Entrevista com o P. Klement VÁCLAV, novo Inspetor da África Austral (AFM)

O Pe. Václav Klement ocupou vários cargos no Conselho Geral: Conselheiro para a Região Ásia Leste-Oceania (2002-2008), Conselheiro Geral para as Missões (2008-2014), Conselheiro para a Região Ásia Leste-Oceania (2014-2020) e Visitador Extraordinário “ad nutum et pro tempore” (2020-2022). Em dezembro de 2022, o Reitor-Mor, P. Ángel Fernández Artime, com o consentimento do Conselho Geral, nomeou-o novo Superior do Visitatório da África Austral para o sexênio 2023-2029. A seguir, a entrevista concedida por ocasião de sua nova nomeação.

1.Fale-nos um pouco de seus antecedentes e origens familiares.
Dou graças a Deus por minha família de origem humilde, mas de fé profunda, crescendo com três irmãos mais novos, um pai trabalhador e uma mãe ternamente amorosa. Ambos os pais cresceram no grupo de jovens da mesma paróquia e são conhecidos por seu compromisso vitalício de educar os jovens em seu tempo livre. Nossa vibrante paróquia, com muitos sacerdotes diocesanos notáveis depois do Concílio Vaticano II, era uma escola de fé vivida diariamente em ação, especialmente no contexto da educação ateísta em todas as escolas públicas que frequentei na Checoslováquia até os 26 anos de idade. Não é fácil imaginar a perseguição que durou 40 anos, com todos os 15.000 religiosos e religiosas desaparecidos, suas obras de missão destruídas e chamados a oferecer seu carisma na clandestinidade. Só depois da queda do regime comunista é que soube que meu tio, operário, que vivia na mesma pequena casa, era também um religioso, bispo da Igreja clandestina.

2. O que o atraiu e o fez escolher a vida religiosa, sobretudo a vida consagrada salesiana? Quais foram os salesianos que mais o influenciaram?

Eu diria que minhas aspirações, meus sonhos e minha preparação pessoal foram “simplesmente” desencadeados pelo primeiro convite explícito para participar da primeira reunião vocacional clandestina salesiana “Venha e veja”. Fiquei profundamente tocado, espantado, atraído por todos aqueles salesianos idosos que souberam transmitir a vocação e o carisma salesiano depois de anos de prisão, de trabalhos forçados e de sacrifício da vida. Não posso esquecer meu primeiro encontro com o “Boletim Salesiano”, as histórias dos santos da Família Salesiana e, sobretudo, o ambiente da espiritualidade salesiana: espírito de família, impulso apostólico e fé profunda. Como não havia “estruturas oficiais de formação” até 1989, o carisma salesiano foi transmitido através de um acompanhamento espiritual personalizado e fechado. Não apenas um mestre de noviços, mas três salesianos cuidaram deles durante aquele ano especial! Hoje os salesianos de Dom Bosco são a maior congregação religiosa masculina da República Tcheca.

3. O que fazia antes de entrar na vida religiosa?
Na verdade, para mim “entrar na vida religiosa” não era o mesmo que “entrar na casa salesiana”. Durante aqueles tempos “abençoados” do regime totalitário comunista, havia 400 salesianos em meu país, mas nenhuma casa salesiana “oficial”. A metade dos salesianos vivia e trabalhava escondida, enquanto outra metade estava envolvida com as estruturas diocesanas da Igreja. Em minha animada paróquia natal (a segunda cidade tcheca de Brno), desde criança, estive envolvido em muitos serviços como acólito, escoteiro, membro do coro, voluntário ou animador. Aos dez anos de idade tinha em minhas mãos a biografia de Dom Bosco pela primeira vez, mas só conheci o primeiro salesiano vivo aos 22 anos de idade, ao término de dois anos de serviço militar. Aqueles anos “antes” de ser salesiano foram um tempo de estudo duro, de trabalho duro na paróquia, como líder juvenil de várias maneiras, enquanto eu vivia como um cidadão de segunda classe, sendo um jovem católico fervoroso.

4. Depois de tantos anos de vida consagrada salesiana, como resumiria sua vida como padre salesiano até agora?
Aos 65 anos de idade, provavelmente já se chegou a um ponto em que se pode “resumir” a própria vida, não é mesmo? É difícil dizer em poucas palavras. Meu lema de vida mudou com o passar dos anos e, desde 2008, tenho mantido a versão asiática do Da mihi animas, cetera tolle: Todos por Jesus, Jesus por todos! Significa viver com entusiasmo, alegria e paixão todas as tarefas e missões da minha vida. Nos últimos vinte anos ao lado do Reitor-Mor nunca “olhei para trás”, procurando sempre contribuir para o crescimento do carisma salesiano com o melhor de minhas forças. Pois bem, a vida começa aos 65 anos!

5. Gostaria de compartilhar conosco o acontecimento mais memorável de sua vida como salesiano de Dom Bosco?
Bem, guardo demasiadas recordações salesianas. Em primeiro lugar, o período de formação clandestina na Tchecoslováquia, como a caminhada de 24 horas nas montanhas para chegar a uma reunião provincial secreta de um dia, ou ouvir as histórias de Irmãos que passaram anos em prisões e campos de trabalhos forçados. Realmente, é muito difícil indicar o evento “mais memorável”: todos os dias durante os 16 anos na Coreia foram um momento especial, depois como primeiro conselheiro regional para a Ásia Oriental – Oceania (EAO) foi provavelmente nossa primeira visita de equipe (2005) com o seminário Visão-Missão ou o Congresso dos Irmãos Salesianos da EAO no Vietnã (2018). Há demasiados acontecimentos pelos quais agradeço a Deus ao longo de minha vida. Nunca é suficiente contar e agradecer essas histórias e esses eventos! Se tiver acesso ao boletim “AustraLasia” da EAO (Ásia Oriental-Oceania , East Asia-Oceania) no site www.bosco.link, saberá um pouco mais!

6. O senhor tem algum arrependimento na vida?
Sim, meus arrependimentos são sempre da mesma natureza. No final do dia (depois de um acontecimento, de uma missão apostólica, de uma tarefa confiada), lamento não ter dedicado todo o meu coração a essa tarefa ou missão. Em termos concretos, não escutei suficientemente o Irmão ou os parceiros leigos da missão, não dei o melhor de mim ao processo em andamento (talvez um discernimento, uma preparação para um acontecimento regional).

