espiritual e comunitária, oferece um percurso capaz de transformar não apenas as realidades servidas, mas também a vida dos próprios voluntários.
Margarita Aguilar nos diz: “Um voluntário precisa ter as mãos vazias para poder abraçar sua missão com fé e esperança em Deus.”

Agradecemos a Margarita por suas preciosas reflexões: seu testemunho nos lembra que o voluntariado missionário não é um mero serviço, mas um caminho de fé e crescimento que toca a vida dos jovens e das comunidades, renovando a esperança e o desejo de se doar por amor a Deus e ao próximo.




Visita à Basílica do Sagrado Coração de Jesus em Roma (também em 3D)

A Basílica do Sagrado Coração de Jesus em Roma é uma igreja de grande importância para a cidade, localizada no bairro Castro Pretório, na via Marsala, do outro lado da rua da Estação Términi. Ela é sede paroquial e também título cardinalício, tendo ao lado a Sede Central da Congregação Salesiana. Celebra sua festa patronal justamente na solenidade do Sagrado Coração. Sua posição próxima à Estação Términi a torna um ponto visível e reconhecível para quem chega à cidade, com a estátua dourada no campanário que se destaca no horizonte como símbolo de bênção para moradores e viajantes.

Origens e história
A ideia de construir uma igreja dedicada ao Sagrado Coração de Jesus remonta ao papa Pio IX, que em 1870 colocou a primeira pedra de um edifício, inicialmente desejado em honra a São José; no entanto, já em 1871 o pontífice decidiu dedicar a nova igreja ao Sagrado Coração de Jesus. Foi a segunda grande igreja dedicada ao Sagrado Coração de Jesus após a de Lisboa, Portugal, iniciada em 1779 e consagrada em 1789, e antes da famosa Sacré-Cœur de [Sagrado Coração] de Montmartre, Paris, França, iniciada em 1875 e consagrada em 1919.
A obra começou em condições difíceis: com a anexação de Roma ao Reino da Itália (1870), os trabalhos foram interrompidos por falta de fundos. Foi somente graças à intervenção de São João Bosco, a convite do pontífice, que a construção pôde ser retomada definitivamente em 1880, graças ao seu esforço sacrificado de arrecadar doações na Europa e reunir recursos para a conclusão do edifício. O arquiteto encarregado foi Francesco Vespignani, “Arquiteto dos Sacros Palácios” sob Leão XIII, que completou o projeto. A consagração ocorreu em 14 de maio de 1887, marcando o fim da primeira fase construtiva.

Desde sua construção, a igreja assumiu uma função paroquial: a paróquia do Sagrado Coração de Jesus em Castro Pretório foi instituída em 2 de fevereiro de 1879 com decreto vicarial “Postremis hisce temporibus” [Nestes últimos tempos]. Posteriormente, o papa Bento XV elevou-a à dignidade de basílica menor em 11 de fevereiro de 1921, com a carta apostólica “Pia societas” [Pia sociedade]. Em época mais recente, em 5 de fevereiro de 1965, o papa Paulo VI instituiu o título cardinalício do Sagrado Coração de Jesus em Castro Pretório. Entre os cardeais titulares destacam-se Maximilien de Fürstenberg (1967–1988), Giovanni Saldarini (1991–2011) e Giuseppe Versaldi (desde 2012 até hoje). O título cardinalício reforça o vínculo da basílica com a Cúria papal, contribuindo para manter viva a atenção sobre a importância do culto ao Sagrado Coração e sobre a espiritualidade salesiana.

Arquitetura
A fachada apresenta-se em estilo neorrenascentista, com linhas sóbrias e proporções equilibradas, típicas da retomada renascentista na arquitetura eclesiástica do final do século XIX. O campanário, concebido no projeto original de Vespignani, permaneceu incompleto até 1931, quando foi colocada no topo a imponente estátua dourada do Sagrado Coração abençoando, doada pelos ex-alunos salesianos na Argentina: visível de longa distância, constitui um sinal identificador da basílica e um símbolo de acolhimento para quem chega a Roma pela estação ferroviária próxima.

