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Para São João Bosco, a devoção a Nossa Senhora não era um simples sentimento religioso acessório, mas um caminho seguro para a santidade, uma ajuda cotidiana na luta espiritual, uma escola de vida cristã. Toda a sua pedagogia nascia e florescia à luz maternal de Maria. “Aos seus alunos – atesta o P. Rua – pode-se dizer que ele não sabia falar sem recomendar a devoção à Maria Santíssima; e especialmente, para ensiná‑los a conservar a pureza, recomendava vivamente a devoção a Ela”. Em suas “alocuções” da noite, momento precioso de familiaridade educativa, voltava sempre a esse ponto: permanecer na graça de Deus e amar Maria.
Dom Bosco gostava de traduzir a fé em gestos concretos e simples. Para ele, a devoção não se improvisa: educa‑se, cultiva‑se, exercita‑se. Por isso, durante as novenas em preparação às festas marianas e durante os meses marianos, propunha aos jovens as célebres florezinhas (“fioretti”), pequenos atos de amor ou de sacrifício para oferecer a Nossa Senhora todos os dias. Não se tratava de fórmulas mágicas, mas de passos cotidianos para aprender a vida interior, crescer nas virtudes, educar o coração e orientá‑lo para o bem.
O salesiano P. João Batista Lemoyne reuniu uma série dessas florezinhas, atribuindo‑os à tradição viva do Oratório: algumas foram ditadas pelo próprio Dom Bosco, outras colhidas de suas palavras. Aquelas florezinhas, “postas nos lábios de Maria Santíssima”, nos oferecem ainda hoje uma espiritualidade simples, afetuosa, encarnada na vida.
Reproduzimos integralmente essa preciosa coletânea:
1. Eu sou sua mãe; ao longo do dia ofereça‑me o seu coração.
2. Quando ouvir tocar as horas, diga baixinho ou em pensamento: Ave, Maria, doçura e esperança minha!
3. Junto com o meu nome, invoque amiúde o de Jesus, meu Filho!
4. Beije amiúde a minha medalha, ao menos pela manhã e à noite.
5. Saúde minhas imagens pelo caminho, vencendo qualquer respeito humano.
6. Arrume uma bela imagem minha, e olhando‑a, beije‑a com frequência.
7. Saúde‑me amiúde, de coração; e terá o meu amor!
8. Arrume e leia algum livro, que fale de mim e do meu amor!
9. Escreva nos seus livros e no seu coração o meu nome!
10. Por meu amor seja humilde, paciente e piedoso.
11. Obedeça sem hesitar; assim fazia eu em minha casa e no templo.
12. Tendo oportunidade, ceda à opinião dos outros, para me agradar.
13. Orando, fique sempre com as mãos juntas ao peito.
14. Aumente com a sua palavra o número dos meus devotos.
15. Todo sábado pratique alguma mortificação em minha honra.
16. Todo sábado recite minhas ladainhas para obter uma boa morte.
17. Todo sábado procure fazer a Santa Comunhão em minha honra.
18. Faça amiúde a Santa Comunhão, especialmente nas minhas festas.
19. Quando fizer a Santa Comunhão, recomende‑me amiúde os pecadores.
20. Quando fizer a Santa Comunhão, recomende‑se a mim para obter a pureza e a caridade!
21. Ah! meu querido filho, não cometa nunca um pecado mortal!
22. Desde agora, com a palavra e o exemplo, prometa impedir o mal.
23. Se quer fazer‑me um grade favor, recomende‑me amiúde os pecadores.
24. Fuja dos companheiros dissipados e pouco devotos.
25. Se ouve blasfemar, diga logo no coração: Louvado seja o nome de Jesus e de Maria.
26. Se alguém o ofende, não se vingue; perdoe-o por meu amor!
27. A murmuração me desagrada; e você não a faça e não a escute.
28. Ao invés de reclamar dos desgostos, aceite‑os de boa vontade por mim.
29. Nas penas e aflições dirija o olhar a mim, sua mãe!
30. Quando lhe é imposto algo de que não gosta, diga logo: – Sim, por amor a Maria!
31. Fuja dos espetáculos do mundo, e ame o retiro.
32. Seja o pacificador dos seus colegas.
33. Oh! como ficaria feliz, se você se confessasse a cada oito dias!
34. Muita confiança em seu confessor ordinário, e não o mude sem necessidade.
35. Tenha sempre presente os conselhos do confessor, e coloque‑os em prática.
36. No tempo das férias, não deixe passar quinze dias sem confessar-se.
37. Durante as férias frequente regularmente a igreja para dar bom exemplo.
38. Ame e respeite os sacerdotes; eu também amava e respeitava os Apóstolos.
39. Seja reconhecido e respeitoso com quem o beneficia na alma e no corpo.
40. Reserve alguma coisinha para dá‑la aos pobres por meu amor.
41. Você é o meu jardim; cultive as flores mais belas.
42. Com suas virtudes seja o paraíso do meu Divino Filho!
43. A sua virtude predileta seja a virtude angélica: a castidade!
44. Nas tentações mais feias diga logo: Mater purissima, ora pro me! [Mãe puríssima, rogai por mim!].
45. Não dê nunca maus olhares.
46. Não leia nunca livros perigosos; e antes de ler um livro que não conhece, pergunte ao confessor.
47. Use grande modéstia ao despir‑se e ao vestir‑se.
48. Não faça nem ouça nunca conversas escandalosas ou mundanas.
49. Não profira, nem mesmo por brincadeira, uma palavra que possa ocasionar maus pensamentos.
50. Não fale com pessoas perigosas, se quer que eu fale ao seu coração.
51. Se quer ser meu benjamim, ame o Menino Jesus.
52. Ame‑me muito! Quero fazê-lo santo!
(MB X, 43‑44)
As cinquenta e duas florezinhas recolhidas de Dom Bosco constituem um verdadeiro itinerário espiritual, apresentado pela própria voz da Nossa Senhora que se dirige aos seus filhos com ternura maternal. Cada florzinha é um convite concreto, prático, acessível também aos mais jovens.
Parte‑se dos gestos mais simples: oferecer o coração a Maria durante o dia, invocar os nomes de Jesus e Maria, beijar a medalha, saudar as imagens sagradas na rua. São atos que exigem pouco tempo, mas que tecem no cotidiano uma relação viva e pessoal com a Mãe celeste.
As florezinhas tocam depois dimensões mais profundas da vida cristã: humildade, paciência, obediência, perdão, pureza. A própria Virgem Maria torna‑se mestra, lembrando o seu exemplo: “Obedeça sem hesitar; assim eu fazia em minha casa e no templo”. A referência à vida concreta da Nossa Senhora em Nazaré e no Templo torna esses conselhos ainda mais críveis e imitáveis.
Dom Bosco dava particular atenção à virtude da pureza, que chamava de “virtude angélica”. Muitas florezinhas tratam da guarda dos olhos, da modéstia, da fuga das ocasiões perigosas, da invocação confiante: “Mater purissima, ora pro me!”.
O aspecto mais fascinante desta coletânea é a modalidade pedagógica com que Dom Bosco a propunha. As florezinhas eram expostas num quadro numerado, tendo ao lado uma caixinha contendo os números correspondentes. Durante as novenas e no mês de maio, cada jovem podia sortear diariamente um número, ler a florzinha e acolhê‑la como uma mensagem pessoal da Nossa Senhora justamente para ele, naquele dia específico.
Esse método transformava a devoção em uma experiência pessoal e entusiasmante. Não era a monotonia de uma prática repetitiva, mas a surpresa quotidiana de um encontro, a alegria de sentir‑se chamado pelo nome pela Mãe celeste.
Hoje essas florezinhas mantêm intacta a sua força espiritual. Em uma época em que a dispersão e a superficialidade correm o risco de fragmentar a existência, elas oferecem pequenos gestos concretos para permanecer ancorados no que realmente importa. São sementes de santidade ao alcance de todos, jovens e adultos, que a própria Virgem Maria nos convida a cultivar no jardim do nosso coração.
Como dizia a última florzinha, com aquela ternura que é o selo do amor maternal: “Ama‑me muito! Quero fazê-lo santo!”