7. Que conselho daria a um jovem que estivesse considerando a vida religiosa? Que mensagem gostaria de enviar aos jovens sobre a vocação missionária?
Gostaria de se consagrar a Deus? Gostaria de seguir Jesus como Dom Bosco e sua família? Entregue seu coração completamente a Jesus! – Gostaria de compartilhar esse convite de Dom Bosco na linguagem dos jovens para que se sintam atraídos por esse estilo de vida de “tornar-se pão para os outros”.
Quer ser profundamente feliz? Partilhe sua fé com aqueles que não têm o privilégio de encontrar Jesus face a face! Nos últimos 30 anos me encontrei com a maior parte dos 14.000 salesianos e descobri que os mais felizes entre eles são geralmente os missionários que deixaram tudo, seu país e sua cultura, para serem a luz de Jesus como missionários! Sem a partilha da fé, a Igreja deixaria de respirar.

8. Quando soube que havia sido nomeado Inspetor, qual foi sua reação?

Sim, foi uma grande surpresa e um tanto chocante. Apenas dois dias antes do Natal de 2022, já preparado para outra visita extraordinária, desta vez ao Sul da Ásia, fui chamado pelo Reitor-Mor. O Padre Ángel me pediu que aceitasse essa nova e inesperada obediência. Em toda a minha vida, nunca disse “não” a Dom Bosco. Desde que essa nova chamada aconteceu em Valdocco, tive tempo de digerir essa dramática mudança em minha vida e de rezar por cada um dos Irmãos da AFM (África Austral, Africa Meridionale) no primeiro dia. No dia 1º de janeiro de 2023, fui em peregrinação a pé de Valdocco até os Becchi, para pedir a Dom Bosco que nos abençoasse a todos na AFM!

Esse chamado não foi muito diferente daquele de 1996, quando o Padre Juan E. Vecchi me procurou por telefone nas Filipinas, durante um congresso regional dos Salesianos Cooperadores da Ásia Oriental – Oceania. Foi um choque esmagador, que me manteve acordado a noite toda; foi totalmente inesperado, já que eu nem sequer era membro do conselho inspetorial e tinha acabado de chegar à Coreia, dez anos antes desse novo chamado.

9. Que qualidades de liderança o senhor acha que leva para seu novo cargo de inspetor?
Tenho o prazer de compartilhar com meus irmãos salesianos, parceiros leigos missionários, membros da Juventude Salesiana e da Família Salesiana minha vida, minha fé e minhas convicções salesianas para os próximos seis anos. A liderança é possível sobretudo através do testemunho de vida; esta é a minha profunda convicção pessoal. Como todo discípulo-missionário de Jesus, provavelmente a primeira contribuição é meu testemunho pessoal de vida como um apaixonado salesiano, missionário, comunicador, amigo dos jovens, profundamente apaixonado por Dom Bosco.
No passado recente, ajudei muitas inspetorias em seu processo de discernimento a reformular, a crescer, a ver e a avançar. Depois de dois anos como reitor, seis anos como inspetor da Coreia e 20 anos com o conselho do Reitor-Mor como visitante extraordinário, gostaria de partilhar essa experiência com a dinâmica do crescimento carismático salesiano. Como salesianos de Dom Bosco, somos muito ricos de espírito, vivendo numa família com muitos santos (ainda vivos ou ajudando do céu). Como meu estilo pessoal de animação, gosto de chamar a atenção de todos para valorizar e fazer frutificar esses tesouros no Lesoto, em eSwatini e na África do Sul.
A animação e o governo da comunidade católica e da família salesiana estão enraizados na escuta profunda. Não é por acaso que refletimos sobre as 127 perguntas de Jesus nos Evangelhos. O tema atual do CG28 também termina com um ponto de interrogação: Que tipo de salesianos para a juventude da África Meridional? Gosto de compartilhar as perguntas e “perder tempo” escutando e caminhando com cada irmão.
É um desafio voltar depois de 21 anos a serviço da autoridade, depois de ter servido durante muitos anos como conselheiro. No entanto, fomentar o espírito de família e o trabalho em equipe, investir na formação permanente de todos os Irmãos e aproximar-me de Dom Bosco são as principais qualidades que desejo no meu serviço inicial de liderança.




In memoriam. Dom Sergio DALL’ANTONIA, sdb

O P. Sérgio Dall’Antonia, missionário salesiano e fundador da presença salesiana na Romênia, terminou sua peregrinação terrestre em Bacau, Romênia, em 21.02.2023, aos 83 anos de idade.

Sérgio Dall’Antonia nasceu em Pieve di Soligo (Treviso, Itália), no dia 11 de abril de 1939. Seus pais eram Sônia e Ângelo Lombardi. A família incluía um irmão mais velho, Francisco, e uma irmãzinha, Mariela, que morreu com a idade de um ano. Ele foi batizado no dia 14 de abril, recebendo os nomes Sérgio e Lívio. Aos sete anos de idade, ele ficou órfão de mãe.

Frequentou a escola primária na vila e a escola secundária no Instituto Salesiano Astori, em Mogliano Vêneto, para onde a família se mudou. Graças ao contato com os salesianos, ele compreendeu o chamado divino e ao final do quinto ano da escola primária pediu para ser salesiano. Terminou seu noviciado em 15 de agosto de 1954, sob a orientação do P. Vigílio Uguccioni, em Albarè di Costermano, tornando-se salesiano de pleno direito.

Depois do ensino médio e dos estudos filosóficos em Nave (1955-1958) e em Foglizzo (1958-1959), retornou à sua Inspetoria para o tirocínio prático, realizado em Tolmezzo (1959-1961) e depois em Pordenone (1961-1962), fazendo sua profissão perpétua em 13 de agosto de 1961.

Depois de seus estudos teológicos em Monteortone (1962-1966), concluídos com sua ordenação sacerdotal (02.04.1966) no Santuário Mariano de Monteortone, seus superiores o escolheram como possível futuro professor no estudantado, e assim ele foi enviado a Roma, à Pontifícia Universidade Salesiana, para estudar moral (1966-1970). Devido a problemas de saúde, após seus estudos de moral, retornou à casa de Pordenone (1970-1973) como catequista e professor. Assim começou a manifestar habilidades de bom organizador, dotes artísticos e de animação, que o tornarão famoso.

A casa salesiana de São Luís em Gorizia o teve por cerca de quinze anos (1973-1986): aí ele se tornou a alma da Associação Salesiana de Turismo Juvenil de Isontino. Organizou festas para jovens e pais, exposições de arte, mas acima de tudo ele se tornou o promotor da famosa “Marcha da Amizade”, na primavera, e “Pedalando na Amizade”, no outono. Eles permanecerão na memória local como os únicos eventos que nos anos da Cortina de Ferro permitiam que as pessoas cruzassem a fronteira para a Iugoslávia, mostrando apenas o cartão de registro do evento. Estes eventos terminavam com um prato quente de macarronada oferecido a todos os participantes, italianos e iugoslavos, pelas cozinhas de campo do Exército alojadas nos pátios do São Luís.