O interior é organizado segundo uma planta em cruz latina com três naves, separadas por oito colunas e dois pilares de granito cinza que sustentam arcos de meio ponto, incluindo transepto e cúpula central. A nave central e as naves laterais são cobertas por teto em caixotões, com lacunas decoradas no registro central. As proporções internas são harmoniosas: a largura da nave central de cerca de 14 metros e o comprimento de 70 metros criam um efeito de amplitude solene, enquanto as colunas de granito, com veios marcados, conferem um caráter de sólida majestade.
A cúpula central, visível do interior com seus afrescos e lacunas, capta a luz natural através de janelas na base e confere verticalidade ao espaço litúrgico. Nas capelas laterais conservam-se pinturas do pintor romano Andrea Cherubini, que realizou cenas devocionais em sintonia com a dedicação ao Sagrado Coração.
Além das pinturas de Andrea Cherubini, a basílica conserva várias obras de arte sacra: estátuas de madeira ou mármore que representam a Virgem, os santos padroeiros da Congregação Salesiana e figuras carismáticas como São João Bosco.

Os ambientes de São João Bosco em Roma
Um elemento de grande valor histórico e devocional é constituído pelos “Aposentos de Dom Bosco” nos fundos da basílica, ambiente onde São João Bosco ficou hospedado em nove das vinte vezes que esteve em Roma. Originalmente dois cômodos separados – escritório e quarto com altar portátil –, foram depois unidos para acolher peregrinos e grupos em oração, constituindo um local de memória viva da presença do fundador dos Salesianos. Aqui são conservados objetos pessoais e relíquias que remetem a milagres atribuídos ao santo naquele período. Este espaço foi recentemente renovado e continua a atrair peregrinos, estimulando reflexões sobre a espiritualidade e a dedicação de Bosco aos jovens.
A basílica e os edifícios anexos são propriedade da Congregação Salesiana, que fez deles um dos centros nevrálgicos para sua presença romana: desde a estadia de Dom Bosco, o edifício ao lado da igreja abrigava a casa dos Salesianos e posteriormente tornou-se sede de escolas, oratórios e serviços para jovens. Hoje a estrutura acolhe, além das atividades litúrgicas, um trabalho significativo voltado a migrantes e jovens em dificuldade. Desde 2017, o complexo é também a Sede Central do governo da Congregação Salesiana.

Devoção ao Sagrado Coração e celebrações litúrgicas
A dedicação ao Sagrado Coração de Jesus se traduz em práticas devocionais específicas: a festa litúrgica do Sagrado Coração, celebrada na sexta-feira seguinte à oitava de Corpus Christi, é vivida com solenidade na basílica, com novenas, celebrações eucarísticas, adoração eucarística e procissão. A piedade popular em torno do Sagrado Coração – difundida principalmente desde o século XIX com a aprovação da devoção por Pio IX e Leão XIII – encontra neste lugar um ponto de referência em Roma, atraindo fiéis para orações de reparação, consagração e agradecimento.

Para o Jubileu de 2025, à Basílica do Sagrado Coração de Jesus foi concedido o privilégio da indulgência plenária, como a todas as outras igrejas do Iter Europaeum.
Lembramos que, para celebrar o 50º aniversário das relações diplomáticas entre a União Europeia e a Santa Sé (1970-2020), foi realizado um projeto da Delegação da União Europeia junto à Santa Sé e as 28 Embaixadas dos Estados-membros acreditadas junto à Santa Sé. Este projeto consistia em um percurso litúrgico e cultural no qual cada país indicava uma igreja ou basílica de Roma à qual está particularmente ligado por motivos históricos, artísticos ou de tradição de acolhimento dos peregrinos provenientes daquele país. O objetivo principal era duplo: por um lado, favorecer o conhecimento mútuo entre os cidadãos europeus e estimular uma reflexão sobre as raízes cristãs comuns; por outro, oferecer a peregrinos e visitantes uma ferramenta para descobrir espaços religiosos menos conhecidos ou com significados particulares, evidenciando as conexões da Igreja com toda a Europa. Ampliando a perspectiva, a iniciativa foi então reapresentada no âmbito dos caminhos jubilares ligados ao Jubileu de Roma 2025, com o nome latino “Iter Europaeum”, inserindo o percurso entre os caminhos oficiais da Cidade Santa.
Iter Europaeum prevê paradas nas 28 igrejas e basílicas de Roma, cada uma “adotada” por um Estado-membro da União Europeia. A Basílica do Sagrado Coração de Jesus foi “adotada” por Luxemburgo. As igrejas do Iter Europaeum podem ser vistas AQUI.

Visita à Basílica
A Basílica pode ser visitada fisicamente, mas também virtualmente.

Para uma visita virtual em 3D clique AQUI.