Por mais uma década ele voltou a Pordenone (1986-1996), sempre trabalhando no campo da educação, até que o Senhor – através de seus superiores – lhe pediu para ir à Romênia para abrir uma presença salesiana. Não foi fácil aos 57 anos mudar-se para um país desconhecido, ex-comunista, de maioria ortodoxa, e aprender uma língua que não lhe servirá para mais nada a não ser comunicar o amor de Deus aos jovens. Entretanto, graças à sua disposição (que o caracterizou ao longo de toda a vida), ele partiu e se tornou o fundador de duas casas salesianas: primeiro em Constanța (1996-2001) e depois em Bacău, onde permanecerá até o final de sua peregrinação terrena.

As lembranças daqueles que o conheceram o descrevem como uma pessoa que falava pouco, mas fazia muito, sendo um grande e incansável trabalhador. Sempre no meio das crianças, ele as entretinha com imaginação e criatividade inteligentes. Na proclamação da mensagem cristã, ele também entrou no mundo da Internet com um espírito jovem, animando nada menos que quatro blogs, tirando de seu repertório para os jovens “coisas velhas e novas”.

Homem fiel na oração, ele rezava a Liturgia das Horas inteiramente diante do tabernáculo e gostava de meditar o terço com seus coirmãos todas as noites após o jantar. Era grande devoto não só da Santíssima Eucaristia, mas também de Nossa Senhora. Dava provas de sua fé nas visitas aos santuários marianos próximos e não perdia as festas da Santíssima Virgem. Ele foi fiel em sua confissão quinzenal e disponível como confessor, apreciado por seus coirmãos, pelos religiosos da região e pelos fiéis.
Deixa uma lembrança como um patriarca, como o “Dom Bosco da Romênia”.

Sua fé inabalável também se reflete em seu testamento espiritual, que reproduzimos abaixo.

Meu Jesus, me perdoa! Que eu te ame para sempre!
No caso da minha morte, eu permito retirar do meu corpo alguns órgãos úteis para a vida de outra pessoa, com o consentimento do meu superior direto da casa salesiana à qual pertenço. Eu os entrego de boa vontade como um humilde sinal da Caridade de Cristo que se fez tudo para todos para reconduzi-las ao Pai.
Peço perdão aos meus entes queridos, aos meus coirmãos e aos jovens pelo mal realizado, pelos maus exemplos dados e pelo bem não feito ou negligenciado. Que a Igreja me aceite em seu perdão e em sua oração de sufrágio. Se alguém achar que, de alguma forma, me ofendeu saiba que eu perdoo de todo o coração e para sempre.
Jesus e Maria sejam sempre meus doces amigos. Que eles me acompanhem pela mão ao Pai no Espírito Santo, obtendo misericórdia e perdão para mim. Do Céu, que espero alcançar pela Misericórdia Infinita de Deus, eu os amarei para sempre, orarei por vocês e pedirei todas as bênçãos do Céu para vocês.
P. Sérgio Dall’Antonia

Senhor, concedei-lhe o descanso eterno, e que a luz perpétua o ilumine. Descanse em paz!

Relatamos abaixo seu último vídeo publicado.






Deus deu a Dom Bosco um grande coração…

… sem fronteiras, como as margens do mar. Todos os dias eu sinto o palpitar desse coração.

Seu nome é Alberto. Dela, uma jovem mãe, eu não sei o nome.
Ele vive no Peru. Ela mora em Hyderabad (Índia).
O que une essas duas histórias, duas vidas, é que eu as conheci durante meu serviço: Alberto no Peru e a jovem mãe na Índia, na semana seguinte.
O que elas têm em comum é o precioso fio de ouro da carícia de Deus através da acolhida que Dom Bosco lhes deu em uma de suas casas. O coração dos Salesianos mudou suas vidas, salvando-os da situação de pobreza e talvez da morte a que estavam condenados. E creio poder dizer que o fruto da Páscoa do Senhor também passa por gestos humanos que curam e salvam.
Estas são as duas histórias.

Um jovem agradecido
Há algumas semanas atrás eu estava em Huancayo (Peru). Estava para celebrar a Eucaristia com mais de 680 jovens do movimento juvenil salesiano da Inspetoria, junto com várias centenas de pessoas daquela cidade, a 3200 metros acima do nível do mar, nas altas montanhas do Peru, e me disseram que um ex-aluno queria cumprimentar-me. Tinha levado quase cinco horas de viagem para chegar aí e devia enfrentar outras cinco horas para voltar.
“Terei muito prazer em conhecê-lo e agradecer-lhe por seu gesto simpático”, respondi.
Pouco antes do início da Eucaristia, aquele jovem se aproximou de mim e disse que estava muito feliz em me cumprimentar. “Meu nome é Alberto e quis fazer esta viagem para agradecer pessoalmente a Dom Bosco porque os salesianos me salvaram a vida”.
Eu lhe agradeci e lhe perguntei porque me dizia isso. Ele continuou com seu testemunho, e cada palavra me tocou cada vez mais o coração. Disse-me que era um rapaz difícil; que tinha dado muito trabalho aos Salesianos que o tinham levado para uma das casas de meninos em dificuldade. Acrescentou que eles teriam tido dezenas de razões para se livrarem dele, porque “eu era um pobre diabo, e só podia esperar algo mau do mundo e da vida; mas eles foram muito pacientes comigo”.
E continuou: “Consegui seguir meu caminho, continuei estudando e, apesar de minha rebeldia, cada vez me deram novas oportunidades, e hoje sou um pai de família, tenho uma linda menina e sou um educador social. Se não fosse pelo que os Salesianos fizeram por mim, minha vida seria muito diferente, talvez até já estivesse terminada.”
Fiquei sem palavras e muito emocionado. Disse-lhe que era muito grato por seu gesto, suas palavras e seu caminho, e que seu testemunho de vida era a maior satisfação para um coração salesiano.
Ele fez um gesto discreto e me indicou um salesiano que estava ali naquele momento, que tinha sido um de seus educadores e um dos que tinham sido muito pacientes com ele. O salesiano apareceu sorridente e, creio que com grande alegria no coração, me confirmou que este era de fato o caso. Partilhamos o almoço juntos e depois o Alberto voltou para sua família.

Uma mãe feliz
Cinco dias depois deste encontro, eu estava no sul da Índia, no estado de Hyderabad. Em meio a muitas saudações e atividades, uma tarde me anunciaram que teria uma visita. Era uma jovem mãe com sua filha de seis meses que me esperava na recepção da casa salesiana. Ela queria me cumprimentar.
A menina era linda e, como ela não se assustou, não pude resistir a tomá-la nos braços e abençoá-la também. Tiramos algumas fotos de lembrança, como a jovem mãe havia desejado. Isso foi tudo nessa reunião.
Não houve mais palavras, mas a história era dolorosa e bela ao mesmo tempo. Tempos atrás aquela jovem mãe tinha sido uma criança “rejeitada”, vivendo nas ruas sem ninguém. É fácil imaginar o destino dela.
Mas um dia, na providência do bom Deus, ela foi encontrada por um salesiano que tinha começado a acolher crianças de rua no estado de Hyderabad. Ela foi uma das meninas que conseguiu um lar com outras meninas. Junto com os educadores, meus irmãos salesianos se asseguraram de que todas as necessidades básicas fossem satisfeitas e cuidadas.
Assim, essa menininha, que foi resgatada da rua, pôde voltar a florescer, a empreender uma jornada de vida que a levou a ser hoje esposa e mãe e, algo incrivelmente inestimável para mim, professora na grande escola salesiana onde estávamos naquele momento.
Não pude deixar de pensar em quantas outras vidas assim, salvas do desespero e da angústia, há no mundo salesiano, quantos dos meus bons irmãos e irmãs salesianos se ajoelham todos os dias para “lavar os pés” de Jesus, nos pequenos e grandes das nossas ruas.
Esta é a chave para entender como tantas vidas podem ser transformadas para melhor.
Como não ver nesses dois fatos a “mão de Deus” que nos alcança, através do bem que podemos fazer? E que somos todos nós que, em qualquer parte do mundo, em qualquer situação de vida e de profissão, acreditamos na humanidade e na dignidade de cada pessoa, e acreditamos que devemos continuar a construir um mundo melhor.
Escrevo isto porque também é preciso dar a conhecer boas notícias. As más notícias se espalham por si ou encontram pessoas interessadas. Essas duas histórias de vida real, para mim tão próximas no tempo, confirmam uma e mil vezes o quanto é valioso o bem que todos nós tentamos fazer juntos.
E também o que uma canção salesiana expressou poeticamente: “Eu digo que João Bosco está vivo, não pense que um Pai assim possa nos abandonar. Ele não está morto, o Pai vive, sempre esteve conosco e permanece, ele que cuidou de jovens abandonados e órfãos, de meninos de rua, sozinhos, que ajudava a mudar… Digo que João Bosco está vivo e já tomou milhares de iniciativas. Você não vê a solicitude dele como pai que agora trabalha em todo o mundo? Não o ouve entoando seu canto a tantas filhas, a tantos filhos, que trazem esses reflexos do Pai que amamos? Ele vive, quando seus salesianos são assim.”
Desejo a todos vós uma Feliz Páscoa; e àqueles que se sentem distantes dessa certeza de fé, desejo todo bem, com muita cordialidade.




A Lira italiana de 1861 a 2001 e em 2022. A moeda nos tempos de Dom Bosco

A Lira italiana, com suas subdivisões em 100 centésimos, foi a moeda oficial da Itália de 1861 a 2002, quando foi definitivamente substituída pela moeda europeia, o Euro. Foi a moeda no tempo de Dom Bosco e na história inicial da Congregação Salesiana.

A Lira italiana (abreviada como £ ou Lit.) foi cunhada pela primeira vez pela República de Veneza em 1472. Em 1806, foi adotada pelo Reino Napoleônico da Itália, também conhecido como Reino Itálico, fundado em 1805 por Napoleão Bonaparte, quando se fez coroar como governante da parte norte e centro-oriental do que é hoje a Itália. Dez anos depois, em 1814, após a dissolução do Estado napoleônico, a moeda do Reino foi mantida somente no Ducado de Parma e no Reino da Sardenha. Depois de mais dois anos, em 1816, o rei Vitório Emanuel I da Saboia introduziu a lira da Saboia, que permaneceu em circulação até o surgimento do Reino da Itália, em 1861, quando ela se tornou a Lira italiana. Essa moeda permaneceu em circulação até 2002, quando foi definitivamente substituída pelo Euro.

Quando se acompanha a história de Dom Bosco e da Congregação Salesiana, sempre se encontra a dificuldade de quantificar corretamente os esforços financeiros que foram feitos para apoiar e educar milhares, na verdade dezenas de milhares de meninos, pois a moeda italiana sofreu grandes variações ao longo dos anos. A dificuldade aumentou ainda mais com a adoção da moeda europeia, quando em 2002 a taxa de câmbio foi fixada em 1.936,27 Liras italianas por um Euro. E houve outras variações significativas devido à inflação.
Propomos abaixo uma tabela de cálculo da revalorização da lira de 1861 a 2002, com a possibilidade de uma atualização para 2022.

 

Lira italiana –> Euro

=
liras do ano euro do ano 2001

=
liras do ano euro do ano 2022 (+ 38.7%)

Euro –> Lira italiana

=
euro do ano 2001 liras do ano

=
euro do ano 2022 (+ 38.7%) liras do ano



Os cálculos foram feitos com base nos coeficientes de reavaliação fornecidos pelo Instituto Central de Estatística (ISTAT) e foram determinados de acordo com a tendência dos índices do custo de vida, que desde 1968 assumiram a denominação de índices de preços ao consumidor para as famílias de operários e empregados. Para o período após 2002, foi adicionado o índice de inflação, que em 2022 chega a 38,70% comparado com a época do lançamento da moeda única (Euro), com base em dados fornecidos pelo próprio ISTAT (1 Euro em 2002 = 1,39 Euro em 2022).




Atualizações do site (1)

A fim de facilitar o acesso dos leitores às novas características desta publicação, como para a parte estática do site, ocasionalmente – quando acumulamos algumas mudanças dignas de menção – faremos uma atualização por meio de um artigo.

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O Arquivo do Boletim Salesiano foi enriquecido com os números do Boletim Salesiano italiano impresso até o ano de 1901. Trata-se de uma nova digitalização em alta definição e reconhecimento de caráter (OCR) para permitir uma busca mais precisa. A intenção é oferecer a coleção completa desse Boletim, incluindo números suplementares, que nunca foram apresentados.
Os índices estão disponíveis por enquanto desde o início, de agosto de 1877, até maio de 1883; mais tarde eles também serão completados.
Pensamos em oferecer acesso rápido aos números desta publicação, criando uma página especialmente para esse fim, que pode ser acessada através do link indicado no texto inicial da página de Arquivo do Boletim Salesiano, e também encontramos AQUI.
Lembramos que a página está disponível apenas em italiano, porque o Boletim está em italiano. No entanto, como os PDFs são pesquisáveis, os textos podem ser selecionados, copiados e traduzidos usando o Google ® Translate ou outros serviços similares.

Agradecemos-lhe sua atenção e desejamos-lhe uma leitura proveitosa.




Dom Bosco no Uruguai. O sonho missionário se tornou uma realidade

A missão salesiana no Uruguai compartilhada por um vietnamita, Padre Domenico Tran Duc Thanh: o amor cristão através da vida vivida com o povo local.