Para uma visita virtual guiada, você pode seguir os seguintes links:

1. Introdução
2. A história
3. Fachada
4. Campanário
5. Nave central
6. Parede interna da fachada
7. Piso
8. Colunas
9. Paredes da nave central
10. Teto 1
11. Teto 2
12. Transepto
13. Vitrais do transepto
14. Altar-mor
15. Presbitério
16. Cúpula
17. Coro Dom Bosco
18. Naves laterais
19. Confessionários
20. Altares da nave lateral direita
21. Afrescos das naves laterais
22. Cúpulas pequenas da nave esquerda
23. Batistério
24. Altares da nave lateral esquerda
25. Afrescos das cúpulas pequenas da nave esquerda
26. Sacristia
27. “Aposentos” de Dom Bosco (versão anterior)
28. Museu de Dom Bosco (versão anterior)

A Basílica do Sagrado Coração de Jesus no Castro Pretório é um exemplo de arquitetura neorrenascentista ligada a eventos históricos marcados por crises e renascimentos. A combinação de elementos artísticos, arquitetônicos e históricos – desde as colunas de granito às decorações pictóricas, da célebre estátua no campanário aos Aposentos de Dom Bosco – torna este lugar um destino de peregrinação espiritual e cultural. Sua localização próxima à Estação Términi faz dela um sinal de acolhimento para quem chega a Roma, enquanto as atividades pastorais voltadas aos jovens continuam a encarnar o espírito de São João Bosco: um coração aberto ao serviço, à formação e à espiritualidade encarnada. Vale a visita.




Devoção de Dom Bosco ao Sagrado Coração de Jesus

A devoção ao Sagrado Coração de Jesus, tão querida a Dom Bosco, nasceu das revelações feitas a Santa Margarida Maria Alacoque no mosteiro de Paray-le-Monial: Cristo, mostrando seu Coração transpassado e coroado de espinhos, pediu uma festa reparadora na sexta-feira após a Oitava do Corpus Christi. Apesar das oposições, o culto se difundiu porque aquele Coração, sede do amor divino, lembra a caridade manifestada na cruz e na Eucaristia. Dom Bosco convida os jovens a honrá-lo constantemente, especialmente no mês de junho, recitando a Coroinha e realizando atos de reparação que obtêm indulgências abundantes e as doze promessas de paz, misericórdia e santidade.


            A devoção ao Sagrado Coração de Jesus, que cresce a cada dia, ouçam, ó queridos jovens, como teve origem. Vivendo na França, no mosteiro da Visitação de Paray-le-Monial, havia uma humilde virgem chamada Margarida Alacoque, querida por Deus por sua grande pureza. Um dia, enquanto ela estava diante do Santíssimo Sacramento para adorar o bendito Jesus, viu o seu Esposo Celestial no ato de descobrir o peito e mostrar-lhe o seu Sagrado Coração, resplandecente de chamas, cercado de espinhos, transpassado por uma ferida e encimado por uma cruz. Ao mesmo tempo, ouviu-o queixar-se da monstruosa ingratidão dos homens e ordenar-lhe que se empenhasse para que, na sexta-feira após a Oitava do Corpus Christi, fosse prestado um culto especial ao seu Divino Coração, em reparação das ofensas que Ele recebe na Santíssima Eucaristia. A piedosa virgem, cheia de confusão, expôs a Jesus o quanto era incapaz de realizar uma tarefa tão grande, mas foi consolada pelo Senhor para continuar sua obra, e a festa do Sagrado Coração de Jesus foi estabelecida, apesar da viva oposição de seus adversários.
            Os motivos para este culto são múltiplos: 1º Porque Jesus Cristo nos ofereceu o seu Sagrado Coração como sede dos seus afetos; 2º Porque é símbolo da imensa caridade que Ele demonstrou especialmente ao permitir que o seu Sagrado Coração fosse ferido por uma lança; 3º Para que deste Coração os fiéis sejam movidos a meditar as dores de Jesus Cristo e a professar-lhe gratidão.
            Honremos, portanto, constantemente este Divino Coração, que pelos muitos e grandes benefícios que já nos concedeu e nos concederá, merece toda a nossa mais humilde e amorosa veneração.

Mês de junho
            Quem consagrar todo o mês de junho em honra do Sagrado Coração de Jesus com alguma oração diária ou devoção, ganhará 7 anos de indulgência por cada dia e indulgência plenária no final do mês.