Os Salesianos foram oficialmente fundados como Congregação em 1859, mas o sonho já estava acalentado há muito tempo. Já no início de seu trabalho, Dom Bosco percebeu que a obra tinha que ser compartilhada, como ele havia sentido em muitos de seus sonhos. Então ele envolveu pessoas de todas as classes sociais para colaborar de várias maneiras na missão juvenil que Deus lhe havia confiado. Em 1875, com o início das missões, começou uma etapa importante na história da Congregação. O primeiro destino seria a Argentina.

Em 13 de dezembro de 1875, a primeira expedição missionária salesiana, liderada pelo P. João Cagliero, com destino a Buenos Aires, passou por Montevidéu. Assim, o Uruguai tornou-se o terceiro país fora da Itália alcançado pelos Salesianos de Dom Bosco. Os Salesianos se estabeleceram no bairro Villa Colón, em meio a enormes dificuldades, iniciando seu trabalho no Colégio Pio, que foi inaugurado em 2 de fevereiro de 1877. No mesmo ano, as Filhas de Maria Auxiliadora chegaram ao Uruguai e também se estabeleceram nesse bairro: desta forma, Villa Colón tornou-se o berço do qual o carisma se difundiu não só no Uruguai, mas também no Brasil, no Paraguai e em outras terras do continente latino-americano.

Com o tempo, essa presença salesiana tornou-se uma Inspetoria e hoje abrange uma variedade de obras salesianas em diferentes partes do país: escolas, serviços sociais, paróquias, basílicas, santuários, capelas rurais e urbanas, centros de saúde, residências estudantis e universitárias, Movimento Juvenil Salesiano e muito mais. É uma pluralidade que mostra a resposta às necessidades da região e a flexibilidade dos salesianos para se adaptarem à situação local. Ao visitar as pessoas do bairro, tentando entender o que as pessoas estão vivendo através do diálogo e da vida cotidiana, desenvolve-se a adaptação às novas situações a fim de melhor responder à missão confiada. Este sair ao encontro dos jovens, especialmente dos mais necessitados, faz os salesianos felizes, permitindo-lhes a cada dia descobrir a beleza da vocação salesiana.
O trabalho nestas obras tem sido compartilhado com os fiéis leigos, e tendo cuidado de sua formação, hoje encontramos um bom número deles trabalhando nestas atividades, compartilhando suas vidas com os salesianos e fortalecendo sua missão. A abertura aos outros também tem permitido que os salesianos que não são nativos do lugar sejam acolhidos aqui. Este é o caso do P. Domingos, que realiza ali sua missão salesiana.

A resposta à vocação missionária é uma resposta que deixou uma marca forte em sua vida. Ele nos conta que se encontrou quase de repente em um país desconhecido, com uma língua e cultura diferentes, tendo que se separar de todas as pessoas que conhecia, que tinham ficado longe. Ele tinha que começar do zero, com uma abertura diferente, com uma nova sensibilidade. Se antes pensava que ser missionário significava levar Jesus para outro lugar, uma vez chegado ao Uruguai, ele descobriu que Jesus já estava lá, esperando por ele nas outras pessoas. “Aqui no Uruguai, através dos outros, eu pude encontrar um Jesus totalmente diferente: mais próximo, mais humano, mais simples”.
O que ele não perdeu foi a presença materna de Maria, que o acompanha na rotina diária da vida missionária e lhe dá uma força profunda, que o impulsiona a amar Cristo nos outros. “Quando eu era criança, minha avó me levava a uma igreja todos os dias para rezar o terço. Desde aqueles dias a seus pés até hoje, eu ainda me sinto protegido sob o manto de Maria”. O culto mariano dá seus frutos; o amor se paga com amor.

Ele nos confessa que: “No Uruguai eu sou um jovem que não tem nada; eu tenho somente a fé, a fé de saber que Cristo e Maria estão sempre presentes em minha vida; a esperança de uma Igreja cada vez mais próxima, cheia de santidade e alegria”. Mas talvez seja esta pobreza que o ajuda a preparar seu coração para seguir Cristo, educar seu coração para estar com os irmãos e irmãs que se encontram ao longo do caminho. Isto o leva a ver a Igreja como um lugar de encontro alegre, uma celebração que manifesta a fé do outro, um encontro que implica unidade e santidade.
E isto também o leva a perceber que seu lugar é bem onde ele está, em sua comunidade com seus irmãos, com as pessoas do bairro, com os animadores, com as crianças, com os leigos, com os educadores.
Assim se manifesta a beleza da vocação missionária: deixando a Providência agir, através da humildade e da docilidade ao Espírito Santo, se transforma o ordinário em extraordinário.

Artigo publicado por
Marco Fulgaro

Dom Bosco no Uruguai. O sonho missionário se tornou uma realidade. Galeria de fotos

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Dom Bosco no Uruguai. O sonho missionário se tornou uma realidade
Dom Bosco no Uruguai. O sonho missionário se tornou uma realidade
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São Francisco de Sales. A vontade de Deus (5/8)

(continuação do artigo anterior)

A VONTADE DE DEUS BUSCADA E SEGUIDA EM SÃO FRANCISCO DE SALES (5/8)

Este é o tema mais popular nos escritos de São Francisco de Sales, o tema ao qual ele retorna com mais frequência.

A descoberta de Deus como Pai Providente e o amor à sua vontade caminham de mãos dadas na vida de Francisco: ele nos lembra que “todos os dias nós lhe pedimos: Seja feita a tua vontade, mas quando realmente temos que fazer isso, como é difícil! Nós nos oferecemos a Deus com tanta frequência e sempre lhe dizemos:
“Eu sou vosso; aqui está o meu coração!” Mas, quando Ele quer se servir de nós, somos tão negligentes! Como podemos dizer que somos Seus, se não queremos nos conformar com Sua santa vontade”?

“A vontade de Deus deve ser a única coisa a ser buscada e desejada, nunca se afastando dela por qualquer razão! Caminhai sob a orientação da Providência de Deus, pensando apenas nos dias atuais e deixando para Nosso Senhor o coração que Lhe destes, sem jamais querer tomá-lo de volta por nenhuma coisa”.

Francisco de Sales ensina que seguir a vontade de Deus é o melhor caminho para fazer-se santo e este caminho está aberto a todos. Ele escreve:
“Pretendo oferecer meus ensinamentos àqueles que vivem na cidade, na família, na corte, e que, em virtude do seu status, são forçados por conveniências sociais a viver entre outros. A devoção deve ser vivida de forma diferente pelo cavalheiro, o artesão, o servo, o príncipe, a viúva, a donzela, a esposa; mas não é suficiente, o exercício da devoção deve ser proporcional às forças, ocupações e deveres dos indivíduos”.