Coroinha ao Sagrado Coração de Jesus
            Recitem esta Coroinha ao Divino Coração de Jesus Cristo para reparar as ofensas que Ele recebe na Santíssima Eucaristia dos infiéis, dos hereges e dos maus cristãos. Recite-a sozinho ou com outras pessoas reunidas, se possível diante da imagem do Divino Coração ou diante do Santíssimo Sacramento:
            V. Deus, in adjutorium meum intende (Vinde, ó Deus, em meu auxílio).
            R. Domine ad adjuvandum me festina (Socorrei-me sem demora).
            Glória ao Pai… etc.

            1. Ó amabilíssimo Coração de meu Jesus, adoro humildemente a vossa dulcíssima ternura, que usais de modo singular no Divino Sacramento para com as almas ainda mesmo pecadoras. Sinto imenso em ver que sois tão ingratamente correspondido, e proponho desagravar-vos de tantas ofensas que recebeis na Santíssima Eucaristia dos hereges, dos infiéis e dos maus cristãos.
            Pai nosso, Ave Maria e Glória.

            2. Ó Coração tão humilde do meu Jesus sacramentado, adoro reverente a vossa profunda humildade na divina Eucaristia, escondendo-vos por nosso amor sob as espécies de pão e de vinho. Por piedade, meu Jesus, peço-vos queirais infundir no meu coração tão bela virtude; e entretanto procurarei desagravar-vos de tantas ofensas que recebeis no Santíssimo Sacramento, dos hereges, dos infiéis e dos maus cristãos.
            Pai nosso, Ave Maria e Glória.

            3. Ó Coração de meu Jesus, tão sequioso de padecer, adoro os vossos ardentíssimos desejos de sofrer tão dolorosa paixão e sujeitar-vos às injustiças que prevíeis no Santíssimo Sacramento. Ah! meu Jesus, de todo o coração proponho repará-las, mesmo com a minha vida; quisera impedir as ofensas que infelizmente recebeis na Divina Eucaristia dos hereges, dos infiéis e dos maus cristãos.
            Pai nosso, Ave Maria e Glória.

            4. Ó Coração pacientíssimo de meu Jesus, venero humildemente a vossa invencível paciência em sofrer por meu amor tantas penas na cruz e tantos desprezos na divina Eucaristia, ó meu querido Jesus! Já que não posso lavar com o meu sangue os lugares em que fostes tão maltratado num e noutro mistério, prometo-vos, meu sumo bem, empregar todos os meios para desagravar o vosso divino Coração de tantos ultrajes, que recebeis na Santíssima Eucaristia dos hereges, dos infiéis e dos maus cristãos.
            Pai nosso, Ave Maria e Glória.

            5. Ó Coração de meu Jesus, amantíssimo de nossas almas na admirável instituição da Santíssima Eucaristia, adoro humildemente o imenso amor que tendes para conosco, dando-nos como alimento o vosso divino corpo e o vosso divino sangue. Qual o coração que deixará de comover-se à vista de tamanha caridade? Oh meu bom Jesus! Dai-me abundantes lágrimas para chorar e reparar tantas ofensas que recebeis na Santíssima Eucaristia dos hereges, dos infiéis e dos maus cristãos.
            Pai nosso, Ave Maria e Glória.

            6. Ó Coração de meu Jesus, sequioso de nossa salvação, venero humildemente o amor que vos impeliu a realizar o sacrifício inefável da cruz e a renová-lo todos os dias sobre os altares na santa missa. Será possível que, à vista de tanto amor, o coração humano não arda de gratidão? Sim, infelizmente é possível, meu Deus; mas prometo fazer para o futuro tudo o que puder a fim de reparar tantos ultrajes que recebeis neste mistério de amor, dos hereges, dos infiéis e dos maus cristãos.
            Pai nosso, Ave Maria e Glória.

            Quem recitar apenas as seis orações acima mencionadas Pai nosso, Ave Maria e Glória, diante do Santíssimo Sacramento, sendo que o último Pai nosso, Ave Maria e Glória seja rezado segundo a intenção do Sumo Pontífice, ganhará 300 dias de indulgência cada vez.