O que Francisco de Sales chama de devoção, o Papa Francisco chama de santidade e escreve palavras que parecem vir diretamente da pena de Francisco de Sales:
“Para ser santo não é necessário ser bispos, sacerdotes, religiosas ou religiosos. Muitas vezes somos tentados a pensar que a santidade é reservada àqueles que são capazes de manter distância das ocupações comuns, para dedicar muito tempo à oração. Não é assim. Todos somos chamados a ser santos vivendo com amor e cada um oferecendo o seu testemunho nas ocupações diárias, onde quer que estejam”.

Em uma carta, Francisco escreve:
“Pelo amor de Deus, abandonai-vos inteiramente à sua vontade e não acrediteis que podeis servi-lo de qualquer outra maneira, porque nunca o servimos bem, exceto quando o servimos como Ele deseja”.

Isto exige
“que não semeemos no campo do nosso vizinho, por mais bonito que seja, até que o nosso próprio campo tenha sido totalmente semeado. É sempre muito prejudicial a distração do coração que leva a ter o coração em um lugar e o dever em outro”.

De vez em quando ouço esta pergunta: “Como faço para entender qual é a vontade de Deus para mim”?
Eu encontrei uma resposta na vida do santo.

Joana de Chantal esperou mais de seis anos antes de poder se consagrar inteiramente ao Senhor e fundar com Francisco o que viria a ser a Ordem da Visitação. Ao longo desse período, o santo procurou compreender qual era a vontade de Deus sobre isso. Ele mesmo nos fala sobre isso em uma carta para Joana:
“O grande movimento de espírito que vos conduziu como por força e com grande consolação; a longa reflexão que impus a mim mesmo antes de dar-vos o meu consentimento; o fato de que nem vós nem eu confiamos apenas em nós mesmos; o fato de darmos às primeiras agitações da vossa consciência o tempo todo para acalmar-se; as orações, não de um dia ou dois, mas de vários meses, que precederam a vossa escolha, são sinais infalíveis que nos permitem afirmar sem sombra de dúvida que essa era a vontade de Deus”.

Precioso este testemunho que esclarece a prudência de Francisco, que sabe esperar com calma, sem renunciar a todos os meios à sua disposição para decifrar a vontade de Deus sobre ele e sobre a baronesa. São meios que hoje também se aplicam a ti: refletir longamente diante do Senhor, pedir conselhos de pessoas sábias, não tomar decisões apressadas, rezar muito.
Ele dá a motivação disso a Joana:
“Enquanto Deus quiser que permaneçais no mundo por amor d’Ele, permanecei nele de boa vontade e com alegria. Muitos saem do mundo sem, porém, sair de si mesmos e buscam assim os próprios gostos, a própria paz de espírito e as próprias satisfações. Deixamos o mundo para servir a Deus, para seguir a Deus e para amar a Deus. Dado que não aspiramos a nada além do seu santo serviço, onde quer que o sirvamos, sempre nos sentiremos satisfeitos”.

Uma vez entendida a vontade de Deus com clareza suficiente, a obediência é necessária, ou seja, colocá-la em prática, vivê-la!
À Baronesa de Chantal ele escreve estas linhas em letras maiúsculas: elas serão o programa de toda a sua vida e eu diria o concentrado da espiritualidade de Francisco:

É PRECISO FAZER TUDO POR AMOR E NADA POR TEMOR; É PRECISO AMAR A OBEDIÊNCIA MAIS DO QUANTO SE TEME A DESOBEDIÊNCIA

Obedecer é falar de amor a Deus que me chama a viver A sua vontade NAS circunstâncias concretas de vida.

A obediência é a forma do amor
Eis as consequências desta rendição à vontade de Deus que Francisco lembra a tantas pessoas com imagens esplêndidas. À Sra. Brûlart, mãe de família, ele escreve:
“Tudo o que fazemos recebe o seu valor da nossa conformidade com a vontade de Deus. Devemos amar o que Deus ama. Agora ele ama a nossa vocação. Portanto, vamos também amá-la e não perder tempo pensando na dos outros”.

Os progressos devem ser enfatizados e encorajados.
“Falastes-me uma palavra maravilhosa: que Deus me coloque no molho que Ele quiser; não me importo, desde que eu possa servi-Lo. Devemos amar esta vontade de Deus e a obrigação que ela pressupõe em nós, mesmo que seja para cuidar dos porcos ou realizar os atos mais humildes ao longo de nossas vidas, porque, qualquer que seja o molho em que o bom Deus nos coloque, não devemos nos importar. Este é o objetivo da perfeição”.

E agora, algumas imagens: a do jardim.
“Não semeai os vossos desejos no jardim de outro, mas tende o cuidado de cultivar apenas o seu próprio bem. Não desejai ser o que não sois, mas desejai ser da melhor maneira possível o que sois. Este é o grande segredo e o segredo menos compreendido da vida espiritual. Qual é a utilidade de construir castelos na Espanha se temos que morar na França? Esta é uma velha lição minha, e vós a entendeis bem”.

A imagem do barco.
“Parece-nos que com a mudança do barco estaremos melhor. Sim, estaremos melhor se mudarmos a nós mesmos! Sou inimigo jurado de todos os desejos inúteis, perigosos e perversos. Pois embora o que desejamos seja bom, o nosso desejo é ruim, pois Deus não nos pede aquele bem, mas outro ao qual Ele quer que nos apliquemos”.

A imagem da criança.
É necessário confiar “o nosso propósito geral à divina Providência, abandonando-nos em seus braços, como a criancinha, que, para crescer, come todos os dias o que seu pai lhe dá, certa de que sempre lhe dará alimento, na proporção do seu apetite e das suas necessidades”.

Francisco insiste neste ponto, que é fundamental.
“O que importa para uma alma, verdadeiramente apaixonada, se o Esposo celeste é servido de uma forma ou de outra? Aquele que busca apenas a satisfação de seu Amado está feliz com o que o faz feliz”.

É comovente ler esta passagem, escrita após uma doença grave de Joana de Chantal:
“Para mim sois mais preciosa do que mesmo; mas isso não me impede de me conformar plenamente com a vontade divina. Pretendemos servir a Deus neste mundo com todo o nosso ser: se Ele estima melhor que sejamos um neste mundo e um no outro ou ambos no outro, que seja feita a sua santíssima vontade”.

Para concluir, mais alguns flashes das cartas:
“Queremos servir a Deus, mas seguindo nossa vontade e não a d’Ele. Deus declarou não apreciar nenhum sacrifício contrário à obediência. Deus me manda servir as almas e eu quero permanecer em contemplação: a vida contemplativa é boa, mas não quando está em oposição à obediência. Não podemos escolher nossos próprios deveres: devemos ver o que Deus quer; e se Deus quer que eu o sirva fazendo uma coisa, eu não devo querer servi-lo fazendo outra”.
“Se formos santos segundo a nossa vontade, nunca seremos santos como se deve: devemos ser santos segundo a vontade de Deus”!