Promessas feitas por Jesus Cristo
à bem-aventurada Margarida Alacoque para os devotos do seu Divino Coração
            1 – Darei às almas dedicadas ao meu Coração todas as graças necessárias ao seu estado de vida.
            2 – Estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias.
            3 – Consolá-las-ei em todas as suas aflições.
            4 – Serei seu refúgio seguro na vida e, sobretudo, na hora da morte.
            5 – Derramarei abundantes bênçãos sobre todas as suas empresas.
            6 – Os pecadores encontrarão em meu Coração a fonte e o oceano infinito de misericórdia.
            7 – As almas tíbias tornar-se-ão fervorosas.
            8 – As almas fervorosas elevar-se-ão rapidamente a uma grande perfeição.
            9 – Abençoarei as casas em que a imagem do meu Sagrado Coração for exposta e venerada.
            10 – Darei aos sacerdotes o dom de tocar os corações mais endurecidos.
            11 – As pessoas que propagarem esta devoção terão os seus nomes escritos no meu Coração e dele nunca serão apagados.

Ato de reparação contra as blasfêmias.
            Bendito seja Deus.
            Bendito seja o seu Santo Nome.
            Bendito seja Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem.
            Bendito seja o Nome de Jesus.
            Bendito seja Jesus no Santíssimo Sacramento do Altar.
            Bendito seja o seu Amabilíssimo Coração.
            Bendita seja a grande Mãe de Deus, Maria Santíssima.
            Bendito seja o Nome de Maria, Virgem e Mãe.
            Bendita seja a sua Santa e Imaculada Conceição.
            Bendito seja Deus nos seus Anjos e nos seus Santos.

            É concedida Indulgência de um ano em cada vez: e Plenária a quem a recitar durante um mês, no dia em que fizer a Santa Confissão e a Comunhão.

Oferta ao Sagrado Coração de Jesus diante da sua santa imagem
            Eu N. N. para vos ser grato e para reparar as minhas infidelidades, dou-vos o meu coração e consagro-me inteiramente a Vós, meu amável Jesus, e com a vossa ajuda proponho não pecar mais.

            O Pontífice Pio VII concedeu cem dias de indulgência uma vez por dia, recitando-a com coração contrito, e plenária uma vez por mês, a quem a recitar todos os dias.

Oração ao Sagrado Coração de Maria
            Ave, augustíssima rainha da paz, Mãe de Deus; pelo sacratíssimo Coração de vosso Filho Jesus, príncipe da paz, fazei que se aplaque a sua ira e reine sobre nós em paz. Lembrai-vos, ó piíssima Virgem Maria, de que nunca se ouviu dizer que por vós seja abandonado quem implora os vossos favores. Animado eu de tal confiança, a vós recorro: ó Mãe do Verbo, não desprezeis as minhas súplicas, mas ouvi-as propícia e atendei-me, ó clemente, ó piedosa Virgem Maria.

            Pio IX concedeu a indulgência de 300 dias cada vez que esta oração for recitada com devoção, e indulgência plenária uma vez por mês àqueles que a recitarem todos os dias.

            Ó Jesus de amor ferido,
            nunca houvera tão ofendido!
            Ó meu doce e bom Jesus,
            nunca te pregue na cruz.
            Sagrado Coração de Maria,
            Fazei que eu salve a minha alma.
            Sagrado Coração do meu Jesus,
            Fazei que eu vos ame cada vez mais.

            A vós dou o meu coração,
            Mãe do meu Jesus – Mãe de amor.

(Fonte: “Il Giovane Provveduto per la pratica de’ suoi doveri negli esercizi di cristiana pietà per la recita dell’Uffizio della b. Vergine dei vespri di tutto l’anno e dell’uffizio dei morti coll’aggiunta di una scelta di laudi sacre, pel sac. Giovanni Bosco, 101ª edição, Turim, 1885, Tipografia e Libreria Salesiana, S. Benigno Canavese – S. Per d’Arena – Lucca – Nizza Marittima – Marselha – Montevidéu – Buenos Aires”, pp. 119-124 [Obras Publicadas, pp. 247-253])

INSTITUTO HISTÓRICO SALESIANO. Fontes Salesianas: Dom Bosco e sua obra. Tradução de Dom Hilário Moser. Brasília, EDB, 2015, 1421p., p.741-744 (Coletânea Antológica. V. 1)

Foto: Estátua do Sagrado Coração em bronze dourado no campanário da Basílica do Sagrado Coração em Roma, presente dos ex-alunos salesianos da Argentina. Erguida em 1931, é uma obra realizada em Milão por Riccardo Politi, com projeto do escultor Enrico Cattaneo, de Turim.