(continua)







Vera Grita, Mística da Eucaristia

            No centenário do nascimento da Serva de Deus Vera Grita, leiga Cooperadora Salesiana (Roma, 28 de janeiro de 1923 – Pietra Ligure, 22 de dezembro de 1969), é apresentado um perfil biográfico e espiritual do seu testemunho.

Roma, Modica, Savona
            Vera Grita nasceu em Roma, em 28 de janeiro de 1923, a segunda filha de Amleto, fotógrafo de profissão há gerações, e Maria Ana Zacco della Pirrera, de origens nobres. A família unida também incluía sua irmã mais velha Josefa (chamada Pina) e as irmãs mais novas Liliana e Santa Rosa (chamada Rosa). No dia 14 de dezembro do mesmo ano Vera foi batizada na paróquia de São Joaquim, em Prati, também em Roma.

            Já desde criança, Vera mostrou um caráter bom e suave que não seria abalado pelos acontecimentos negativos que lhe sucederam: aos onze anos de idade ela teve que deixar sua família e desprender-se de seus queridos mais próximos, junto com sua irmã mais nova Liliana, para juntar-se a suas tias paternas em Modica, na Sicília, que se dispuseram a ajudar os pais de Vera, atingidos por dificuldades financeiras devido à crise econômica de 1929-1930. Durante este período, Vera mostra sua ternura para com sua irmã mais nova, ficando perto dela quando esta chorava à noite com saudades de sua mãe. Vera é atraída por uma grande pintura do Sagrado Coração de Jesus, pendurada na sala onde ela recita as orações da manhã e o terço todos os dias com suas tias. Permanece frequentemente em silêncio diante daquela pintura e repete que quer ser religiosa quando crescer. No dia de sua Primeira Comunhão (24 de maio de 1934) ela não queria tirar sua roupa branca porque temia não mostrar a Jesus a alegria de tê-lo em seu coração. Na escola ela consegue bons resultados e é sociável com suas colegas de classe.
            Aos 17 anos de idade, em 1940, ela voltou para a sua família. A família se mudou para Savona e Vera se formou no ano seguinte no Instituto de Educação. Ela estava com vinte anos de idade quando teve que enfrentar uma nova e dolorosa separação, devido à morte prematura de seu pai Amleto (1943); então renunciou aos estudos universitários aos quais aspirava, a fim de ajudar financeiramente a família.

No dia da Primeira Comunhão

O drama da guerra
            Mas é a Segunda Guerra Mundial com o bombardeio de Savona em 1944 que causará danos irreparáveis a Vera e determinará o curso subsequente de sua vida. Ela é atropelada e pisoteada pela multidão em fuga, que procura refúgio em um túnel-abrigo.

Vera por volta dos 14-15 anos de idade

A medicina chama de síndrome de esmagamento as consequências físicas que ocorrem após bombardeios, terremotos, colapsos estruturais, como resultado dos quais um membro ou o corpo inteiro é esmagado. O que então ocorre é um dano muscular que afeta todo o corpo, especialmente os rins. Como resultado do esmagamento, Vera sofrerá lesões lombares e nas costas que causarão danos irreparáveis à sua saúde com febres, dores de cabeça e pleurisia. Com este dramático evento começou a ‘Via Sacra’ de Vera que duraria 25 anos, durante os quais ela alternaria longas estadias hospitalares com seu trabalho. Aos 32 anos de idade, ela é diagnosticada com a doença de Addison, que a consumirá ao debilitar seu organismo: Vera pesará apenas 40 quilos. Aos 36 anos de idade, Vera sofreu uma histerectomia total (1959), que causou sua menopausa prematura e exacerbou a astenia da qual já sofria como resultado da doença de Addison.
            Apesar de sua condição física precária, Vera venceu um concurso como professora da escola elementar. Ela se dedicou ao ensino durante os últimos dez anos de sua vida terrena, servindo em escolas no interior da Ligúria que eram de difícil acesso (Rialto, Erli, Alpicella, Deserto di Varazze), despertando estima e afeto entre suas colegas, pais e alunos.

Salesiana Cooperadora
            Em Savona, na paróquia salesiana de Maria Auxiliadora, ela participava da Missa e foi assídua ao sacramento da Penitência. Desde 1963, seu confessor é o padre João Bocchi, salesiano. Salesiana Cooperadora desde 1967, realizou seu chamado no dom total de si ao Senhor, que de maneira extraordinária se entregou a ela, no mais profundo de seu coração, com a “Voz”, com a “Palavra”, para comunicar-lhe a Obra dos Tabernáculos Vivos. Ela submeteu todos os seus escritos ao seu diretor espiritual, o salesiano P. Gabriel Zucconi, e guardou no silêncio do seu coração o segredo daquele chamado, guiada pelo divino Mestre e pela Virgem Maria que a acompanhariam pelo caminho da vida escondida, do despojamento e do autoesvaziamento.

            Sob o impulso da graça divina e aceitando a mediação de seus guias espirituais, Vera Grita respondeu ao dom de Deus, testemunhando em sua vida, marcada pelo cansaço da doença, o encontro com o Ressuscitado, e dedicando-se com generosidade heroica ao ensino e à educação de seus alunos, contribuindo para as necessidades de sua família e dando testemunho de uma vida de pobreza evangélica. Centrada e firme no Deus que a ama e sustenta, com grande firmeza interior ela se torna capaz de suportar as provações e os sofrimentos da vida. Com base nesta solidez interior, ela dá testemunho de uma existência cristã feita de paciência e constância no bem.
            Morreu em 22 de dezembro de 1969 em Pietra Ligure, no hospital do Santo Rosário, num quartinho onde ela passou os últimos seis meses de sua vida, enquanto aumentavam seus sofrimentos, aceitos e vividos em união com Jesus Crucificado. “A alma de Vera”, escreveu o P. José Borra, salesiano, seu primeiro biógrafo, “com suas mensagens e cartas entra nas fileiras daquelas almas carismáticas, chamadas a enriquecer a Igreja com chamas de amor a Deus e a Jesus na Eucaristia para a expansão do Reino”. Ela é um daqueles grãos de trigo que o Céu deixou cair na Terra para dar frutos, em seu próprio tempo, em silêncio e escondimento.

Em peregrinação a Lourdes

Vera de Jesus
            A vida de Vera Grita se desenvolveu no curto período de 46 anos, marcados por dramáticos eventos históricos como a grande crise econômica de 1929-1930 e a Segunda Guerra Mundial, e depois terminou no limiar de outro evento histórico significativo: o protesto de 1968, que teria profundas repercussões em nível cultural, social, político, religioso e eclesial.

Com alguns membros da família

A vida de Vera começa, se desenvolve e termina em meio a esses eventos históricos dos quais ela sofre as dramáticas consequências em nível familiar, emocional e físico. Ao mesmo tempo, sua história mostra como ela passou por esses eventos enfrentando-os com a força de sua fé em Jesus Cristo, dando assim testemunho de uma fidelidade heroica ao Amor crucificado e ressuscitado. Fidelidade que, no final de sua vida terrena, o Senhor retribuirá dando-lhe um novo nome: Vera de Jesus. “Eu te dei meu Santo Nome, e de agora em diante serás chamada e serás “Vera de Jesus” (Mensagem de 3 de dezembro de 1968).
            Provada por várias doenças que, com o tempo, delinearam uma situação de desgaste físico generalizado e irrecuperável, Vera vive no mundo sem ser do mundo, mantendo estabilidade e equilíbrio interior devido à sua união com Jesus na Eucaristia recebida diariamente e à consciência da permanência eucarística em sua alma. Portanto a Santa Missa é o centro da vida diária e espiritual de Vera, na qual, como uma pequena “gota d’água”, ela se une ao vinho para estar inseparavelmente unida ao Amor infinito que continuamente se doa, salva e sustenta o mundo.
            Alguns meses antes de sua morte, Vera escreveu ao seu pai espiritual, o P. Gabriel Zucconi: “As doenças que carrego dentro de mim há mais de vinte anos degeneraram; devorada pela febre e pela dor em todos os meus ossos, estou viva na Santa Missa”. Novamente: “Permanece a chama da Santa Missa, a centelha divina que me anima, me dá vida; depois o trabalho, as crianças, a família, a impossibilidade de encontrar um lugar tranquilo em que possa me isolar para rezar, ou o cansaço físico depois da escola”.

A Obra dos Tabernáculos Vivos
            Durante os longos anos de sofrimento, consciente de sua fragilidade e limitação humana, Vera aprendeu a confiar-se a Deus e a abandonar-se totalmente à sua vontade. Ela manteve esta docilidade mesmo quando o Senhor lhe comunicou a Obra dos Tabernáculos Vivos, nos últimos 2 anos e 4 meses de sua vida terrena. Seu amor pela vontade de Deus a levou ao dom total de si mesma: primeiro com votos particulares e o voto de “pequena vítima” para os sacerdotes (2 de fevereiro de 1965); depois com a oferta de sua vida (5 de novembro de 1968) pelo nascimento e desenvolvimento da Obra dos Tabernáculos Vivos, sempre em plena obediência ao seu diretor espiritual.
            Em 19 de setembro de 1967, ela iniciou a experiência mística que a convidava a viver plenamente a alegria e dignidade de ser filha de Deus, em comunhão com a Trindade e na intimidade eucarística com Jesus recebido na Sagrada Comunhão e presente no Tabernáculo. “O vinho e a água somos nós: Eu e tu, tu e Eu”. Nós somos um só: eu escavo em ti, escavo, escavo para construir um templo para mim: deixa-me trabalhar, não ponhas obstáculos no meu caminho; […] a vontade do meu Pai é esta: que Eu permaneça em ti, e tu em Mim. Juntos daremos grandes frutos”. Há 186 mensagens que compõem a Obra dos Tabernáculos Vivos que Veraescreveu, lutando com o medo de ser vítima do engano, e obedecendo ao P. Zucconi.
            O “Leve-me com você” expressa de uma maneira simples o convite de Jesus para Vera. Onde, leva-me contigo? Onde moras: Vera é educada e preparada por Jesus para viver em união com Ele. Jesus quer entrar na vida dela, na sua família, na escola onde ela ensina. Um convite dirigido a todos os cristãos. Jesus quer sair da Igreja de pedra e quer viver em nossos corações com a Eucaristia, com a graça da permanência eucarística em nossas almas. Ele quer vir conosco para onde vamos, para viver nossa vida familiar, e quer alcançar aqueles que vivem longe dele, vivendo em nós.

Na esteira do carisma salesiano
            Na Obra dos Tabernáculos Vivos há referências explícitas a Dom Bosco e ao seu “da mihi animas cetera tolle”, para viver em união com Deus e confiar em Maria Auxiliadora, para doar Deus através de um apostolado incansável que coopere na salvação da humanidade. A Obra, pela vontade do Senhor, é confiada em primeira instância aos filhos de Dom Bosco para sua realização e difusão nas paróquias, nos institutos religiosos e na Igreja: “Escolhi os Salesianos porque eles vivem com os jovens, mas sua vida de apostolado deve ser mais intensa, mais ativa, mais sentida”.

            A Causa de Beatificação da Serva de Deus Vera Grita foi lançada no dia 22 de dezembro de 2019, 50º aniversário de sua morte, em Savona, com a apresentação do ‘Supplice libello’ ao bispo diocesano, Dom Calógero Marino, pelo Postulador, P. Pierluigi Cameroni. O Ator da Causa é a Congregação Salesiana. O Inquérito Diocesano foi realizado de 10 de abril a 15 de maio de 2022, na Cúria em Savona. O Dicastério para as Causas dos Santos deu validade jurídica a este Inquérito em 16 de dezembro de 2022.
            Como o Reitor-Mor escreveu na Estreia deste ano: “Vera Grita testemunha, antes de tudo, uma orientação eucarística totalizante, que se tornou explícita especialmente nos últimos anos de sua existência. Ela não pensou em termos de programas, iniciativas apostólicas, projetos: ela acolheu o “projeto” fundamental que é aquele de Jesus, a ponto de torná-lo sua própria vida. O mundo de hoje confirma uma grande necessidade da Eucaristia. Sua caminhada na cansativa laboriosidade de todos os dias oferece uma nova perspectiva laical à santidade, tornando-se exemplo de conversão, aceitação e santificação pelos “pobres”, “frágeis”, “doentes” que nela podem se reconhecer e obter esperança. Como Salesiana Cooperadora, Vera Grita vive e trabalha, ensina e encontra pessoas com uma diferenciada sensibilidade salesiana: da doçura da sua presença discreta mas eficaz, à capacidade de fazer-se amar pelas crianças e suas famílias; da pedagogia da bondade que vive com seu sorriso constante à generosa prontidão com que, atenta às dificuldades, volta sua atenção para o último, o pequeno, o distante, o esquecido; da sua generosa paixão por Deus e Sua glória até o caminho da cruz, entregando tudo em sua condição de doente”.

No jardim de Santa Corona, em 1966




Páscoa de 2023

Cristo RESSUSCITOU!

„Bendito seja Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo! Na sua grande misericórdia ele nos fez renascer pela Ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma viva esperança, para uma herança incorruptível, incontaminável e imarcescível” (1Pe. 1,3-4)

Santa Páscoa a todos os nossos leitores!